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Lidando com a sabotagem 

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Não é a falta de capacidade a grande inimiga da aprendizagem, como já mostramos aqui. É a tendência natural dos seres humanos em deixar as coisas para depois, a procrastinação. Agora que já sabemos como ela surge e se enraíza no nosso cérebro é possível compreender como lidar com ela para que possamos superá-la. Pode até parecer paradoxal, mas a própria procrastinação tem muito a nos ensinar. É com base nelas que algumas técnicas foram inventadas, cujos resultados não são apenas a superação do adiamento, mas também a multiplicação da nossa capacidade de aprendizagem e de aprendizado. Neste sentido, neste ensaio vamos mostrar três formas que tenho utilizado com muito sucesso para lidar com essa sabotadora dos intentos humanos de aprender.


Muita gente me pergunta o que eu faço para produzir tantos textos, de diferentes formatos, sobre diversos e complexos assuntos em períodos curtos de tempo. A resposta é simples: técnicas. Aprendi isso com as pessoas bem sucedidas que tive a grata satisfação de conhecer na vida e que tiveram a gentileza de compartilhar comigo um pouco do segredo de seus sucessos. Uma técnica é simplesmente uma maneira bem particular para lidar ou fazer alguma coisa. Assim como existem inúmeras técnicas estatísticas e várias outras de análise semântica, também existem incontáveis técnicas para fritar ovos, curar doença de criança pequena ou nos livrar de maus olhados. Vivemos baseados em técnicas, ainda que nem percebamos. Quanto mais técnicas a gente dominar, mais problemas somos capazes de resolver.

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A primeira técnica que utilizo para evitar procrastinar é não focar no produto, mas sim no processo. Quando sei que tenho que entregar um livro em um prazo de alguns poucos meses e esse livro é um desafio e tanto para mim, procuro me concentrar nas partes dele ou nos seus capítulos. A razão disso é que é muito mais fácil planejar e redigir um capítulo de três a dez páginas do que um livro inteiro. Muitas vezes, creia, tentar visualizar o livro inteiro me dá até náuseas. É o caso da obra “Gestão de Organizações de Ciência e Tecnologia”, que o todo seria composto de aproximadamente 12 partes, cada parte com 30 a 40 capítulos, em um total de mais de duas mil páginas. O que fiz? Organizei em obra em 12 “sublivros”, cada qual com cinco a oito partes de cinco a oito capítulos de três páginas. Planejo um livro inteiro, partindo de suas partes e depois organizo o conteúdo dos capítulos. Daí fica fácil sentar e escrever um capítulo em menos de uma hora.


Mas alguém poderia me contestar dizendo que tem horas que a gente não tem paciência, de maneira que nem quer ver a tarefa que se tem que entregar ou as fontes dos assuntos que temos que estudar e aprender. Isso é verdadeiro. Mas, como eu conheço parte substancial do conhecimento do cérebro, se eu me entregar neste particular, ele vai me vencer. Quando isso acontece, eu uso a técnica Pomodoro. Essa técnica consiste simplesmente em programar determinado dia e hora para, durante 25 minutos, eu realizar a tarefa que tem desafiado o meu querer, a minha vontade de realização. Não importa o que aconteça: sento, me concentro profundamente e realizo tudo o que o tempo de 25 minutos me permite fazer. Depois eu descanso, faço aquilo que o cérebro está me mandando fazer. Mas o interessante, e isso o tempo vai lhe mostrar também, é que quando sento para fazer o trabalho, aquelas energias ruins desaparecem e quase sempre eu passo horas e horas ali, quase sempre finalizando toda a tarefa. A técnica Pomodoro tem me ensinado que a minha força de vontade, a minha motivação, é capaz de superar qualquer desafio, inclusive a resistência cerebral em aprender.


A terceira técnica não é propriamente uma técnica, mas uma forma de posicionamento, um hábito ou atitude que desenvolvi (ou fui forçado a desenvolver) desde criança. Ela consiste em transformar a adversidade em motivação. E apresenta diferentes formas. Humilhações, eu as transformo em fontes de motivação; impedimentos ou tentativas neste sentido me dão uma vontade incontrolável de fazer, agir; a ignorância de alguma coisa que eu considero essencial age sobre mim de forma tão profunda que sou capaz de ir a qualquer lugar do mundo atrás de quem possa me ensinar o que eu não sei. 


Vamos a alguns exemplos. Certo professor do doutorado disse que pessoal de administração não dominava cálculo e por isso não aprenderia sua disciplina. Isso me fez demonstrar, em curto espaço de tempo, que eu sabia mais matemática que o melhor aluno daquela turma. Outro exemplo. Vi muita gente que não sabia escrever e resolvi escrever um livro para reduzir ou eliminar o problema. Muitos me diziam que isso seria impossível, e ainda mais publicar pela editora Atlas, a mais exigente da área. Em menos de um mês escrevi o livro e mostrei a todos, incrédulos, que o livro tinha sido aprovado pelo conselho editorial para publicação. Quer me ver fazer milagres? Diga que eu não sou capaz de fazer alguma coisa. Qualquer coisa!


Quem tem o aprendizado (saber alguma coisa) como meta e verdadeiramente o quer deter (tem força de vontade), se conhecer algumas técnicas de lidar com a procrastinação, não há dúvida alguma que o saberá. A diferença entre o cérebro de Albert Einstein e o nosso é apenas a sua força de vontade, que o levou à genialidade. Saber como aprender, como funciona o órgão que produz a aprendizagem e saber lidar com as nossas fraquezas produzidas pelo cérebro fazem com que nos transformemos em gênio, entendidos os gênios como aqueles indivíduos que têm conhecimentos e capazes de inventar coisas acima da média.


Isso quer dizer que tentar adiar o que se tem que fazer é algo natural porque independe da nossa vontade. Isso é produzido pelo cérebro, que se recusa a trabalhar em um novo caminho para aquele desafio inusitado. Uma coisa, contudo, é a tendência natural, fisiológica e até metabólica, mas outra coisa é nossa reação a isso, principalmente agora que a ciência é capaz de nos explicar por que isso acontece e o que podemos fazer para superá-lo. Quer transformar a sua vida e de todos ao seu redor? Aprenda a lidar com a procrastinação, a sabotadora da aprendizagem e do aprendizado.




 


 


Daniel Silva é PhD, professor,  pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM) e escreve às sextas-feiras no ac24horas. 

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