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Cadê o dinheiro que circulava por aqui?

O leitor pode fazer o teste: como quem está interessado em comprar algo, entre em uma loja; converse com o balconista e vá se inteirando da rotina do lugar. A simpatia vai conquistando a confiança até chegar ao gerente que, em se tratando de uma micro-empresa, significa falar com o próprio dono.


Quando o papo chegar no nível de intimidade calculado, abarque a sentença (não é uma pergunta. É uma sugestão de dúvida: tem que ser feita no tom certo, meio sorrindo e com cálculo nos olhos): “Eh… mas as coisas não estão fáceis. Não tem dinheiro circulando!”


Ah!… Malvado leitor! Você é ferino! Você dosa o quanto maltrata a alma alheia, leitor! A mudança no semblante do desgraçado comerciante ocorre como que em um passe de indignidade. A seriedade expressa no rosto expõe que, a partir dali, existe o preparo para tratar de coisas graves.


O rosário de lamentações é parte da matemática. E não se trata de pessoa “negativista”; de pessoa “pessimista”; de pessoa “pra baixo”; de gente que se aquartelou na famosa “zona de conforto”. Não se trata de pessoa que não decorou direito as orientações do coaching da moda. Não é isso. A questão realmente grave é que o comércio varejista do Acre sente no caixa os problemas da falta de circulação de dinheiro.


As lojas, sobretudo da região central da cidade, agonizam com falta de clientes. E os poucos que se aventuram a comprar o fazem sem o mínimo de ousadia. As compras têm sido as mais modestas, quase agredindo o orçamento doméstico de todo mundo. Essa falta de dinheiro circulando é um problema de ordem política. A situação está grave.


Mesmo o Governo Federal executando o programa Desenrola Brasil, fazendo com que os bancos renegociem mais de R$ 8 bilhões em dívidas (dados da Federação Brasileira de Bancos), o retorno do cliente de renda baixa não é sentido no comércio acreano.


Há um elemento mais óbvio que explica esse cenário que é a ausência de grandes obras de infraestrutura executadas por empresas locais. Isso, sem dúvida, impacta muito: não ter obras na Construção Civil é um veneno para um lugar como o Acre, sobretudo. E ainda pior: as raras obras que há vêm com assinatura de empresas “de fora”. Aí… lasca tudo de vez.


Mas isso não explica tudo. Há outro fator. Silencioso. Discreto… e fulminante: o comércio eletrônico. O público jovem tem uma identidade tão forte, tão visceral com essa forma de compra que não seria exagero dizer que alguns entendem ser “cafona” (para quem ainda usa essa palavra); careta; antiquada; atrasada; ultrapassada aquela velha forma de comprar, conversando com o lojista.


Ao comprar via web, o consumidor acreano está decidindo transportar o raro dinheiro que poderia circular pelo comércio local, em praças como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte ou, claro, China. Compra-se de tudo via internet. Do “baby doll”, ao quadro em fibra de carbono da bicicleta; da roupinha mais básica para a adolescente ao sapato ou tênis.


Uma parte dos micro-empresários locais (sobretudo as mulheres) já atentou para isto. Não possuem loja física: oferecem produtos na internet e entregam em sacolas estilizadas na porta do cliente, com o mesmo sorriso mediante pagamento. Só não há mais o balcão mediando a relação.


Há essa migração. Mas é um movimento ainda tímido. Ainda sem muito volume. A maior parte dos micro-empresários no Acre, no entanto, ainda está atrás do balcão, teimando em aguardar o cliente com generosa disposição para gastar. É, sobretudo, este perfil de comerciante, que mais sente a “ausência de dinheiro circulando”.


Portanto, a falta de dinheiro circulando tem gênese em um fator político forte em função da ausência de obras públicas, mas há também um fator comportamental. Nesse aspecto, são situações que precisam mudar. A decisão política precisa acontecer e a adaptação do comerciante ao novo perfil de consumidor também. Isso não é conversa de coaching. É típico de quem está agonizando atrás de um balcão, espantando dependente químico e bêbados que insistem em entrar na loja o dia inteiro.


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