Nos últimos anos, o debate público sobre a participação das mulheres na vida política do país tem ganhado cada vez mais espaço no cenário brasileiro, apesar de que, na prática, as ações implementadas para que ocorra uma transformação da atual realidade, que evidencia a sub-representatividade do gênero feminino nos ambientes de poder, ainda não tenham surtido os efeitos desejados.
Historicamente mantidas à distância do panorama político, as mulheres conquistaram tardiamente o direito de votar e ser votadas e a sua efetiva representação nos palcos de tomadas de decisões atinentes à vida nacional em todas as esferas ainda permanece significativamente baixa com relação à sua presença majoritária na população brasileira, segundo apontam dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
A baixa representatividade das mulheres acreanas nas casas parlamentares se manifestam nas duas maiores cidades do estado, Rio Branco e Cruzeiro do Sul, assim como na maioria das demais, com ressalvas para os municípios de Assis Brasil e Senador Guiomard, que nas últimas eleições municipais, em 2016, elegeram cada um 4 mulheres entre os 9 vereadores que compõem as respectivas câmaras, o que representa mais de 40% do total.
A capital do Acre tem, na atualidade, apenas 3 vereadoras de um total de 21 cadeiras, e a capital do Juruá somente 1 mulher entre os 14 representantes na câmara municipal, depois que a vereadora Lucila Bruneta teve o seu mandato cassado em 2019. Na Assembleia Legislativa do Acre outra discrepância, apenas 4 deputadas entre os 24 parlamentares estaduais eleitos em 2018. Nos 22 municípios acreanos, apenas três mulheres se sentam nas cadeiras de prefeito, em Rio Branco, Tarauacá e Brasiléia.
Há que se considerar, no entanto, o ponto positivo que é o equilíbrio que o Acre tem na atualidade com relação à bancada federal, com a presença de 5 mulheres entre os 11 parlamentares do estado. No geral, essa quase igualdade não existe. O Senado Federal tem hoje 11 senadoras e 70 senadores e a Câmara Federal tem 80 deputadas (4 estão afastadas) e 437 deputados.
Dos 353 candidatos ao Senado nas eleições de 2018, 62 eram mulheres e, dessas, sete se elegeram. Em 20 estados, nenhuma mulher foi eleita e em três deles nem houve candidatas. O Distrito Federal e a Paraíba elegeram naquela oportunidade a primeira senadora da história dessas unidades da Federação.
Naquela ocasião, a senadora eleita Soraya Thronicke, do PSL do Mato Grosso do Sul, único estado a contar com duas senadoras, lamentou em entrevista à Agência Senado o fato de mais da metade da população brasileira ser feminina e essa parcela não estar representada no Parlamento.
“Eu vejo isso com muito pesar. A questão é muito mais profunda do que trazer direitos para as mulheres na legislação eleitoral. Isso é mais profundo. É uma questão cultural. Eu sempre defendi que, antes de tudo, antes de votar em uma pessoa por conta do gênero, a gente tem que votar em quem a gente acredita, né? Mas o que eu percebi é que as mulheres não votaram em mulheres”, afirmou.
A ativista acreana Gracinha Manchineri, coordenadora do Comitê 8 de Março e do projeto Elas por Elas, iniciativa desenvolvida pela Secretaria Nacional de Mulheres do PT com o intuito de impulsionar a participação de mulheres na política, diz que as desigualdades que determinam a baixa representatividade feminina nesse campo são históricas na sociedade e que têm a sua razão de ser no capitalismo, no patriarcado e no colonialismo.
A militante afirma também que o Fundo de Financiamento de Campanha que garante 30% dos recursos financeiros para as candidaturas femininas é uma conquista fundamental para as mulheres, mas teme que as desigualdades sociais e regionais ampliadas pela pandemia do novo coronavírus possam contribuir para acentuar ainda mais as dificuldades enfrentadas por elas.
“O projeto Elas por Elas, como uma concepção pioneira e desafiadora que atende a duas necessidades urgentes das mulheres, que é inseri-las em espaços de poder e lutar por igualdade, se organizou para contribuir com formação, assessoria contábil, jurídica e de comunicação, mas também para trazer para a sociedade esse debate sobre a importância da participação das mulheres na política”, ressalta.
Há quase 10 anos Xapuri não tem uma vereadora
Já faz quase uma década que uma mulher não é eleita para o cargo de vereadora em Xapuri. Apesar de haver uma pré-candidatura feminina anunciada à prefeitura neste ano, no campo proporcional o indicativo de mulheres que pretendem efetivamente disputar uma vaga na câmara no município é mínimo.
Mesmo que cada partido que lançar chapa proporcional tenha que respeitar a cota de 30% das vagas para mulheres, a tendência é de que serão poucas as que de fato disputarão o pleito. Caberá às agremiações políticas locais que disputarão cadeiras na câmara em 2020 – até o momento apenas PT, PSB, DEM e MDB se manifestaram positivamente a esse respeito – fazer valer a legislação e prover efetivas candidaturas femininas nesta eleição.
As alterações mais recentes ocorridas na legislação que trata do tema dizem respeito à garantia de candidaturas femininas concretas e buscam coibir os arranjos partidários costumeiramente usados para se cumprir com a obrigatoriedade da cota. O desafio imposto aos partidos passará também pela correta destinação dos recursos financeiros do Fundo Partidário para que elas possam investir em suas campanhas e ter chances reais de serem eleitas.
Em toda a sua história, o município de Xapuri teve apenas quatro mulheres exercendo mandatos na câmara de vereadores. Entretanto, já se passaram exatos oito anos sem que uma representante do sexo feminino seja eleita no município para uma das cadeiras no parlamento mirim. O último mandato feminino na Princesa do Acre foi entre os anos de 2009 e 2012, com a eleição da vereadora Maria Luceni da Silva.
De acordo com os registros da Câmara Municipal de Xapuri, as mulheres que foram vereadoras no município são: Francisca Américo de Souza (1989-1992), Fátima Santana de Almeida (1993-1996), Elisabeth Farias da Silva (1993-2000), que também foi vice-prefeita (2001-2004), e Maria Luceni da Silva (2009-2012). Desde então, apenas homens têm sido eleitos para o cargo de representante do Poder Legislativo Municipal.
No Poder Executivo, Xapuri teve três mulheres ocupando o cargo de vice-prefeita, sendo uma delas a atual, Maria Auxiliadora Silva de Sales, que é esposa do deputado estadual Manoel Moraes. As outras duas foram a ex-vereadora Elisabeth Farias, entre os anos de 2001 e 2004, no segundo mandato do ex-prefeito Júlio Barbosa de Aquino, e Eliana Pereira, no período de 1989 a 1992, no mandato do ex-prefeito Juarez Ribeiro Maciel Filho.
Alarice Botelho Nunes, de 31 anos de idade, que atua desde muito jovem na área de cultura, é uma das anunciadas pré-candidatas à Câmara de Xapuri para as eleições deste ano. Ela diz que colocou seu nome na disputa porque acredita que as mulheres devam ocupar de fato e de direito o seu merecido espaço na política do município e que esse debate precisa ser pautado também pela igualdade de gênero, garantindo a representatividade feminina na câmara de vereadores.
“Minha expectativa é de que nós, mulheres, possamos nos unir em busca da transformação dessa realidade. É o momento de termos voz ativa, representativa e participativa nas tomadas de decisões que envolvem o bem comum da nossa querida Xapuri. Precisamos de oportunidades, ideias e projetos que venham, por meio de homens e mulheres, de maneira igualitária, garantir dias melhores em nossa cidade”, assegura.
A ex-vereadora Maria Luceni, que foi eleita pelo Partido Verde no ano de 2008, pensa em voltar a se candidatar neste ano, pelo PSD, mas ainda não se decidiu como pré-candidata. Sobre a sua experiência como uma das poucas mulheres a cumprir mandato em Xapuri, ela afirma que a oportunidade foi engrandecedora do ponto de vista pessoal, mas diz que o segmento feminino ainda não acordou para a importância do seu protagonismo na vida política.
“Adquiri muitos conhecimentos nos quatro anos em que estive na câmara municipal e isso me fez ver que por meio da política podemos fazer muito mais por nós mesmas e pelo todo. Então, tenho a convicção de que as mulheres precisam se conscientizar da importância dessa participação e mostrar que o gênero feminino possui força suficiente para ocupar o seu espaço em condições de igualdade com os homens”, afirma a ex-vereadora.
Sub-representatividade feminina no Brasil e no mundo
Segundo o Inter-Parliamentary Union, organização global dos parlamentos nacionais, o Brasil é um dos piores países do mundo em termos de representatividade política feminina, ocupando o terceiro lugar na América Latina em menor representação parlamentar de mulheres.
No ranking da entidade, a taxa do Brasil é de aproximadamente 10 pontos percentuais a menos que a média global e está praticamente estabilizada desde a década de 1940. Isso indica que além de estar atrás de muitos países em relação à representatividade feminina, o país tem apresentado poucos avanços nas últimas décadas.
Os parlamentos do mundo não são exceção quando se trata da questão. Com uma média global de 25% de mulheres, a maioria deles permanece dominada por homens, e as mulheres parlamentares geralmente estão sub-representadas nos órgãos de tomada de decisão.
Ações
A adoção, desde os anos de 1990, de uma série de regras eleitorais para aumentar a quantidade de mulheres candidatas e eleitas em eleições proporcionais, ou seja, para as câmaras municipais, assembleias legislativas e Congresso Nacional, jamais atingiu resultados satisfatórios.
Medidas mais recentes, como o fim das coligações nas eleições proporcionais, podem vir a ser um novo alento para a maior presença de mulheres em cargos eletivos. Nas eleições deste ano, a indicação de mulheres deverá ser feita por cada partido (cota de 30% com aporte proporcional dos recursos do Fundo Partidário), o que se espera que fomente as candidaturas femininas, com o lançamento de um maior número de candidatas.
Os resultados desse mais novo incremento à participação feminina na política poderão ser conferidos ainda em 2020, nas eleições para as câmaras municipais em todo o país.