Pelo menos quatro moradores da Reserva Extrativista Chico Mendes, no município de Xapuri, que pedem o sigilo de suas identidades, por temer algum tipo de represália, relatam que a pulverização de agrotóxicos em áreas de fazendas que fazem limite com a unidade de conservação pode ter se espalhado com o vento e atingido suas propriedades.
Um dos moradores diz que ele e vizinhos sentiram, por vários dias, o forte cheiro do produto pulverizado por um avião de pequeno porte, que pelo período de uma semana, usou a pista de pouso de Xapuri como base para o reabastecimento do defensivo utilizado no trabalho. Segundo esse morador, lavouras de subsistência foram afetadas pela pulverização.
Alguns dos moradores que alegam estar sendo prejudicados pelos efeitos do agrotóxico em suas propriedades denunciaram a situação a um grupo de vereadores do município, que vai apresentar um pedido de averiguação ao representante do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) em Xapuri, promotor Juleandro Martins, por meio da Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal.
A assessoria do promotor de justiça de Xapuri confirmou que ele foi comunicado da denúncia que chegou a representantes da Câmara. De acordo com o que foi informado, faltava a coleta do termo de informação dos declarantes para que o Ministério Público tenha oficialmente o assunto à mão para a possível abertura de procedimento relacionado ao fato.
De acordo com as informações prestadas pelos moradores, as áreas onde a pulverização foi realizada na semana passada pertencem à fazenda Soberana. A reportagem tentou obter o contato telefônico dos representantes da propriedade citada, mas não conseguiu até o fechamento desta matéria e se mantém à disposição deles para os esclarecimentos necessários.
O ac24horas entrou em contato com o diretor-técnico do Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac), Renê Fontes, que se comprometeu em verificar a situação relacionada à licença ambiental para aviação agrícola no município de Xapuri, mas afirmou não ter conseguido dar uma resposta até a última sexta-feira. Ele pediu que o contato fosse refeito na próxima semana.
A Lei nº 6.938/1981, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente, prevê que qualquer atividade potencialmente poluidora e capaz de causar degradação ambiental dependerá de prévio licenciamento ambiental pelo órgão estadual competente. Assim, a atividade de pulverização de agrotóxicos, por mais que realizada com as devidas cautelas, se insere nesta classificação.
A reportagem conversou sobre o assunto com um servidor da área técnica do Instituto Chico Mendes da Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Segundo ele, é plenamente possível que o produto pulverizado em fazendas que fazem limites com a Resex possam afetar algumas áreas dentro da UC em razão de fatores como o vento, por exemplo.
“Sempre quando passo pela BR vejo um monte de pastagem seca. Já faz algum tempo. Só que agora o vento direciona mais para a reserva quando há frente fria. Esse negócio ainda vai dar uma epidemia de câncer em poucos anos. E tudo vai para o Rio Acre. Daqui uns dias deixaremos de tomar água com agrotóxico e tomaremos agrotóxico com água”, ele disse.
O ac24horas apurou que outras fazendas também usaram a pulverização aérea de herbicidas neste ano, na região de Xapuri e municípios vizinhos, mas não foi observado um movimento de aeronaves no aeródromo do município como o que ocorreu na última semana. Geralmente, os defensivos são usados para combater a vegetação que afeta as pastagens.