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Ascenção e queda de um parlapatão

Em uma época distante, em um reino pros lados do norte, deu-se que um melieiro de nome Alarico, filho da pedicure, se meteu numa enrascada digna das bufonarias da antiguidade. Não que ele fosse totalmente aléxico ou abléptico, mas muitas vezes suas ideias pareciam abstrusas, o que não o impedia de a todo momento emitir suas opiniões acrimoniosas. Muitas delas, aliás, próprias de um alarife alcachinado, tinham como objeto temas criados aleatoriamente em sua cachola abobarrada.


Como era um típico acabotinado, estava sempre a exprobar quem por ventura lhe parecesse inimigo, que criava com facilidade em vista de seu egotismo. Pessoalmente, o sujeito era um catimbau, tinha uma aparência de varapau cevado, um tanto proboscídeo, mas se achava airoso, gostava de exibir-se como se a labrostia fosse suficiente para disfarçar a sua mefítica. Nem Freud explicaria seu motejo. A firma inteira se perguntava como havia conseguido se amancebar três vezes, embora, olhando bem, suas parceiras fossem todas quasimodescas.


Cedo conseguiu um emprego de conferente. Era o que estava à altura de sua tarouquice. Olha um, confere e guarda, olha outro, confere e guarda, olha mais outro, não confere e descarta, e assim o tempo passava sem que o parvo precisasse realizar qualquer raciocínio elaborado. Serviço enjoado, mas arriscado porque o caráter crapuloso do indivíduo pode levá-lo a dar o errado pelo certo e burlar a empresa.


Não se pode garantir que tenha realizado alguma estrepolia, mas não era normal que fazendo a mesma coisa, sem sair do lugar durante décadas, aquele lambaio conseguisse amealhar riqueza. Um leguleio raramente ajunta haveres, mas ele ajuntou. Talvez por causa disso tenha conseguido muitas vezes apresentar-se assaz logorreico, afinal, sempre haverá quem dê oiças a um linguaraz.


Ninguém sabe como aconteceu, mas o sujeito conseguiu entrar no âmbito do dono da firma, um homem de reconhecida lhaneza que não negava o ombro a um conterrâneo. Não suspeitava o patrão que estava abrindo uma fresta em sua intimidade para uma abotrofera abajoujada, querente sua proximidade para em seu nome praticar toda sorte de cambalacho. 


É certo que desde sempre a boa-fé foi confundida com atoleimação, dando vezo a que bargados usufruam de benesses e circunstâncias, mas o possuinte era matraqueado, não deveria ter permitido que aquele churdo o levasse a frequentar certa choldraboldra. Aconteceu que o biltre ficou sabendo através de um cuvilheiro amigo seu, que o patrão tinha uma secreta dipsomania controlada por remédios comprados em outra freguesia, então armou-lhe uma cilada e o introduziu num grupo depravado, onde o aproximou de uma meretrícula. Daí em diante, o mofatrão equidínico passou a sutilmente chantagear o chefe maioral, desassossegando o coitado e dele tirando vantagens para si e para sua família.


Não contava o mandrião, que a mulher do chefe já sabia que o abiúdo estava preparando certas situações e, seu marido, conhecido por ser abaladiço, andava meio ababelado. Então, ela resolveu aprontar um forjo para pegar o engabelador. Para isso, contratou um espia e o mandou segui-lo, procurando alguma malandragem em que estivesse envolvido. Não foi fácil, mas deu resultado e deu um espavento medonho. Pois não é que aquela tranqueira com ares de especioso tinha um caso secretíssimo com um novel? Aliás, provavelmente não seria o primeiro. Daí que ela entendeu a causa daquele espurco viver rondando o seminário. Ela pensou: “Destá, vou engazopar esse espevitado na primeira oportunidade”. 


Não tardou para ela decidir fazer uma festa e convidou alguns amigos, entre eles o tal noviço. Aprontou tudo e de última hora chamou o patranheiro, que chegou em poucos minutos. Quando ele entrou e viu na sala o seu amigo secreto, quase cai e dá com os cornos na mesa. “O que estaria fazendo ali o jovem abemolado?”.


Ocorre que, desde cedo, o rapaz estava euforicamente a beber, recitando poemas e tocando piano, fazendo-se o centro das atenções. Seu juízo já havia se apagado, era só alegria. Quando viu entrar o seu companheiro de alcova, ao invés de disfarçar, correu a lhe abraçar. Bastou para que aquela vintena de convidados deduzisse que o conhecido rebolão e pseudosófico escondia de todos um homoromance. O refece pegou o rapaz pelo braço e saíram juntos alegremente. Nos dias que se seguiram, ninguém mais os viu na cidade.



Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS e, eventualmente, no seu BLOG, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no DIÁRIO DO ACRE, no ACRENEWS e em outros sites. Quem desejar adquirir seu livro de contos mais recente “Pronto, Contei!”, pode fazê-lo através do e-mail valbcampelo@gmail.com