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Pesquisa, pra que te quero?

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Diz a lenda que certa vez, ao ser indagado por um jornalista sobre a validade de uma pesquisa eleitoral, Antonio Carlos Magalhães, o velho ACM, teria respondido “Só acredito nas pesquisas que eu mesmo manipulo”. Quis dizer a velha raposa política da Bahia que todas as pesquisas eleitorais são de algum modo manipuladas. São? Não sei, mas tem muito rabo solto por aí.


Penso que quanto menor o eleitorado, mais flagrante é uma eventual manipulação. Em pequenos municípios, os votos e as intenções são mais perceptíveis, as pessoas são mais conhecidas entre si, as tendências são mais óbvias, de modo que resultado de pesquisa que coloque determinada candidatura muito acima do razoável cai logo no descrédito. Pesquisas muito estranhas arriscam virar memes nas redes sociais, embora alguns não se importem.


Nos últimos dias, divulgadas conforme a Lei ou nos bastidores das campanhas para consumo interno, proliferam em Rio Branco números e colocações que fazem lembrar o já falecido ACM. Obviamente, vão pro lixo depois de dois ou três dias de repercussão nos sites de notícias e nos programas eleitorais, último objetivo das ditas cujas. Um horror. Um desperdício de dinheiro e um deboche em relação ao eleitorado que se vê alvo da tentativa de enganação.


Quem já trabalhou em campanha eleitoral sabe que pesquisas têm basicamente as seguintes serventias:


a) Anima a militância – a turma apoiadora, achando que o seu candidato está bem colocado e possui viabilidade, trabalha mais, corre mais, aquele número é como uma cenoura pendurada na frente do coelho. 


b) Desanima o exército adversário – assim como uma boa colocação anima do lado de cá, um má colocação desanima do lado de lá, ou seja, a perspectiva de vitória aqui implica a perspectiva de derrota ali, fazendo com que os apoiadores se tornem expectadores e o eleitor indeciso ou pouco firme possa aderir ao candidato que está à frente. 


c) Oferece informações úteis ao candidato –  os dados são valiosos para uma avaliação da própria performance na campanha, fazendo-o mudar de tática, orientando a campanha para certos grupos de interesse, alterando a intensidade do debate etc.  


d) Atrai apoiadores – candidaturas bem colocadas, com chances de vitória,  atrai apoios, financiamentos, convence indecisos, dissuade resistências. O voto útil acompanhar a tendência. Se a informação for verossímil, o candidato soma votos.


e) Gera fato político – os jornais, sites de notícias e o próprio programa eleitoral se ocuparão de propagar o resultado da pesquisa, preenchendo assim, com propaganda positiva, o tempo disponível.


No primeiro turno, todo esse processo é exacerbado. São muitos candidatos, muitas possibilidades que compõem o cenário. A luta é em campo aberto com muitas frentes e o eleitor está observando os fatos políticos. Aliás, inúmeros estudos psicológicos já demonstraram o impacto das pesquisas eleitorais na decisão do eleitor.


Sendo assim, o candidato pensa “Se posso ter todo esse resultado apenas fornecendo alguns números à sociedade, com carimbo de credibilidade dado pelo TRE, por que não?” Por que é crime, ora! A Lei 9.504 de setembro de 1997 estabelece normas para as eleições e em seu Art. 33, § 4º que a divulgação de pesquisa fraudulenta constitui crime, punível com detenção de seis meses a um ano e multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR..


É crime mesmo, mas, convenhamos, que pena é essa? Então, o sujeito (um instituto qualquer) divulga uma pesquisa capaz de distorcer o processo eleitoral introduzindo mentiras na informação e estabelecendo falsas tendências, logo, fraudando também a democracia, alterando na base a sua essência – a vontade popular, e a pena correspondente é, assim, risível? É como dizer que vale à pena o risco, daí, tanta pesquisa maluca em véspera de eleição.


E, creiam, não é nada fácil comprovar a falsidade de uma pesquisa eleitoral. Já tentei certa vez contra o IBOPE, enquanto participava de uma campanha há muitos anos. É dificílimo e trabalhoso, exige análises estatísticas e argumentos muito consistentes, pode-se dizer que a prova da fraude dá mais trabalho do que a própria. Dúvida? Quantas pesquisas eleitorais você conhece que foram julgadas fraudadas e seus institutos penalizados? Normalmente, o prejudicado desiste antes de tentar provar a fraude. Às vezes, sai mais barato, viável e rápido encomendar uma em sentido contrário, pelo menos se instala a dúvida no eleitorado.


Note-se que tal comportamento é mais comum nos períodos iniciais da campanha. É que, ao aproximar-se o dia fatal, os institutos tendem a preservar a própria imagem e convergirem à realidade. Os candidatos certamente encontrarão motivos para justificarem eventuais mudanças negativas.


Funciona? Às vezes sim. Por aqui há exemplos de campanhas que foram ganhas ajudadas por pesquisas de última hora dando vantagens e reações surpreendentes. No abrir das urnas, pequenas diferenças, na margem de 1-2% não precisam ser explicadas exaustivamente. A frase mais comum é “ganhou no dia, foram mais organizados, etc.” O perdedor, chora na calçada.


Ahhhh, ia esquecendo. É claro que existem institutos muito sérios que, independentemente da oferta financeira, se negam ou sequer cogitam alterar dados da realidade observada, mesmo dentro da famosa margem de erro. 



Valterlucio Bessa Campelo escreve no ac24horas todas as sextas-feiras.