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O “Cavalo de Troia” nunca morre

A metáfora do “cavalo de Troia”, uma referência à astúcia e ao engano, é utilizada na política moderna de várias maneiras. Uma das mais intrigantes e potencialmente devastadoras é a infiltração de um líder em um partido político. Um líder infiltrado, semelhante ao cavalo de Troia clássico, entra no partido com uma agenda oculta, pretendendo subverter a organização por dentro. Tentemos explorar um pouco as táticas, as motivações e as consequências dessa prática na política contemporânea.


Para que seja operada, a infiltração de um líder em um partido político exige um processo meticuloso e bem planejado, às vezes, de longo prazo. O primeiro passo, é o líder se afastar de suas origens, percorrendo um caminho de neutralidade para não assustar seus possíveis novos companheiros. Como se trata de movimento consentido ou mesmo articulado por líder superior, os antigos partidários sequer denotam algum dissabor.


O segundo passo é o infiltrado se apresentar como um admirador genuíno do novo partido, alinhando-se publicamente com a ideologia e os objetivos da organização. Seu comportamento fraterno garante a confiança dos novos companheiros de modo que ele possa acessar informações, influenciar decisões internas e construir com os aliados que carrega, uma rede de apoiadores dentro do partido.


Somente depois de consolidado e em posição de mando e representação, é que o líder infiltrado inicia a terceira fase de sua estratégia – a subversão, ou seja, a promoção de políticas que, superficialmente, parecem beneficiar o partido, mas que gradualmente minam sua base, substitui velhas lideranças e desviam o partido de seus objetivos fundamentais. Se, paralelamente, ele consegue fomentar divisões internas, incentivando conflitos entre membros do partido, na base do dividir para governar, o partido fica ainda mais vulnerável e praticamente implora por sua arbitragem.


Entre as razões da infiltração, além da ambição pelo poder, está a necessidade de recuperação da credibilidade de líderes e pautas caídas em desgraça. Imagine um partido que por desgraça revelada em escândalos de corrupção, desvio, enriquecimento ilícito etc., veja sua pauta revolucionária ir para o brejo. Talvez seja mais fácil para sua volta ao cenário de modo aceitável, ao invés de purgar sua pena política e passar por longo ostracismo, infiltrar-se em uma nova sigla e dominá-la por dentro, transformando sua essência, solapando suas virtudes, alterando sua natureza. 


Outra espécie de “cavalo de Troia” é a infiltração ideológica. Imagine uma liderança ou um grupo que, publicamente emblematizado de modo nocivo ou contrário à maioria, resolva insidiosamente ser protagonista na vida política. Seu líder não precisa, como anteriormente, ser ele mesmo alçado à proeminência e à representação política, basta que o novo partido assuma, ainda que aos poucos, sua agenda sociopolítica. É uma espécie de militância consentida, já que aparentemente o poder não está sob ameaça. A convivência com os contrários, muitas vezes, enganosamente comunicada como democrática, na verdade é fraqueza de princípios e abandono ideológico. A surpresa virá quando os líderes forem traídos de baixo para cima num levante que eles próprios ajudaram a construir com seu descaso.


Modernamente, essa estratégia é muitas vezes revestida de caráter “técnico”. Sob a capa de solução técnica, científica, escondem-se militantes ferrenhos da agenda corrosiva, que trabalham diuturnamente de modo político bem nas fuças do governante que, cego pelo discurso “neutro”, dá asas à cobra, diriam os antigos.


Quem assistiu a série “House of Cards” sabe do que estou falando. A personagem, Frank Underwood, é um exemplo ficcional de um político que usa estratégias de manipulação, traição e subterfúgio para ascender ao poder. Sua trajetória oferece uma visão clara de como a infiltração e a subversão podem ser utilizadas para atingir objetivos políticos. Alguns movimentos, como a manipulação de informações, a traição calculada, a construção de alianças, a manipulação da opinião pública pelo domínio da comunicação e a permanente presença positiva no noticiário através de agentes pagos, são evidencias da estratégia de infiltração mansa, porém extremamente danosa.


Nas convenções partidárias dos próximos dias, assistiremos em vários lugares no Brasil inteiro, “cavalos de Troia” serem docemente aceitos em castelos antes inexpugnáveis prestes a serem tomados sob o olhar distante, mas atento de um Ulisses (ou seria Maquiavel?) nessa Odisseia moderna.