O Governo do Acre resolveu intervir no mercado do café regional. E usou a legislação como ferramenta. A Lei 4.518, de autoria do Executivo, reduz a base de cálculo do ICMS na saída do café conilon cru, em coco ou em grão. A decisão amplia a oferta de comercialização ao produtor. Até o dia 31 de outubro de 2025, o produtor de café do Acre vai poder comercializar para fora do Estado pagando carga tributária efetiva de 7%.
Houve uma manobra do Governo do Acre na elaboração da lei. Operações para estados das regiões Sul, Sudeste e Mato Grosso estão excluídas do benefício. É uma clara medida para restringir essa comercialização do café acreano às indústrias rondonienses. Para o produtor, esse direcionamento para Rondônia pouco importa. O que o agricultor quer é oferecer o café a quem paga pela cotação do dia. Não importa onde seja.
E a “cotação do dia” tem estado boa como nunca. Na sexta-feira (10), a saca do conilon estava sendo vendida a R$ 1.886,80. E a do arábica a R$ 1.937,47. São números que deixam empolgado quem produz. Só não se sabe exatamente por quanto tempo esse cenário irá durar. E estados como o Acre estão sendo positivamente impactados por esse cenário em função dos eventos climáticos extremos.
Em 2024, o Vietnã, maior produtor mundial da espécie canéfora (robusta), perdeu muitas lavouras com as inundações. No Brasil, as regiões Sudeste e Centro-Oeste sofreram com a seca, com destaque para Espírito Santo e Minas Gerais, os maiores produtores do país. O Acre também sofreu com eventos extremos, mas não nas 452 propriedades que cultivam café por aqui, segundo o Censo Agropecuário (e aproximadamente 600 propriedades, segundo a Secretaria de Estado de Agricultura). De acordo com a Seagri, 20 dos 22 municípios estão produzindo café no Acre.
“Embora o Brasil tenha batido recorde de produção de café, os estoques permanecem baixos”, afirma a coordenadora do Núcleo da Cafeicultura do Acre, Michelma Lima. O núcleo é vinculado à Secretaria de Estado de Agricultura, liderada por Luis Tchê, e tem feito um trabalho que aumentou tanto a produtividade quanto a qualidade do café acreano.
Baseado em estudos da Embrapa, o Governo do Acre tem distribuído mudas da variedade robusta. Atualmente, o Acre é o segundo maior produtor do Norte no uso dessa variedade. Só perde para Rondônia. “A variedade robusta é amplamente cultivada no Estado devido à sua adaptação ao clima e ao solo da região, além da resistência às pragas e às doenças, o que garante alta produtividade”, explica Lima.
Na semana que passou, a Federação do Comércio do Acre divulgou uma pesquisa sobre o preço da cesta básica na Capital. Há erro metodológico na pesquisa. É preciso informar isso ao leitor. A sondagem da federação é feita em apenas três supermercados da Capital. Portanto, dificilmente oferecerá nível de confiabilidade adequado. No entanto, é importante observar o comportamento do preço do café. Aliás, café e carne foram os ítens mais caros da cesta na pesquisa da Fecomercio. Tiveram alta de 41,35% e 42,95%, respectivamente.
Em outra pesquisa, feita pela Secretaria de Estado de Planejamento, com amostragem mais ampla, alcançando mais de 50 estabelecimentos comerciais da Capital, a cesta básica ultrapassou R$ 500 e o café também foi um dos ítens mais caros. Alta de 16,8%.
Se a tendência de estoques baixos em escala nacional e internacional e se as demandas de Índia e China continuarem aquecidas, o consumidor acreano deve sentir no café o mesmo efeito que ocorre com o mercado da carne: a produção regional não se traduz, obrigatoriamente, em baixo preço nas gôndolas dos supermercados.
“Faltou café. Diminuiu a oferta global de café e vieram buscar café no Brasil, que teve um aumento nas exportações. Então, ficou menos café para ser negociado dentro do Brasil. A alta do dólar também contribuiu para que ficasse um mercado mais favorável às exportações. Isso contribuiu para que o preço do café ficasse nesse patamar”, afirmou Luciana Mendonça, diretora do Café Contri, em recente declaração à Rede Amazônica de Televisão.
O ano de 2004 foi o que registrou maior área plantada de café no Acre: 4.598 hectares. A produtividade alcançada há 20 anos foi de 688 quilos por hectare. Isso é algo em torno de 11,4 sacas por hectare.
Em 2023, a área plantada de café encolheu para 993 hectares. Mas a produtividade saltou para 2.878 quilos por hectare. São quase 48 sacas por hectare.
“Esse avanço demonstra como a adoção de tecnologias e boas práticas na cafeicultura podem trazer alta produtividade, tornando o café uma excelente opção para os pequenos produtores”, analisa a coordenadora do Núcleo da Cafeicultura do Acre, Michelma Lima. “Em 2013, teve início o processo de transição de lavouras seminais, que eram menos produtivas e utilizavam espaçamentos maiores, para as lavouras clonais, caracterizadas por maior eficiência, produtividade e melhor aproveitamento do espaço”.
“O café é referência na agricultura familiar em todo Brasil”, diz o produtor Jonas Lima. Ele decidiu deixar de lado os embates da vida política na Assembléia Legislativa do Acre para se dedicar à cafeicultura. “Eu sou um militante do café acreano”, orgulha-se Lima.
Entre os amigos, é comum a brincadeira de que alguém pode ser tão empolgado com a cafeicultura quanto Jonas Lima. No entanto, não mais do que ele. O contexto explica. Jonas Lima é um dos três donos da Fazenda Monte Sinai. Dividida em três áreas, tem 96 hectares dedicados ao café. São 320 mil pés de café. “Queremos chegar em um milhão nos próximos cinco anos”, contabiliza.
Em 2020, o entusiasmo de expandir, somado ao cenário internacional, gerou ambiente favorável à criação da Coopercafé, hoje com 128 cooperados. Em 2025, os cooperados querem aumentar a área plantada no Vale do Juruá em 450 hectares.
O movimento chamou atenção do Governo Federal por meio da articulação de uma das diretoras da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), Perpétua Almeida. Está em fase de conclusão, o Complexo Industrial do Café do Acre, instalado em Cruzeiro do Sul. Orçada em mais de R$ 8 milhões, a obra era para ter sido entregue em dezembro. A expectativa é que seja inaugurada ainda no primeiro semestre desse ano. De acordo com a Coopercafé, a contrapartida dos produtores será de R$ 3 milhões.
O projeto Café Amazônia Sustentável, da ABDI, também pretende ser expandido para a Capital. Mas ainda não há definições.
Longe do Juruá, a agricultora Antônia Lima Kurzvski dos Santos, de apenas 28 anos, e o marido pelejam junto com outras duas famílias no “Ramal do 59” no município de Brasiléia.
Apenas 10 dos 120 hectares do Sítio Paraná estão dedicados ao café. Orientado pelo Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural) e pelo Sebrae, o casal foi longe.
Em novembro de 2024, Antônia Lima Kurzvski dos Santos foi a campeã regional da 3ª edição do Concurso Florada Premiada, promovido em Minas Gerais pelo Grupo 3 Corações.
“A gente descobriu que há mercado para o pequeno produtor, para o produtor familiar”, entusiasmou-se a jovem agricultora que só pôde falar com a reportagem depois de colocar a filha caçula para dormir. “O prêmio foi uma motivação”.
A Agência Brasileira de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) anunciou comércio com a China. As 120 mil toneladas do café especial brasileiro devem gerar algo em torno de U$ 500 milhões nos próximos anos. O acordo foi anunciado em um encontro para promoção do café brasileiro, organizado pela Apex, na maior rede de cafeterias da China, a Luckin Coffee. O vice-presidente Geraldo Alckmin estava no evento.
Além da China, o trabalho que a ApexBrasil tem feito com a Associação Brasileira de Cafés Especiais estreitou relações com a Alemanha, Chile e Polônia.