Foto: Felício Muniz
A empresária Janaína Verbena Gonçalves Terças, 43 anos, representa a terceira geração do ramo de cerâmica em Cruzeiro do Sul. O avô, o português Manoel Terças, começou o negócio na década de 30 do século passado. O pai, Joaquim, montou a própria olaria em 1985, empreendimento que foi assumido, reformulado, ampliado e modernizado por Janaína, que em 2013, inaugurou uma nova empresa, em outro local, com produção automatizada.
Edificações relevantes para Cruzeiro do Sul, como a Catedral Nossa Senhora da Glória, o 61° Batalhão de Infantaria e Selva, Maternidades, Hospitais do Juruá e de Campanha, Aeroporto e Quartel da Polícia Militar, têm a marca das três gerações de produtos da família Terças.
No Centro, a olaria já estava rodeada de casas e não tinha espaço para expansão, produzia muita fumaça e o barro do local não era adequado para a fabricação de tijolos. Ela e os pais, que, são separados, mas trabalharam juntos, seguiram para o novo endereço na Estrada da Boca da Alemanha em uma área de 32 hectares. No centro só ficou um escritório de vendas.
Ela cita que a decisão de ficar à frente da gestão da empresa foi tomada em conjunto com os pais e irmãos e que segue combinando tudo com o pai, que é um profundo conhecedor do setor cerâmico. Os funcionários também a apoiam na gestão, sendo que 70 por cento dos 30 funcionários estão com a família desde o início da cerâmica na década de 80.
A fabricação arcaica e manual de tijolos foi substituída por uma nova forma, com o uso da tecnologia. O salto qualitativo fez toda a diferença para a empresa, que se mantém entre as três grandes indústrias do ramo na região.
Janaína e os irmãos trabalham com o pai desde a adolescência e a experiência adquirida, além da criação liberal, que sempre teve, foram fundamentais para que ela liderasse o negócio com sucesso. Ela é a rainha do tijolo do Vale do Juruá.
“CRESCI NO BARRO COM MUITO ORGULHO”
O fato do pai, Joaquim Terças, tê-la levado desde pequena para o barreiro da olaria, ter ensinado sobre a liga do barro, dirigir máquinas pesadas e dizer que ela pode fazer qualquer coisa, fez toda a diferença na vida da empresária que agora comanda os negócios da família. Ela conhece cada etapa da confecção dos tijolos da Cerâmica Terças, em Cruzeiro do Sul. Conhece o produto que vende quando ainda é só barro no chão, a passagem pelo forno, a queima, até virar paredes de casas, prédios e ruas da cidade e nas outras 4 cidades do Vale do Juruá.
“Eu cresci no barro, gosto do barro, da cor do barro, da forma como ele se transforma. Não me imagino em outro negócio. Esse é meu ramo. O suor de todos da Cerâmica Terças, há 3 gerações está em muitas casas, ruas e muitos prédios públicos de Cruzeiro do Sul”, afirma a empresária, que deixou de lado o modo arcaico de fazer tijolos, modernizou todo o processo de confecção que era lento, pesado, com muito custo e automatizou a indústria. Com o uso da tecnologia, impulsionou os negócios e o que produzia de tijolos em um mês agora consegue em uma semana.
A dedicação aos negócios é total. Janaína, o pai e a mãe, Dona Graça, passam o dia na olaria. Chegam ao local às 7 horas da manhã, almoçam e só saem às 17 horas. Ela tem um quarto no local, onde descansa com a mãe cerca de uma hora depois do almoço. Só depois que o neto Joaquim nasceu, parou de trabalhar aos sábados para ficar com o bebê, que mora na casa dela.
“Sou a terceira geração da empresa, então tinha que melhorar tudo. Meu avô assumiu a olaria do tio Manoel Pedreira no começo do século passado. Em 1985, meu pai abriu a própria olaria. Em 2010 voltei para o Acre e vi que a empresa estava atrasada, estava instalada no lugar errado e então resolvemos mudar de local, onde o solo é adequado. Saímos do centro de Cruzeiro do Sul para a estrada da Boca da Alemanha, em uma área de 32 hectares. Como eu e meu irmão tinha viajado e conhecido outras empresas, resolvemos modernizar tudo. Nosso processo era arcaico. Era a maromba funcionando, os trabalhadores pegando com a mão e correndo com carrinho de mão, subindo e descendo pequenas vielas feitas de tábua e arrumando os tijolos nas prateleiras. A produção era pequena com custo elevado. De 2010 a 2013, trabalhamos o projeto dessa nova cerâmica, os licenciamentos, maquinários novos. Hoje nosso processo é todo automatizado, a máquina faz tudo: produz os tijolos, coloca nas vagonetas seguindo pra a secagem e, em seguida, os tijolos são cozidos. A tecnologia diminuiu a mão de obra e aumentou a produção e o que a gente produzia em um mês, agora produzo em uma semana”, relata.
Uma das grandes preocupações de Verbena é a manutenção do padrão de qualidade do produto fornecido pela família há 3 gerações. Cumpre rigorosamente a legislação vigente e atende às exigências das esferas municipal, estadual e federal. “A legislação é pesada e demanda tempo, dinheiro e mão de obra especializada. Temos que ter engenheiro de minas, ambiental e geólogo. Tentamos trabalhar de acordo com a legislação vigente”.
FAMÍLIA TERÇAS FAZ PARTE DA HISTÓRIA DE CRUZEIRO DO SUL
A história da família Terças se mistura com a de Cruzeiro do Sul e demais municípios do Vale do Juruá. São mais de sete décadas, produzindo os tijolos que construíram as casas, os prédios públicos antigos e os modernos, além das ruas do município.
Na década de 30, o português Manoel Terças, comprou do tio, Manoel Pedreira, a primeira olaria da região e deu continuidade ao negócio, que Joaquim Terças fez crescer e Janaína automatizou.
O desenvolvimento da empresa acompanhou o crescimento da região e as telhas, tijolos e outros itens da família Terças estão presentes nos primeiros prédios de alvenaria de cruzeiro do Sul, como o antigo fórum, a associação comercial e a edificação símbolo do município, que é a catedral Nossa Senhora da Glória, a padroeira da cidade, que começou a ser feita em 1957, pelos padres alemães e foi inaugurada em 1965. A primeira catedral foi construída em madeira, porém, por não oferecer segurança aos fiéis acabou em desuso.
Além da catedral, Manoel Terças forneceu itens de material de construção também para outros prédios da cidade como a associação comercial, fórum, correios, mercado central (atual Mercado Joãozinho Melo), 7° BEC (atual 61 BIS).
Edificações mais recentes, mas não menos importantes, também levam a marca Terças, já na gestão do pai Joaquim e de Janaína, como o antigo e o novo aeroporto de Cruzeiro do Sul, o antigo Hospital Geral, onde funciona agora a maternidade e Hospital da Criança, Hospital do Juruá, Hospital de Campanha, Abrigo do Menor, Quartel da Polícia Militar, antigo quartel da Polícia Militar, onde funciona atualmente o Hemonúcleo.
“Dá orgulho ver os tijolos feitos pelo meu avô, meu pai e, agora, por mim. Tenho um enorme prazer em ver o início de uma obra e depois passar e ver pronto um lugar que vai abrigar uma família ou um local público. Nossa marca está em muitos locais daqui”.
Ela gosta do tradicional. Mora na casa feita pelo avó Manoel Terças na década de 40, com os tijolos produzidos por ele e, onde o pai Joaquim nasceu. Vive desde os 6 anos de idade no mesmo local. As paredes originais têm quase meio metro de espessura. “Meu filho e meu neto também moram aqui e espero que outras gerações da família Terças ocupem essa residência tão cheia de histórias”.
O avô de Janaina, o português Manoel Terças, chegou ao Brasil de navio no início do século passado, aportando em Manaus, no Amazonas. Em seguida chegou à Cruzeiro do Sul onde se dedicou a outros ramos de negócios, como a comercialização do látex e de alimentos. Mas, logo descobriu a cerâmica e passou a fazer telhas e tijolos, sendo o pioneiro do setor cerâmico na região. O filho Joaquim Terças, nasceu em Cruzeiro do Sul e ainda jovem seguiu para São Luís do Maranhão, onde casou e Janaína nasceu.
Quando os negócios cresceram, o português Manoel mandou buscar Joaquim e a família no Nordeste. Janaína chegou ao Acre aos 6 anos e o senhor Joaquim Terças fundou a própria olaria e ampliou os itens ofertados. Ele levava os filhos Janaina e Júnior para a olaria e lá mostrava o barro adequado para os tijolos e demais etapas da feitura do produto além de ensiná-los a dirigir máquinas e tratores.
O avô fazia telha de barro, tijolo e telhas. O pai fazia telha de barro, tijolos, lajotas e cobogós. Ela optou em focar apenas nos tijolos de 6 e 8 furos, por serem os produtos com maior demanda do mercado local. Atualmente a Cerâmica Terças tem lista de espera para entregar tijolos, tamanha é a procura pelo produto. A espera que já chegou a 2 meses agora é de, no máximo, 2 semanas. “Meu objetivo é dobrar a produção e não ter mais lista de espera por tijolos”.
A AVÓ QUE GOSTA DE ATIRAR
Verbena é exuberante e vaidosa, mas não se importa com o salto do sapato sujo do barro da olaria. A empresária é assistente social, formada pela UNOPAR, e cursa Direito na Universidade Federal do Acre. “Quero entender sobre as leis para usar esse conhecimento para várias áreas da minha vida, como nos negócios. Meu setor de negócios tem fiscalização do Inmetro e de órgãos municipais, estaduais, federais e conhecimento é poder”, diz.
Ela tem dois filhos (Yuri e Elisa), é casada com advogado Frederico Filipe e agora também é avó. O neto Joaquim Terças (nome em homenagem ao pai), de 9 meses, que mora com ela é o grande xodó da família. Por causa dele não trabalha mais aos sábados. “Ser avó é a maior experiência da vida. É como filho sem as obrigações (risos), sem ter que amamentar. Nem trabalho mais aos sábados para poder me dedicar a ele e são horas preciosas”.
E a mulher corajosa para os negócios e na vida pessoal, tem como passatempos, o tiro esportivo. Para desestressar, nas horas de folga, prática tiro e é filiada ao Clube Estadual de Tiro e à Federação Nacional de Tiro. Com mira perfeita, acerta uma laranja com uma arma calibre 12 de uma distância de 25 metros. Diz que cresceu em uma casa com armas, já que antes não havia proibição neste sentido. “Eu fui criada em casa com armas e nunca houve problema com isso. Eu gosto de atirar porque tira meu estresse. Além disso, apuro minha mira não só na hora do tiro, mas também em vários aspectos da minha vida e, principalmente, nos negócios. Recomendo para todos e, principalmente, para as mulheres”.
CRESCIMENTO
Janaina quer dobrar a quantidade de tijolos produzidos pela Cerâmica Terças. Não esquece a crise econômica de 2014, quando o setor se retraiu e, para dar o salto qualitativo na indústria da família, com o uso da tecnologia, tiveram que vender imóveis.
Agora está animada porque nos últimos 2 anos, o ramo da olaria tem se mantido em crescimento das obras públicas e particulares, aumentando assim a demanda. Ressalta que essa alta alavanca os negócios nas madeireiras, lojas de material de construção e amplia as vagas de emprego na área da construção civil.
Cita a venda de tijolo como resultado do aquecimento da construção como reflexo do crescimento da economia do Brasil. “A economia está com crescimento de 3 a 5 por cento ao ano e, otimista, acredito nesse crescimento. Estamos aguardando com cautela a continuidade desse ritmo para investir, crescer e expandir. Nos próximos 10 anos quero dobrar minha produção e acredito que todos do setor cerâmico vamos crescer. Não creio no surgimento de novas cerâmicas, mas acredito que as que já existem vão se expandir”.
O filho mais velho da industriaria, Iury estuda medicina, mas desde que ele era pequeno também o levava para a cerâmica e pretende fazer o mesmo com o neto Joaquim. Quer que o negócio que está na família há 3 gerações, tenha continuidade. “Do jeito que meu avô ensinou pro meu pai, ele ensinou para mim, já dei dicas pro meu filho, minha filha Elisa e meu neto Joaquim vão conhecer o barro da olaria”.
FIEAC
Desde maio de 2019, a convite do presidente José Adriano, Janaína Terças é a representante na Federação das Indústrias do Acre — FIEAC, no Vale do Juruá, função que lhe oportunizou a busca pelo desenvolvimento do setor industrial como um todo. Empenha-se na busca de qualificação para os industriais e industriários, mediação e interlocução do setor com o poder público. Ressalta como avanço, a recente legalização ambiental e documental de mais de 40 empreendimentos do Polo Moveleiro de Cruzeiro do Sul.
Conta orgulhosa sobre a organização, representatividade das indústrias, como malharia, areal, moveleiro, madeireiro, e mediação juntos aos órgãos públicos para as soluções de demandas. Destaca que o projeto da FIEAC, em parceria com o governo, de pequenas obras para os municípios resulta no aquecimento da economia. “O grande objetivo é a manutenção de empregos e a geração de renda. Essa terra ter marcas do meu avô e do meu pai. Meu pai, filho e meu neto nasceram aqui e quero que essa região cresça e siga em desenvolvimento. Espero ter contribuído com o desenvolvimento da cidade. Neste momento se faz necessário deixar de lado minhas necessidades pessoais, em prol do coletivo, para assim dar a minha contribuição na melhoria da realidade econômica da minha terra”, conclui Janaína Verbena.