Toda organização precisa ter uma estratégia corporativa, global, que marca a forma através da qual pretende realizar sua missão de suprimento de necessidades do ambiente externo. Na prática, a estratégia corporativa designa como a organização precisa chegar onde pretende chegar. Enquanto os objetivos apontam o destino, o onde chegar, as estratégias sinalizam o percurso, o caminho, o como. Com raríssimas exceções, uma instituição de inovação tecnológica jamais será pequena. Ainda que vise a um único nicho de inovação, é muito provável que trabalhe com algumas equipes, cada qual focada na criação e materialização de uma parte do produto desejado. Isso é suficiente para que se entenda a ideia conceitual e a prática efetiva do que é chamado estratégia de negócio. A organização é um todo que, para cumprir sua missão, cria unidades de negócios específicas para realizar o suprimento das necessidades que se comprometeu a fazer. Neste sentido, este ensaio tem como objetivo esclarecer o que a ciência chama de estratégias de negócios.
Imagine uma esquadra de navios de guerra, capitaneada por um porta-aviões. Essa esquadra é dividida em agrupamentos de navios de diferentes tamanhos e tipos, cuja missão é defender o porta-aviões e todo o agrupamento, para que todos consigam chegar ao seu destino em segurança. Haverá, portanto, uma estratégia de ação para toda a esquadra, que se fará materializar a partir de estratégias específicas para cada agrupamento de embarcações. Se a esquadra for atacada, por exemplo, cada grupo de navios agirá de determinada forma, em convergência com a determinação válida para todos os grupos. Essa determinação global é a estratégia corporativa e as ações determinadas para cada grupo de navios, as estratégias de negócios.
Imagine, agora, um time de futebol, o Andorinha Futebol Clube. Quando ele joga com o seu maior rival, o Japiim Atlético Clube, aplica uma estratégia de vitória, que significa adiantar todo o time, incluindo a defesa, para sufocar o adversário no seu próprio campo de defesa. Nessa estratégia, quando o time perde a bola tentará recuperá-la o mais breve possível ao mesmo tempo em que recua a sua defesa. Quando joga com o Clube de Regatas Flamengo, no Maracanã, adota uma estratégia de não ser violentamente goleado. E para não perder por mais de 10 a zero, coloca todo o time na sua pequena área. E quando ganha a posse de bola, adianta apenas dois dos seus atacantes para ficar com a bola no campo adversário o maior tempo possível. O que todo o time deve fazer é chamado de estratégia corporativa (ganhar ou não perder de muito); o que uma parte do time deve fazer é chamado de estratégia de negócio.
Geralmente as instituições de ciência e tecnologia, como universidades e institutos de pesquisas, reconhecem três setores de atividades-fim: ensino, pesquisa e extensão. Esses setores podem ser transformados em estratégias de negócios, e algumas efetivamente o são. Mas não poderá haver estratégias de negócios se cada setor desse não for transformando em unidade estratégica de negócios. É preciso, antes, ter a estratégia corporativa para que se conheça o esquema lógico da estratégia de negócios de cada setor e que, integrados, materializem a estratégia corporativa. De outra forma, uma organização só terá efetivamente uma estratégia corporativa se houver unidades de negócios que a sustentem de forma integrada. E isso, definitivamente, não se consegue ver com clareza nas nossas instituições.
As unidades de negócios funcionam à semelhança de negócios próprios, independentes, em que o executivo principal apenas negocia como os desafios a serem superados ou desempenho a ser alcançado. Tudo o mais é responsabilidade e autoridade do executivo de negócios. Isso inclui, por exemplo, contabilidade, custeio, precificação, negociação, contratação e suprimento próprios. Ainda que vinculados à estratégia corporativa, cada unidade de negócio tem vida própria, ritmo específico, dinâmica singular. E tudo isso acoplado, vinculado, interligado à dinâmica organizacional. Isso seria possível na realidade brasileira?
As unidades de negócios precisam ter negociadas com a organização a forma como o resultado pretendido será alcançado. Os desafios e objetivos corporativos e das unidades de negócios já existem: é preciso alinhar o como, a estratégia. Como consequência, dificilmente um sistema que escolhe dirigente por eleição se acoplaria a essa arquitetura e dinâmica organizacionais porque o vencedor de eleições não terá responsabilidade com a instituição, mas com seus eleitores. Onde há eleição, os estudos parecem indicar, a responsabilidade não é institucional, mas eleitoral. A escolha dos líderes de unidades de negócios se dá, portanto, pela sua capacidade de liderança na condução dos negócios ao destino desejado institucionalmente. Dessa forma, nem o próprio líder maior (reitor ou diretor geral) poderá ser escolhido por eleições, mas pelos diversos processos distintos de escolhas de CEOs.
É o líder que desdobrará os objetivos e metas estratégicos nos objetivos e metas de sua unidade de negócios. Aliás, o esboço, os grandes números e decisões, da estratégia proposta ao líder institucional já sinaliza com precisão os movimentos que serão feitos pelas diversas equipes de negócios que compõem a unidade de negócios. A escolha do líder, portanto, se faz tanto com base em padrões técnicos de gestão quanto por padrões científico-tecnológicos pretéritos alcançados pelo líder em outras (e na própria) instituições e pelas equipes institucionais sob seu futuro comando. Aqui não são palavras que movem a emoção das pessoas para a eleição do líder, mas a maior ou menor probabilidade de sucesso daquelas equipes que compõem a unidade de negócio.
Há quem diga, talvez com alguma razão, que as unidades de negócios não se aplicam ao mundo da inovação. Mas inúmeras experiências mundo afora têm mostrado o contrário. Instituições públicas e privadas que adotam essa arquitetura são muito mais efetivas em relacionamentos com o ambiente externo do que as que não a utilizam. E são relacionamentos que as organizações (e as unidades de negócio) aspiram porque são eles que geram os recursos que as mantêm vivas.
Daniel Silva é PhD, professor, pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e escreve todas às sextas-feiras no ac24horas.