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“Melhor em Casa”

O Serviço de Atenção Domiciliar cura cinco pacientes de média e alta complexidade por mês com boa orientação aos familiares: oferta de saúde alimentada por quem peleja diariamente pela vida de um ente querido
por Itaan Arruda
Serviço de Atenção Domiciliar. Dito assim, de forma protocolar e genérica, a expressão não diz muito. Quando se soma a ela o complemento “Melhor em Casa”, o alívio de dores e tormentos começa a ter contornos mais concretos. O Serviço de Atenção Domiciliar Melhor em Casa é a presença do SUS, administrada pelos Estados e alguns Municípios, em situações muito especiais.
Isso é sentido, na prática, ao menos para os pacientes de média e alta complexidade que deixam leitos de hospitais e passam a ser atendidos com auxílio de familiares na própria residência. O processo de cura, mais do que em qualquer outro lugar, passa a ser uma construção coletiva.
A última contabilidade soma 57 pacientes, em Rio Branco, atendidos pelo Serviço de Atenção Domiciliar Melhor em Casa. Pacientes que estavam internados, ou passaram por Unidades de Terapia Intensiva no Hospital de Urgência e Emergência, Fundação Hospital do Acre, Hospital do Idoso são classificados em dois grupos: AD2 (Atendimento Domiciliar de Média Complexidade) e AD3 (Atendimento Domiciliar de Alta Complexidade).
Os traumas por acidentes e doenças são os mais diversos. Para receber o serviço “Melhor em Casa”, o paciente e a família são avaliados por uma equipe multidisciplinar composta, na modalidade mais ampliada, por médico, enfermeiro, técnico em enfermagem, fisioterapeuta, assistente social, fonoaudiólogo e nutricionista.
“Eles identificam os pontos a serem observados em um plano terapêutico e, a partir disto, é feito o planejamento do atendimento daquele paciente específico”, explica a gerente geral do programa “Melhor em Casa”, Maithê Blaya Leite. “E no planejamento também incluímos o treinamento dos familiares, dos cuidadores”.
Foto: Sérgio Vale
Maithê Blaya Leite é coordenadora do programa “Melhor em Casa” no Estado do Acre
Rio Branco concentra quase a totalidade dos atendimentos do programa no Acre. Cruzeiro do Sul também oferece o atendimento domiciliar. É a Secretaria de Estado de Saúde quem habilita e capacita as equipes dos municípios.
Formalmente, são apenas duas equipes que ajudam no manejo da vida dessas 57 pessoas na Capital. Uma equipe pertence ao Município de Rio Branco e a outra equipe pertence ao Governo do Estado do Acre. “Quando a gente tem outros profissionais, a gente pode também habilitar uma equipe de apoio. Nós temos os profissionais, mas ainda não habilitamos essa equipe. Estamos nesses trâmites”.
Uma portaria do Ministério da Saúde de janeiro do ano passado garantiu reajuste na manutenção das equipes do “Melhor em Casa”. Contando com acréscimo de 30% por estar em cidades da Amazônia, o repasse federal mensal saltou de R$ 50 mil para R$ 84,5 mil por equipe.
Os municípios menores, explica a coordenadora do programa, podem fazer consórcios intermunicipais para poder custear a estrutura exigida pelo “Melhor em Casa”. Para o Governo do Acre, a adesão dos municípios com mais de 20 mil habitantes pode significar economia de gasto público. Porque alguns desses pacientes que são atendidos em Rio Branco poderiam não estar aqui, se a cidade de onde eles vêm oferecesse o serviço. “Isso significa que uma família do interior atendida aqui gera custos com aluguel social e outras despesas que poderiam ser evitadas”.
Esse é outro detalhe: praticamente, tudo o que está nas residências é custeado pelo Governo Federal e pelo Governo do Estado. Fraldas, sondas, gases, luvas, álcool, dieta e suplementação alimentar dos pacientes. Tudo é mantido com recurso público, seja do Governo Federal (via SUS), seja do Governo do Acre. Sem contar, claro, com os equipamentos. Cada paciente, de acordo com o “plano terapêutico”, exige uma estrutura específica. Alguns aparelhos, precisam até ter uma espécie de “no-break” para que não comprometa o funcionamento do instrumento, caso haja algum problema no fornecimento de energia elétrica na comunidade onde o paciente mora.

Familiares são fundamentais no processo de alta

Pacientes de média e alta complexidade tratados em casa fazem parte quase de uma ousadia e exigem comprometimento dos servidores da Saúde. Mas, por mais compromissados que sejam, seria humanamente impossível dar conta da demanda apenas com servidores públicos.
São 57 pessoas com as mais diferentes idades e com os mais diversos “planos terapêuticos”. São equipamentos, medicamentos, horários, higiene, humores, histórias e cuidados distintos. O atendimento tem eficácia elevada, segundo os técnicos: são cinco altas mensais.
Essa taxa de êxito se deve a vários fatores que transitam da orientação que os familiares recebem dos servidores do Estado, passando pelos equipamentos oferecidos e mantidos pelo poder público mas, sobretudo, porque quem peleja na beira da cama quer o paciente vivo. Quem está ali precisando de apoio e cuidados é uma mãe, um filho, um pai, uma filha, um avô ou avó. Isso faz muita diferença.
É o caso da dona de casa Ângela Maria da Silva. “Mãe solo”, como ela mesma se auto denomina, é moradora da Rua Cedro, no bairro Calafate. Até que a via não é tão esburacada, comparada às outras da região. A casa modesta, mas acolhedora, é onde ela cuida dos dois filhos que exigem atenções especiais.
Pedro Henrique, de 11 anos, usa a peraltice de todo menino para fazer o que todos fazem: jogar bola, andar de bicicleta, brincar. Mas ele já teve os dias presos a uma cama por causa da artrogripose e da encefalopatia. “Doenças ‘de nascênça’ (sic), explica a mãe. O SUS, o Estado e o carinho da mãe lhe permitiram as danações de hoje.
O caso mais delicado na rotina de Ângela Maria da Silva é do pequeno José Guilherme, de apenas 4 anos. Ele também tem os mesmos problemas do irmão, Pedro Henrique, artrogripose e encefalopatia só que de forma mais grave.
Os cuidados que José Guilherme exige transitam da fisioterapia, enfermagem à fonoaudiologia.
O monitoramento acontece no pequeno quarto, enfeitado com abelhinhas estilizadas e um painel com o fenômeno do automobilismo dos desenhos animados da Disney/Pixar, Relâmpago Mcqueen, o carrinho cheio de aventuras velozes. Brincadeiras tão distantes da vagarosa rotina do pequeno José Guilherme. É um sonho, uma ideia de liberdade e de ação que está ali ao alcance dos olhos da criança, entre um mimo e outro da mãe ou da dedicada enfermeira Carolina Ferreira.
“Todos os dias da minha vida eu pelejo com meus dois filhos”, diz Ângela Maria, em tom altivo. “Tenho outra filha, mas ela vive a vida dela. Hoje mesmo foi um dia difícil. Tem noites, como hoje, foi difícil. Você acorda duas três vezes na noite com o Zé Guilherme sufocando. Eu só espero, meu Deus, que um dia eles valorizem essa luta e que não me culpem”.
O pai dos meninos (ex-marido de Ângela Maria) é primo de primeiro grau. A consanguinidade é um possível fator biológico que pode explicar as doenças congênitas de Pedro Henrique e José Guilherme. O que é uma possibilidade estatística no campo das ciências médicas, no aspecto moral, é uma certeza preservada por Ângela e revelada no tom com que falou “… Eu só espero, meu Deus, que um dia eles valorizem essa luta e que não me culpem”.
Foto: Sérgio Vale
José Guilherme tem artrogripose e encefalopatia. A mãe, Ângela Maria tem dedicação integral com cuidados e orientações de enfermeiros, fisioterapeutas e fonoaudiólogas
Jurandir Teles é residente de uma região mais central. É morador da Rua Isaura Parente, no bairro do Bosque. Exige todos os cuidados de um paciente que teve um acidente vascular cerebral. No dia que a equipe do “Melhor em Casa” chegou à residência do “Seu Jurandir”, ele estava meio impaciente com o calor.
O manejo com a higiene é relativamente simples. A dificuldade maior guarda relação com o tamanho do paciente.
Foto: Sérgio Vale
Jurandir Teles tem 72 anos e vive com as sequelas de um grave acidente vascular cerebral

“Em 2024 e 2025, teremos mais recursos investidos no programa”, garante secretário

O secretário de Estado de Saúde, Pedro Pascoal, garante que haverá ampliação do “Melhor em Casa” já a partir desse ano e também no ano que vem. “Em 2024 e 2025, teremos mais recursos investidos no programa, assegurou Pascoal.
O secretário lembrou que o Programa Nacional de Cuidados Paliativos (um programa que atende a pacientes com perfil diferente, comparado aos pacientes do “Melhor em Casa”). “Atualmente, essa rede de atendimento domiciliar faz parte, no organograma do Ministério da Saúde, da rede de Urgência e Emergência porque tenta dar vazão aos pacientes crônicos internados”, pontua o secretário.
Foto: Sérgio Vale
Secretário de Saúde do Acre, Pedro Pascoal
Pascoal lembrou da mudança implementada pelo Ministério da Saúde em janeiro do ano passado que já trouxe incremento para o programa.
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Itaan Arruda

Jornalista, apresentador do programa de rádio na web Jirau, do programa Gazeta em Manchete, na TV Gazeta, e redator do site ac24horas.


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