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Data venia, Dr. Molion, divirjo

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Valterlucio Bessa Campelo


Nos últimos dias 28 e 29, o eminente climatologista, Prof. Dr. Luis Carlos Baudicero Molion, reconhecido internacionalmente por sua postura cética quanto ao aquecimento global antropogênico – AGA, esteve no Acre dando palestras para públicos diversos – ALEAC, SEBRAE e UNINORTE. Pareceu interessante a ideia de expandir e diversificar o público ouvinte e fazer germinar uma reflexão mais ampla sobre o aquecimento global “provocado pelo homem” que, segundo o próprio, está mais para seita obscurantista que se nega ao debate, na suposição de que o cientificismo de maioria basta. Molion, em linguagem acessível, nos leva a refletir sobre a precariedade da “teoria” cujas predições alarmistas são elaboradas por modelos de computador em que os resultados dependem, por óbvio, dos dados que lhes fornecemos.


Sua palestra divide-se em duas partes. A primeira, climatológica, transmite a convicção de que a metodologia que sustenta as declarações do IPCC é furada dos pés à cabeça e que estamos sob um jogo de interesses os quais, para se firmarem, encontraram no AGA um ponto comum. Desde que eficientemente disseminado, o pavor de que o planeta aqueça por nossa culpa, une as pessoas para que sob determinados comandos políticos e midiáticos obedeçam a uma agenda que exclui de modo raso o suprimento das necessidades básicas das populações pobres do planeta. Para os adeptos do AGA, se a defesa da sobrevivência humana no planeta significar o bem-estar apenas da parcela mais rica, ainda que as nações mais pobres jamais conheçam o progresso, que assim seja. É o que está em curso na restauração de Malthus subjacente ao pânico aquecimentista.


A segunda parte da palestra, o Dr. Molion dedicou à Amazônia e ao seu desenvolvimento. É aí que divirjo. Na minha humilde opinião, o professor deveria ter ficado na climatologia mesmo. Com relação ao desenvolvimento econômico e social, pelo menos neste caso, o palestrante comete falhas que só podem ser justificadas pelo desejo de equilibrar a mensagem (diametralmente antagônica) em relação aos ambientalistas, ou trata-se de um lamentável desconhecimento sobre o tema.


Concordo com o Dr. Molion que o desflorestamento da Amazônia seja levado ao mínimo necessário (isto inclui desmatamento zero em algum momento), por seus efeitos sobre a própria Amazônia e não sobre o clima global que, se houverem, seriam desprezíveis.  É certo, inegável, que a cobertura original da floresta exerce papéis biológicos, físicos e químicos extraordinários, gerando produtos reais e potenciais riquíssimos e mesmo desconhecidos em seu valor, portanto, não devemos desperdiçá-los. OK, tamo junto até aí, diria coloquialmente. 


Divirjo, contudo, quando o Dr. Molion praticamente desconsidera, esconde, omite ou minimiza o papel que a agropecuária pode desempenhar no desenvolvimento regional. Quando o ouvi falar de exportar animais exóticos e peixes ornamentais, olhei pros lados na plateia do SEBRAE e só vi meneios negativos. Parecia tão obvio!


Não, Dr. Molion, o Acre já superou essa fase floresteira, da ilusão de que microeconomias espalhadas na floresta fazem uma economia forte e pujante. Em nenhum lugar isso deu certo como motor do desenvolvimento. Pode em boa fase propiciar ocupação e renda para pequenos grupos ou empreendedores individuais, retirar da miséria algumas pessoas, contribuir para afirmar a diversidade florestal e revelar produtos, tem alguma serventia na contenção de fluxos migratórios internos, mas muito dificilmente será capaz de projetar a economia a patamares que diminuíam de modo relevante a brutal dependência em relação aos recursos federais. 


Quando se tratar de desenvolvimento da Amazônia, temos que levar em consideração o que temos ou podemos ter de abundante, técnica e economicamente viável. Temos que pensar em escalas que resultem em barateamento e vantagens competitivas no mercado, sejam intrínsecas ao produto ou locacionais, em acesso a grandes mercados consumidores, em fluxos de capital que mobilizem setores importantes da economia. 


A visão correta para a Amazônia Ocidental, onde nos inserimos, se desenha com uma saída que nos coloque de cara com os mercados asiáticos, que como foi amplamente divulgado, estão interessados em adquirir muita e, apenas muita quantidade, de carnes, grãos, madeiras, frutas e amêndoas frescas ou processadas etc. Pulseiras de sêmenes de jarina não estão na agenda.


Importante é que se desenvolva uma perspectiva de agregação de valor aos produtos exportáveis de modo que não saiam in natura, mas devidamente industrializados, se possível, no ponto de consumo, o que geraria mais emprego e renda.


Alguém poderá dizer que não podemos produzir muito de nada disso, que no Acre há limitações ambientais e mesmo técnicas e agronômicas para tal. Em alguns casos, talvez, mas podemos nos somar à produção de outras regiões acrescendo escala ao comércio desde que as exportações vindas dos estados grandes produtores passem por aqui e não o contrário.


Dia desses, desdenhando de uma prometida nova modelagem para o desenvolvimento acreano, alguém exibiu um dado muito “revelador”, pasmem! este ano, o segundo maior produto acreano exportado é a castanha-do-brasil, com cerca de 17% do total, alcançando cerca de 4 milhões de dólares. Jura? É, mas isso equivale a UMA SEMANA de exportações de carne de Rondônia, já as exportações anuais de madeira acreana equivalem a 3 SEMANAS de soja rondoniense. Se toda a pauta acreana de exportações, da qual não consta significativamente carne, grãos ou frutas, equivale a 12% das exportações apenas de soja de Rondônia, não será com os produtos floresteiros mencionados pelo Dr. Molion que se fará um Acre economicamente forte e desenvolvido. 


Sobra a hipótese de que a ONU, o IPCC e a adolescente sueca Greta Thundberg com sua turma reunida hoje em Madrid resolva pagar muito caro, em euros, pelo carbono que “sequestramos” ou deixamos de liberar do lado de cá. Só depois disso, talvez, nos contentemos em reproduzir tucanos, cobras e papagaios bilíngues para os enviarmos em Zepelins até a Place de La Concorde, em Paris.




 


 


Valterlucio Bessa Campelo escreve às sextas-feiras no ac24horas.