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Calor extremo e seca anual: o que será feito para lidar com essa nova realidade?

RIO ACRE COM NÍVEL BAIXO - FOTO: SÉRGIO VALE

Apesar da promessa de que voltaria a falar sobre o Plano Acre 10 Anos, do Governo do Estado, não me parece razoável tratar neste momento de outro assunto que não o calor extremo e a seca que hoje afligem nossa terra. Tanta quentura e secura indicam que algo estrutural e grave está acontecendo, e diz respeito não apenas à Amazônia mas ao sistema Terra como um todo. Como é óbvio, trata-se da mudança do clima resultante do aquecimento do planeta. É bem verdade que uns poucos teimam em acreditar que está tudo normal, apesar de tantas evidências em contrário. Outros poucos vêm mudanças, mas negam que tenham relação com interferências humanas. A verdade é que entre cientistas e outras gentes razoáveis o consenso está praticamente estabelecido que o aquecimento do planeta é resultado da liberação na atmosfera de altos volumes de carbono dos estoques que a natureza levou milhões de anos para guardar, principalmente pelo uso intensivo do petróleo, do carvão mineral e da derrubada e queima de florestas.


Este ano, ao aquecimento provocado somou-se um El Niño intenso, potencializando os efeitos das mudanças já em curso. O resultado é esse que estamos sentindo: calor infernal, escassez de água, secamento de rios, peixes morrendo, cidades mais isoladas ainda e pessoas sofrendo. Imagine, leitor, a vida de quem não tem meios para fazer uso de ar condicionado e ventilador. Seguramente, é uma autêntica antevisão do inferno!


Diante dessa dura realidade que, tudo indica, veio pra ficar, a questão para nossos políticos e dirigentes públicos é sobre que medidas serão adotadas para proteger a população pobre, adaptar os serviços públicos e a economia e promover ajustes nas formas de uso da terra que atenuem a pressão sobre rios e florestas. A última coisa que precisamos, neste momento, é de negacionistas argumentando sandices, a exemplo dos adeptos da terapia cloroquina e antivacina na pandemia.


Algo precisa ser feito. Em 2024, quando a situação estará pior, que medidas nossos governos terão adotado, após o quase colapso de 2023? Ou, que realidade nos aguarda em 2033, daqui a dez anos, se nada for feito? A mudança do clima afeta a todos, em todas as partes. Dos esquimós do Alaska, que agora vêm o gelo quase desaparecer no verão, aos ribeirinhos da Amazônia. Mas, entre as classes sociais, o sofrimento tem intensidade muito distintas. O barão que extrai o petróleo do Alaska e contribuí para o planeta seguir aquecendo não sofre as consequências da mesma forma que os esquimós, assim como o “produtor” que converte floresta em pasto, liberando gases na retirada da cobertura vegetal e na criação do gado, não sofre os efeitos da mesma forma que o ribeirinho. E no final, mais uma vez, os pobres pagarão a conta!


Fazer alguma coisa passa tanto por adaptar-se à nova realidade quanto agir nas causas da mudança indesejada. Claro que, por se tratar de um problema global, não seremos nós aqui a resolvê-los. Mas, talvez poucos lugares possam fazer tanto quanto quem está aqui na Amazônia. Isso porque o desmatamento de nossas florestas é responsável por 26,7% de gases estufa gerados pelo Brasil, o que nos coloca na triste condição de campeões nacionais do aquecimento. Então, quando o assunto é o que fazer para evitar que a Terra continue aquecendo, serão fundamentais ações como a contenção do desmatamento e das queimadas, a proteção da riquíssima biodiversidade local, o cuidado com os rios e outras fontes de água, entre outras. E ao fazer isso, é importante dizer, a Amazônia estará colaborando para a manutenção do regime de chuvas no centro-sul do Brasil, garantindo água para o agronegócio do Centro-Oeste e para os principais reservatórios geradores de energia do país. Isso implica, obviamente, em controlar a pressão econômica sobre as florestas. Neste momento, por exemplo, os maciços florestais que
estão sendo atacados por grileiros e outros exploradores, ávidos por “abrir” novas áreas para a pecuária, são os municípios de Feijó e Tarauacá e a área da Reserva Extrativista Chico Mendes. É preciso que os poderes públicos sejam capazes de oferecer alternativas econômicas nessas zonas, junto com serviços públicos adequados, de modo a neutralizar o discurso fácil de que é preciso destruir para progredir.


Outra frente de ação está relacionada com medidas de adaptação. No período de alta estiagem, entre agosto e outubro, será necessário ajustar o funcionamento dos serviços públicos, do comércio e de atividades com alta exposição ao sol, como a construção civil. Não é razoável, por exemplo, permitir que escolas funcionem sem ar-condicionado. Uma criança não aprende sob calor de 38 graus. E nem quando a voz da professora tem que concorrer com barulhentos ventiladores. Mesmo o período anual ou o horário de funcionamento das escolas precisarão ser reavaliados. O poder público terá que adotar meios e estratégias de auxílio às famílias vulneráveis para a obtenção de certos bens, produtos e serviços imprescindíveis à convivência com o sol e o calor intensos. Aquisição de ventiladores, geladeiras e protetores solares, bem como a realização de campanhas de orientação sobre consumo de água e uso de protetor precisarão ser realizadas. O fato é que os governos precisam lidar com a estiagem com a mesma visão de emergência pública que usa para enchentes e alagações. São eventos da mesma natureza: condições extremas que denunciam a dura mudança em curso.


Agir diante do que está acontecendo é cada vez mais urgente. Não fazer nada tem que ser visto pela sociedade, e pelos eleitores, como um crime contra o interesse de todos.