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Era para ser um conto de Natal. E é.

Enfim, o monstro chegou. Era quase certo que viria, os homens da ciência já o pressentiam e aqui e ali avisavam aos poucos que queriam ouvir. Veio invisível, sem corpo, sem alma, sem voz. Mesmo materialmente ínfimo, instalou-se como um vendaval entre nós, revirando tudo, contorcendo tudo, afugentando todos. Sob seu mal, o mundo ficou deserto, a terra parou atônita. O que fazer?


O monstro reduziu toda a esperança a limites rasos, toda a coragem a reações instintivas, toda a razão a pequenos pedaços de certeza. Cada tentativa de luta implicou oferenda de vidas no altar da ciência obtida de supetão. Entre o saber observado nas macas e a ciência que pula processos, o vai e vem das defesas foi como um exercício de advinhas.


O monstro entrou em nossas mentes e aniquilou nossos sonhos. Através das televisões, ele nos acorrentou em nossas camas e sofás e nos alimentou de desgraça. A contagem diária nos portões de saída da vida nos tornou dependentes de uma curva macabra que teimou em crescer.


O monstro invadiu nossas almas e confrontou nossa fé, nos incutindo a dúvida, instalando porquês, testando nossas convicções. A perda de amigos e parentes deixou uma zona cinzenta, assim, como uma névoa que encobre a fatalidade.


O monstro torceu nossa coragem e nos intimidou. Nos fez cobrir nossos rostos e abaixar a cabeça, parecendo mais seres sendo humilhados do que pessoas que lutam. Nossos sorrisos não foram mais vistos, restaram olhares melancólicos, ansiosos, revoltados.


O monstro pegou nossas crianças e as prendeu em gaiolas. Elas não correm, não cantam, não brincam, não riem, não aprendem, apenas perguntam. Suas pequeninas mentes foram estancadas em seu desenvolvimento. Não se mede o dano ao jovem que virá, ao adulto em que se transformará.


O monstro impediu a cultura, silenciou vozes que nos animavam, congelou cenas que nos divertiam e entorpeceu a criação. André Malraux, escritor francês, disse certa vez que, sem cultura, o homem é facilmente escravizado. Faz todo sentido para o monstro.


O monstro solapou a verdade, distorceu-a e a pôs de joelhos perante os interesses globalistas. Organizações mundiais, a mídia maisnstream e as big techs instituíram a verdade que se pretende ser. Nada que vemos e ouvimos é seguramente o que parece ser. Nenhuma informação escapa do crivo daqueles que, controlando os controladores da informação, decidem o que é e o que não é a verdade.


O monstro deu carona a outros monstros, os corruptos, os ladrões e oportunistas que vicejam dentro e em volta da administração pública. Pra todo lado se viu novos e velhos bandos aproveitando-se do rastro deixado pelo monstro, comendo seus restos, disputando com ele pedaços de dinheiros sujos de sangue coagulado.


O monstro emprestou-se à política, que o usou para promover governos malsãos e ditadores enrustidos. O monstro que dilui nossas células e empapa de gosma vermelha nossas entranhas, abriu uma porta para a tirania garantida em regulações de última hora, como se esta fosse, afinal, sua maior vitória.


O monstro se instalou na economia gerando miséria e mais morte dela decorrentes. Como dançando uma valsa fúnebre, o monstro e a recessão disputam o aplauso demoníaco que virá para o mais belo ceifador de vidas.


Só o Amor resiste ao monstro. O Amor entre nós e a Deus, presente em todas as religiões. Neste Natal, que para os cristãos, principalmente, é a comemoração do Amor nascido ao mesmo tempo humano e divino, talvez tenhamos que pensar mais, refletir mais e redobrar nossa fé.


O Amor cristão é restaurador. Que seja então. Que restaure nossa esperança, nossas mentes, nossas almas, nossa coragem, as crianças, a cultura, a verdade, os governos, a política, a economia… que afaste as sombras e reconcilie a humanidade com Deus e a verdade.


Valterlucio Bessa Campelo escreve contos e opiniões no ac24horas e também em seu Blog www.valbcampelo.wixsite/conto