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O poço eleitoral não tem fundo?

A sociedade brasileira tomou na semana passada o que em linguagem futebolística costuma-se chamar de bola nas costas. O passe mal dado foi a inclusão malandra na LDO de um aumento da verba destinada ao fundo eleitoral, elevando-o para inacreditáveis 5,7 bilhões de reais. Decididamente, se pretendeu acabar com a corrupção eleitoral, o fundão é, ele mesmo, um assalto.


Em resumo, aconteceu o seguinte: A LDO tinha que ser votada, ocorre que o relator, o deputado maranhense Juscelino Filho, do DEM, enfiou no relatório o aumento indecente. Tudo combinado, Marcelo Ramos, ex-comunista, presidente em exercício da Câmara dos Deputados, acelerou a votação incluindo o aumento. Em votação simbólica, na correria, foi aprovado sem tempo sequer para votação de um destaque apresentado pelo partido NOVO. No Senado, do mesmo modo, o troço passou como um relâmpago.


Enfim, solertemente, fora das vistas da população, criaram e aprovaram essa tungada no erário. Dinheiro que deveria ir pra segurança pública, educação, saúde, saneamento, bolsa-família, etc., vai parar nos partidos políticos e daí será distribuído para os candidatos, preferencialmente para os atuais parlamentares, que farão folgadamente suas campanhas eleitorais com a grana de nossos impostos. A qualquer par de olhos atentos, temos um comando parlamentar punguista, pois a qualquer descuido eles metem a mão no nosso bolso. Alguns parlamentares entraram com mandado de segurança contra o golpe e o Ministro relator, Kassio Nunes, poderá mandar refazer a votação. Cabe ainda o veto presidencial, ou seja, jogaram a responsabilidade nos ombros de Bolsonaro.


Penso, não de hoje, que UM centavo do dinheiro público enfiado em campanha eleitoral é dinheiro desviado da sua finalidade. Não é para isso que entregamos nossos impostos ao governo. O certo é que cada candidato arque com as despesas de sua campanha a partir de suas próprias rendas em determinados limites e da contribuição espontânea, também limitada, dos filiados aos partidos políticos. Essa história de que a montanha de recursos em causa é o custo da democracia é apenas malandragem, não existe em nenhum lugar decente. O custo da democracia é o da administração das eleições e o do funcionamento das casas legislativas que, aliás, há muito exorbita o razoável. Escandalosamente, no Brasil, apenas tentar conquistar um mandato eleitoral já virou meio de vida bancado pelos recursos públicos.


Outra história da carochinha é dizer “sem dinheiro público, não tenho como fazer campanha”. Que mimimi é esse? Os atuais parlamentares já dispõem de verbas milionárias do Fundo Partidário e possuem inúmeras vantagens, passaram no mínimo quatro anos distribuindo favores e recursos, são muitíssimo conhecidos e têm uma folha de serviços prestados (ou não) à sua comunidade. Ela, a comunidade, que o reconheça e o reeleja conforme merecimento e compromisso com a causa. Duro é pro candidato de primeira viagem, que precisa enfrentar uma cacicada endinheirada e influente na administração pública e na imprensa.


Consta que o presidente Bolsonaro vai vetar esse aumento seboso. Tomara que vete mesmo e o fundão vá a ZERO. Se os parlamentares quiserem, derrubem o veto, pelo menos, assim, conheceremos as digitais dos parlamentares que querem enfiar a mão em nosso dinheiro suado e escasso.


Hoje, quem tramou o aumento indecoroso esfrega as mãos torcendo para que o Bolsonaro não tenha saída e o sancione. Do outro lado, governistas se borram de medo de, Bolsonaro vetando, o impeachment pegue fôlego com a insatisfação gerada no centrão oportunista. Colocaram o presidente entre a cruz e a caldeirinha. Como disse antes, prefiro o veto, pois assim as caras aparecem, os rostos ficam visíveis e reconhecíveis pelos eleitores. Não podemos permitir é o que aconteceu na votação da LDO, quando, com algumas exceções, não vimos quem ia no bonde do fundão que passou correndo.


Se vivêssemos uma verdadeira democracia e não um arremedo, a estas horas todo deputado e senador estaria se explicando e declarando como e porque votou, votaria ou votará. O eleitor pressionaria o parlamentar e ele seria capaz de votar conforme a tendência de seu eleitorado. Infelizmente, neste caso, na hora mais nobre da atuação parlamentar – legislar, os nossos representantes nos deram as costas. Curioso que ninguém, ou, quase ninguém, se explica. Certamente apostam na ignorância do povo, acreditam que uma verbinha aqui e outra ali, uma obrinha aqui e outra ali, resolvem o problema. Talvez até resolvam mesmo, talvez o povo não saiba do que está acontecendo, afinal, de modo geral a imprensa não se esforça em esclarecer e eles se escondem desse debate. 


Aproveito a oportunidade para pedir aos nossos parlamentares, independentemente de siglas, que pelo menos declarem seus votos, justifiquem e assumam publicamente as suas posições. Nos convençam de que é necessário arrancar mais 3,7 bilhões de nosso couro para eleger vossas excelências. Deve haver um motivo justo, né? Quem sabe o eleitorado até aplauda. Certo é que o eleitor merece uma explicação.



Valterlucio Bessa Campelo escreve às sextas-feiras no ac24horas e eventualmente em seu BLOG