Na semana do meio ambiente, abro a coluna para uma valiosa reflexão de minha amiga e extraordinária figura humana, Dirlei Bersch, sobre a conexão entre natureza, práticas sustentáveis e felicidade humana. Vale a leitura.
Sustentabilidade e bem-estar
Como as nossas atitudes impactam no bem-estar humano e do ecossistema e como podem contribuir para a sustentabilidade, o bem-viver e a felicidade individual e coletiva?
A sustentabilidade costuma ser tratada como uma ação coletiva, um objetivo que possa garantir a continuidade das condições de vida na terra para a atual e futuras gerações, um conceito construído sob a ótica da promoção do desenvolvimento econômico, social e ambiental, das políticas públicas e das responsabilidades corporativas.
Em 2015 a Organização das Nações Unidas (ONU) lançou os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no documento Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Neste momento, discutir e entender o que é sustentabilidade é essencial para atingirmos esses 17 Objetivos, que incluem ações para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e prosperidade.
A agenda é composta de metas a serem cumpridas até o ano de 2030, sob pena de atingirmos um estágio de degradação ambiental de difícil reversão, o que poderia comprometer a nossa sobrevivência e das demais espécies em um futuro não muito distante.
Falar sobre sustentabilidade nos leva a pensar nos diversos caminhos viáveis para a humanidade e o planeta. Assim, a simples reflexão sobre o significado de sustentabilidade nos convida a repensar o nosso modo de viver, o verdadeiro sentido e impacto das nossas ações na nossa vida e na sociedade em que vivemos.
Etimologicamente, a palavra sustentável vem do latim sustentare, que significa sustentar, defender, favorecer, apoiar, conservar, cuidar. Sustentabilidade, segundo o dicionário Aurélio, é a qualidade ou propriedade do que é sustentável, do que é necessário à conservação da vida.
Nesta reflexão, cabe a cada um de nós humanos pensar em sustentabilidade como uma ação e responsabilidade individual; pensar em como nossas práticas e hábitos (o nosso modo de ser e de viver) impacta no meio e na sociedade à qual estamos inseridos. Esse pensar representa o nosso nível de consciência sobre a vida, sobre um modo de viver para garantir a continuidade da vida.
Desta reflexão, surge a consciência do SER (o indivíduo) – que “sustenta”, “conserva” e “cuida” da vida. E esse SER, em sua trajetória, busca o bem-viver, o bem-estar e a felicidade – busca a “sustentabilidade da vida”.
Como reconhecer sentido e significado à reflexão sobre sustentabilidade e felicidade nos tempos atuais? A ciência desenvolveu conceitos a partir de experiências de comunidades e de construtos que envolvem a filosofia, a psicologia positiva e a neurociência.
O “bem-viver” , segundo Mamani, 2010 – ideal proposto pelos povos originários andinos – visa uma ética da suficiência para toda a comunidade, e não apenas para o indivíduo. Pressupõe uma visão integradora entre o ser humano, o ar, a água, os solos, as montanhas, as árvores e os animais, o Sol, a Lua e as estrelas. É a busca do equilíbrio com as energias do Universo.
Assim como no ideal do “bem-viver” dos povos originários, o Butão, país budista, construiu um novo paradigma de desenvolvimento socioeconômico, englobando filosofia e modelo de gestão, criando o índice “Felicidade Interna Bruta – (FIB)”, o qual assume uma concepção de vida inspirada em conceitos muito próximos do “bem-viver”. Esse “modo de vida” se referencia em quatro dimensões distintas que vão da autossuficiência econômica, passando pela preservação do meio ambiente, promoção da cultura e boa governança. Em certo sentido, é a busca por uma gestão pública que não perca de vista o bem-estar dos cidadãos. É a mensuração do progresso considerando economia, meio ambiente e felicidade (Furtado, 2022).
Já para a filosofia, segundo Aristóteles, a felicidade se constitui em um modo de vida, onde o ser humano precisa exercitar constantemente o melhor que tem dentro de si e que a melhor forma de conseguir ser feliz é por meio das virtudes.
No campo da psicologia positiva, o estudo das emoções positivas, das virtudes e das forças humanas, com especial atenção na felicidade, as intervenções científicas visam ao incremento do bem-estar subjetivo. A felicidade pode ser definida como “uma experiência de contentamento e de bem-estar combinada à sensação de que a própria vida possui sentido e vale a pena” (Lyubomirsky; Sheldon; Schkade, 2005).
A neurociência, por sua vez, tem avançado na compreensão sobre a felicidade com evidências científicas sobre a biologia das emoções, neuroplasticidade e habilidades para a felicidade, além do desafiador viés negativo do cérebro, onde o estímulo negativo possui maior impacto sobre a percepção, o afeto, a fisiologia, a memória e a tomada de decisão do que um estímulo positivo.
Talvez o avanço de estudos científicos nas diversas áreas do conhecimento, e envolvendo diferentes abordagens dos aspectos de desenvolvimento humano e de sociedades, possa explicar a tendência autodestrutiva dos caminhos de desenvolvimento que estamos traçando e que comprometem, no longo prazo, a nossa sobrevivência como espécie.
A abordagem do tema sustentabilidade sob a ótica do indivíduo e sua busca pelo bem-viver, bem-estar e felicidade, visa promover uma reflexão sobre a forma como estamos conduzindo nossa vida neste planeta, e contribuir com o despertar de uma consciência individual e coletiva integrada com o meio, com a sociedade e com o Universo, chamando a atenção para a responsabilidade do ser humano se constituir como “ser sustentável”.
Sustentabilidade e bem-estar estão intrinsicamente relacionados. Para a conquista do nosso bem-viver e bem-estar é essencial que nossas atitudes sejam sustentáveis – e atitudes sustentáveis irão gerar bem-viver, bem-estar e felicidade, como um estímulo virtuoso que se retroalimenta.
Estudos e pesquisas científicas desenvolvidas nas diferentes áreas do conhecimento contemplando a filosofia, a psicologia positiva, a neurociência, a economia e a engenharia, abordam e consideram a complexidade destes dois assuntos, como sujeitos de uma mesma e inseparável realidade.
Dirlei Bersch (@dirleibersch)
Engenheira Florestal; Mestre em Desenvolvimento Regional.