Pronto, os candidatos e partidos políticos já podem acabar essa esquisitice hipócrita de pré-campanha e pré-candidaturas e demonstrar suas preocupações com os municípios. Encerrou-se o tempo das coligações e conchavos, o negócio agora é pedir votos e mostrar quem é mais preparado e tem as melhores propostas. Pelo menos, esse é o enredo oficial.
Defendi recentemente que os candidatos não deveriam esconder a própria história e a face ideológica para fazer da campanha um festival de promessas de melhorias, como numa eleição de síndico de edifício. Continuo achando que se comportar assim é despolitizar a sociedade, é deseducar o cidadão, mas, quem se importa?
Muitos candidatos, verdadeiros trânsfugas ideológicos, quererão afastar da discussão a sua visão de mundo e as teses políticas que sempre defenderam, para fazer da campanha uma métrica de capacidade gerencial ou de promessas embutidas em planos de governo. Ou seja, cada um quer escolher o terreno da disputa que lhe favoreça, tendo como alvo o eleitor sabidamente despolitizado, paradoxalmente incrédulo em relação à política e apaixonado por governos, do qual espera soluções para seus problemas. Aviso aos eleitores que todas elas surgirão, delas todas os candidatos falarão.
O que os candidatos não dirão é que apenas em recursos do Fundo Eleitoral somados ao horário gratuito “pero no mucho” pois implica renúncia fiscal bilionária, serão gastos 3,8 bilhões de reais. Sim, este é o montante aproximado de recursos públicos que a campanha eleitoral de 2020 gastará, sem contar com o custo do Tribunal Superior Eleitoral e dos Tribunais Regionais Eleitorais. Não entra na conta os recursos, também públicos, do Fundo Partidário, que em 2020 se aproxima de 1,0 bilhão de reais. Também não entra na conta os recursos oriundos de doações privadas (cada cidadão pode doar até 10% de sua renda anual). Em 2018, obviamente subfaturados, foram declarados mais de 1,0 bilhão de reais.
Juntando tudo, uma verdadeira fábula de dinheiro será destinada à renovação dos mandatos de prefeitos e vereadores de 5.570 municípios brasileiros. É, dizem, o preço da democracia. Pense numa democracia salgada! No quadro abaixo, temos a distribuição do Fundo Eleitoral por partido político.
Em muitos lugares a mistura desse dinheiro com o tempo de TV tem dado motivo a muita confusão entre partidos e coligações. Sabe como é, aonde tem grana até irmão desconhece irmão, já dizia o samba de Paulinho da Viola. Deixemos esse tema para outra hora. Por enquanto, interessa responder àquele desempregado ou àquela dona de casa pendurada na ajuda do governo federal, o que será feito com tantos recursos extraídos do orçamento geral da união, grana alta que bem poderia ser usada em benefício direto da população, reforçando políticas públicas.
A pergunta óbvia seria: o que poderão eles, os candidatos, fazer com essa dinheirama? A resposta imediata é: praticamente tudo, qualquer coisa. O troço foi tão bem costurado que, se, por acaso, alguém “errar” na utilização e for pego pela justiça, o dinheiro do Fundo paga o advogado e, se o advogado não tiver sucesso na defesa e o sujeito for multado, a grana também paga a multa. Vale dizer, está tudo dominado, será uma eleição na qual os maiores partidos terão os maiores valores financeiros para realizarem as maiores campanhas, fazendo os maiores truques eleitorais e, assim, elegerem o maior número de prefeitos e vereadores. Isso tudo com alvará para o “erro”.
Por dever de justiça, registremos que dos partidos listados no quadro acima o Partido NOVO, que já não usa o fundo partidário, comunicou ao TSE que mais uma vez que não utilizará um centavo sequer do fundo eleitoral, o que remete a outra indagação: se o Partido NOVO pode funcionar e fazer campanha sem dinheiro público, por que os outros não podem? Não sei. Pergunta difícil a gente manda para os “universitários”.
O certo é que o eleitor, já espremido por uma crise financeira gravíssima, será visitado por milhares de candidatos em todo o país, cada um com uma lista muito parecida de intervenções na sua realidade, muitas delas amareladas de tão velhas e, outras, reluzentes, oriundas de mentes “geniais”, todas embrulhadas em papel de boa vontade com carimbo de capacidade gerencial.
No fim(?) da pandemia, provavelmente estressado, deprimido, arruinado ou desempregado, o cidadão médio escolherá o seu prefeito e o seu vereador. Quem será eleito? Minha dica é: neste quadro de desalento, vencerá aquele que melhor ofereça ESPERANÇA.
Valterlucio Bessa Campelo escreve às sextas-feiras no ac24horas.