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Giordane: “É preciso democratizar o diálogo entre os magistrados e o Tribunal de Justiça do Acre”

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20150511052536Considerado da nova geração de juízes do Acre, Giordane Dourado, tem 38 anos de idade dos quais 13 como magistrado. O jovem juiz assumiu recentemente a presidência da Associação dos Magistrados do Acre (ASMAC), função que exerce pela segunda vez. Com ideias liberalizantes a favor da liberdade de imprensa e da independência do Judiciário, Giordane Dourado concedeu entrevista exclusiva ao ac24horas.


Juiz Titular do Terceiro Juizado Civil de Rio Branco e membro da Secretaria de Prerrogativas da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Dourado fez uma análise do momento político brasileiro. Tratou de assuntos polêmicos relacionados ao Judiciário e a política com absoluta liberdade. Ele também não se furtou de criticar a atual relação “problemática” da entidade de classe que preside, a ASMAC, com o Tribunal de Justiça do Acre (TJ), administrado pela recém empossada desembargadora Cezarinete Angelim.


ac24horas Muita gente alega que o Judiciário do Acre está contaminado politicamente. Qual a sua visão sobre isso?

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Giordane Dourado – Eu não vejo esse cenário. O poder judiciário é vocacionado para ser independente pela própria Constituição. Os juízes são vitalícios, têm prerrogativas, têm garantias e na nossa rotina interna isso não aparece, a chamada influência política.


Giordani_300_capaac24horasA nível de Brasil algumas pessoas alegam que os dois últimos presidentes, Lula (PT) e Dilma (PT), têm escolhido membros do Supremo que têm ligações políticas com o PT. Na sua opinião isso realmente está acontecendo?


GD – Não seria nenhuma surpresa o presidente da República escolher para integrar a Suprema Corte algumas personalidades do mundo jurídico com quem ele tenha afinidades. Mas nos últimos anos nós observamos escolhas muito boas para o Supremo Tribunal Federal. Posso citar o ministro Fux e, a última escolha, do professor Fachin, foi festejada dentro da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Então claro que existe uma afinidade entre o escolhido e quem escolhe, mas uma vez integrante da Suprema Corte o que se espera é independência. E foi o que a sociedade enxergou no julgamento do Mensalão e, agora, na condução do chamado Petrolão.


ac24horasQual a função dessa entidade a ASMAC que o senhor preside?


GD – É um entidade representativa da magistratura do Estado do Acre. Mas ela não existe apenas para tratar de interesses corporativistas como se pensa. A ASMAC é reconhecida por lei estadual e municipal como entidade de utilidade pública. Então além de tratar de interesses da magistratura também tem atuação social em programas e encontros voltadas à comunidade. Como de fato já começamos este ano em parceria com o município de Rio Branco o projeto Nosso Direito.


ac24horas Uma das alegações que se faz em relação a área jurídica é justamente o distanciamento da população. Primeiro por conta da complexa linguagem jurídica a qual os leigos não têm acesso. Como a ASMAC nessa tua gestão pretende diminuir a distância entre os magistrados e a população?


GD – O Judiciário precisa reconhecer que durante muito tempo esteve mesmo distante. Mas isso decorre da própria natureza da função do juiz que trabalha com processos e audiências e, é muito difícil sair de um gabinete. Mas com a percepção de que precisa existir uma aproximação o Poder Judiciário iniciou ações sociais para reduzir essa distância. Posso citar o projeto Nosso Direito da ASMAC em que a gente vai aos bairros e comunidades carentes fazer um bate-papo direto com as pessoas. A AMB tem ações que levam juízes para dentro das escolas. Então o Poder Judiciário reconhece que existiu um distanciamento, mas ao mesmo tempo está renovando as suas perspectivas e promovendo ações para tirar o juiz do gabinete e leva-lo para perto da comunidade.


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Nelson Liano entrevista o Juiz Giordane Dourado

ac24horasO senhor quando assumiu a ASMAC, pelas entrevistas que concedeu à imprensa, já anunciou a sua preocupação da relação da mídia com o Judiciário. Principalmente no que diz respeito à liberdade de imprensa. O senhor pretende trazer um curso para os jornalistas entenderem melhor o que é licito ou não no exercício da profissão. Além disso, como o senhor entende a liberdade de imprensa?


GD – Não existe maior guardião da imprensa no Brasil e no mundo do que o Poder Judiciário. A liberdade de imprensa é uma conquista civilizatória que está na nossa Constituição. Ela é assegurada em última instância pelo Poder Judiciário. O que nós queremos com esse curso é trazer esclarecimentos, orientações e noções para fortalecer o exercício da imprensa. O jornalista precisa saber a real dimensão jurídica do seu trabalho. Até onde pode ir e como pode se defender. Então a ideia é fortalecer o exercício dos profissionais através da orientação. O Poder judiciário e a imprensa são parceiros muito importantes para a democracia. Ressalto que em qualquer sistema político totalitário na história, pode prestar atenção, os regimes de exceção começam atacando dois setores: o judiciário e a imprensa.


ac24horasAgora, recentemente, tivemos um caso no Acre em que magistrados processaram veículos de comunicação por conta de matérias veiculadas que desagradaram. Como o senhor analisa essa situação?


GD – A questão de existir processo de magistrados contra profissionais de imprensa não demonstra nenhum tensionamento entre o Poder Judiciário e a imprensa. Os magistrados são pessoas que eventualmente podem se sentir ofendidas na sua honra como qualquer um. E dentro desse contexto vão procurar reparação, mas enquanto pessoas. Não é o Judiciário contra a imprensa. Isso é normal na nossa democracia, é licito esse tipo de debate.


ac24horasQuer dizer que institucionalmente o senhor não se lembra de nenhum caso de alguém entrando com ações contra a imprensa?


GD – Institucionalmente não. O que nós temos são ações de alguns magistrados enquanto pessoas que se sentiram ofendidos. Na nossa República qualquer pessoa que se sinta ofendida em razão de uma publicação pode recorrer ao Judiciário e pedir uma reparação. Isso não significa também que a reparação será automaticamente concedida. Haverá um debate do processo e se verificará o quê aconteceu.


ac24horas– Gostaria que o senhor traçasse um paralelo entre o papel da imprensa e do judiciário, na sua visão, na atual democracia brasileira.

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GD –  Os dois são guardiões da liberdade. O Judiciário tem as suas atribuições constitucionais de zelar pelas liberdades individuais, velar os litígios e fiscalizar a probidade na administração pública. E a imprensa veicula a informação e o conhecimento. Sem isso dificilmente uma democracia funcionaria. É tão importante o papel da imprensa que muitas questões relevantes ao Poder Judiciário surgiram da atividade jornalística. Foi o caso do Mensalão e do Petrolão. Eu diria que são duas instituições guardiãs da liberdade e cada uma com suas atribuições constitucionais.


ac24horas Eu sei que o senhor é um frequentador das redes sociais e que manifesta o quê pensa por esse meio. Atualmente, além da questão da imprensa, temos essa mídia com acesso aberto para toda a população se manifestar. Como o senhor vê essa grande popularidade das redes sociais e o cidadão comum como criador de conteúdo? E também como meio gerador de boatos que acabam em processos complexos?


GD-Eu vejo como uma revolução dos canais do pensamento e da liberdade de expressão. Inclusive, vou escrever um trabalho em Portugal exatamente sobre isso, liberdade de expressão no meio digital. Olha, qualquer potencialização da liberdade de expressão é bem vinda. Quanto mais as pessoas puderem se expressar melhor. Antes das mídias tradicionais como o rádio e a TV você tinha os comícios para manifestação do pensamento. Mas chegou a internet para transformar cada pessoa num formador de opinião. Hoje quando se escreve no Facebook ou no Twitter muita gente acessa e acaba influenciada. Agora, toda atividade humana tem o seu efeito colateral, o seu lado nocivo. Pode se manifestar nas redes sociais e, eventualmente, também ofender a honra de outros ou veicular informações falsas. Esses riscos não apagam o mérito e a boa revolução de todo mundo poder se manifestar através das redes sociais.


ac24horasAté por conta desses efeitos colaterais alguns políticos falam e propagam um controle das redes sociais e da internet. Qual a sua opinião sobre isso?


GD – Tem que se ver qual o tipo de controle. A gente não poder ter no Brasil nenhuma ação estatal que impeça previamente a pessoa de se manifestar. Isso é censura. E os controles hoje já são traçados pela própria Constituição que diz que todo mundo tem a liberdade de se expressar, mas se resguarda o direito à honra e a imagem. Não vejo porque se criar novos mecanismos que possam reprimir a liberdade de expressão. Esse é um caminho perigoso.


ac24horasUm dos debates que se faz na política é da judicialização das eleições no Brasil pela própria complexidade das leis. Isso acaba tirando o acesso dos cidadãos comuns às leis brasileiras?


GD – A democracia brasileira depois da Constituição de 88 é ainda jovem. Na verdade, as mudanças começaram desde 82 quando se permitiu eleger diretamente. E em 89 houve a primeira eleição direta para presidente. Ao mesmo tempo que a nossa democracia tem vícios antigos que vem do coronealismo em que o voto era imposto ou comercializado. Então essas regras surgem não para reprimir a vontade do eleitor, mas para assegurar que a vontade seja expressa nas urnas de forma livre e consciente. Muitas vezes se critica que a Justiça Eleitoral aperta demais os partidos e os candidatos. Mas esse rigor é em favor do eleitor para não permitir que vícios antigos e falhas do sistema contaminem a vontade popular.


ac24horas O Poder Judiciário executa as leis. Mas quem cria as leis é o Poder Legislativo. E muita gente não sabe que vereadores, deputados e senadores tem essa função de criar leis. Outros dizem que os nossos Códigos Civil e Penal são bastante desatualizados. Na sua opinião os nossos legisladores estão cumprindo bem os seus papéis para fazer leis que reflitam as necessidades do povo brasileiro?


GD – Eu vejo uma evolução. O nosso Código Civil é de 2002 que revogou o antigo de 1916. A cada semana observo no parlamento o debate de leis importantes. E cito leis recentes como o marco civil da internet que foi aprovada. Nós temos uma produção legislativa no Brasil muito boa. O quê não pode acontecer é essa produção ser feita a toque de casuísmos. E dou um exemplo. Todo mundo se lembra do assassinato da atriz Daniela Peres, filha da autora de novelas Glória Peres. Quando houve o homicídio se produziu a toque de caixas a Lei dos Crimes Hediondos. Essa Lei teve vários problemas de constitucionalidade porque foi feitas às pressas. Então não podemos deixar que no Brasil fatos de grande comoção possam influenciar a atividade parlamentar para que se produzam leis que ofendam a Constituição. Hoje com a TV Câmara e a TV Senado cada cidadão pode acompanhar o debate legislativo. Temos hoje a Lei da Terceirização que tem divido opiniões, mas que está na boca do povo. Leio sempre a sua coluna que fala que Política é Assunto Popular. O debate legislativo atualmente é assunto popular. As pessoas comentam sobre as leis e isso é um reflexo da evolução da nossa sociedade.


ac24horasPoderíamos analisar também a votação de medidas provisórias que alteram alguns direitos trabalhistas há poucos dias na Câmara dos Deputados.


GD – Eu não teria nenhum posicionamento, no momento, do mérito dessas medidas provisórias. O que a gente vê é que o sistema constitucional está funcionando. A presidente indicou e cabe à sociedade através das entidades representativas de classe avaliar as vantagens e desvantagens.


ac24horasVindo para o Judiciário do Acre. Algumas pessoas têm feito contestações em relação a liberdade interna. Entre os magistrado e administração do Tribunal de Justiça do Acre (TJ). O que realmente está acontecendo?


GD – Nos dois últimos anos tivemos a administração do desembargador Roberto Barros que se mostrou muito atuante no TJ. Seja pelo dinamismo, pelo respeito e pela democracia com que ele conduziu a Corte. E nesse período a ASMAC foi uma grande parceira da administração do Tribunal. Renovamos agora as administrações tanto do TJ quanto da ASMAC. Nós queremos chegar a esse mesmo nível de parceria, de colaboração e de cooperação. Por enquanto, nós ainda não conseguimos afinar o relacionamento para ficar no nível que estávamos nos dois últimos anos, com o Roberto Barros. Temos uma nova presidente, desembargadora Cezarinete, que tem um perfil diferente e concepções diferentes. Nós temos, inclusive, muitas expectativas em relação a ela. Mas até agora precisamos conversar mais e democratizar mais o debate interno entre a administração do TJ, os magistrados e os servidores para que possamos continuar a avançar.


ac24horas O que está faltando para haver essa afinação? Onde está a divergência entre a ASMAC e o TJ?


GD – Acho que é preciso mais tolerância, um pouco mais de respeito e aproximação para que a ASMAC e o TJ possam continuar a sua natural vocação de parceria. A presidente tem um perfil rigoroso e, às vezes, um pouco duro. Isso acaba gerando um discurso que pode soar não muito democrático, não muito tolerante com a ASMAC. Nós queremos que ela nos ouça com calma. E entenda que eventuais avaliações e críticas com propostas feitas pela ASMAC não representam ameaças à administração do TJ. Menos ainda de usurpar a função da presidente. Mas sim de colaborar. Falta hoje uma consciência de que a ASMAC é uma parceira e uma colaboradora para que não haja nenhuma manifestação hostil em relação a ASMAC.


ac24horasA ASMAC teria a função de expressar o pensamento da categoria?


GD – O TJ, na pessoa da sua presidente Cezarinete, representa a instituição Poder Judiciário. Mas quem representa os magistrados, os desembargadores e juízes é a ASMAC. Então é uma liderança institucional e a outra da classe. São duas lideranças que precisam dialogar para surgirem ações em prol do Judiciário e da sociedade.


ac24horas Vamos terminar falando de política. Temos visto muitas manifestações a favor do impeachment  da presidente Dilma (PT). Como o senhor vê esse momento que o Brasil atravessa. Temos 13 anos de um partido supostamente de esquerda no poder. Qual a sua análise do quadro político brasileiro?


GD – A impressão que tenho dos debates e dos indicadores sociais e econômicos é que o Brasil caminha pra frente como um país que se destaca no plano internacional, mas que precisa sim de correções. Uma ampla correção em vários setores. Precisamos de uma Reforma Política e de mais rigor e controle no combate à corrupção e, sobretudo, ouvir a voz das ruas. Quando milhares de pessoas saem das suas casas para se manifestarem seja a favor, como aconteceu no dia 13 de março, ou contra, como aconteceu no dia 15 de março, significa que a sociedade como um todo quer mudanças. Não estou falando em mudança de partido ou impeachment da presidente, mas mudança de alguns aspectos a serem corrigidos na política, na economia e nas instituições.


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