Valterlucio Bessa Campelo
Nota-se, pela imprensa e alguns fóruns, incertezas a respeito dos rumos do Governo Gladson Cameli. A despeito de sua grande popularidade pessoal e enorme capacidade de comunicar-se diretamente com o povo, há uma certa insistência no tema. Parece não estar claro em certos meios, a natureza e os objetivos do governo.
Não por acaso, o Presidente do IMC – Instituto de Mudanças Climáticas, Professor, Doutor Carlito da Silveira Cavalcante, escreveu recentemente no site de notícias do próprio governo (https://www.agencia.ac.gov.br/), um artigo “É hora de definir um novo modelo de desenvolvimento do Acre”, onde afirma que a “definição de uma política global de desenvolvimento regional, que aponte para a solução dos principais obstáculos, visando à geração de empregos e a criação de um novo tempo, não é apenas oportuna, mas, imprescindível, para o Governo que se inicia”. Há, portanto, nas palavras do presidente do IMC, a busca por um modelo substituto do anterior.
Mais recentemente, o experiente colunista político, Astério Moreira, deste site ac24horas, fez coro em um texto sintético cujo título “Florestania X Nada” sendo ainda mais incisivo e elaborando, em tom de acusação, a frase “Ninguém pensou em nada para colocar no lugar da Florestania. Se pensou, ainda não disse”. Reflitamos.
Salvo melhor juízo, especialmente de quem está enfurnado nas questões do Estado, que não é o meu caso, temos aí duas constatações que retratam a natureza do mesmo problema. Do lado do Prof. Carlito temos a palavra de um especialista na área econômica, um técnico de vasta experiência que reclama a expressão formatada de ações que resultem em um modelo a ser visto e compreendido. Como ele mesmo diz, “políticas setoriais não podem ser confundidas com política global”. Do lado do Astério, temos a visão de quem ouve as ruas, os políticos, os empresários, enfim, a sociedade. Em resumo, é como se o governo como um todo estivesse jogando “sem camisa”, que aqui não se confunde com a “camisa do governador” dado que a equipe é engajada, mas significa não apresentar uma identidade conceitual, programática.
O governo demonstra que fará o que puder no sentido de equilibrar as ações e fazer avançar uma agenda produtivista, em contraposição àquela que vigorou nos últimos anos. Mas há limites. No Acre, há décadas, foram plantadas sementes ecológicas que criaram raízes, cresceram e se consolidaram. Muitas delas, reconheçamos, são rigorosamente necessárias. Contrariamente ao pensamento dos mais afoitos, não se fará do Acre uma Rondônia de uma hora pra outra, talvez, com muito trabalho, consigamos avançar no destravamento burocrático e normativo, no recondicionamento institucional e na dotação de infraestrutura adequada a uma nova perspectiva que contemple o agronegócio, que somente dará as caras com vigor em alguns anos.
Penso que o que está sendo feito e o que se fará precisam do que denomino de arquitetura de planejamento, ou seja, uma expressão planificada visível como modelo nos termos do Prof. Carlito e como rosto na inquietação do jornalista Astério. Em qualquer edifício, o que se vê em primeiro lugar é a arquitetura e não os pavimentos, no Governo também. É necessário, pois, delinear uma feição imediatamente identificável, que comunique o seu rumo, o sentido, o alvo. Disso, seguramente, a competente Secretária de Planejamento e Gestão, Dra. Maria Alice, está cuidando.
Por fim, elejo, por exiguidade do espaço e afinidade, dois pontos a serem considerados para o fortalecimento da feição governamental – a lei ambiental e a iniciativa AMACRO, ambas em estágio de prontidão. Uma para ser levada à ALEAC e outra para ser implementada pelo governo, mediante acordos prévios. Sem isto, serão mantidas as travas e a dispersão de inversões que podem levar a ineficiência de longo prazo, frustrando expectativas.
A lei ambiental pretende atualizar vis a vis a nova realidade, princípios, objetivos e diretrizes de uma legislação envelhecida e cheia de lacunas que, elaborada sob outra perspectiva de desenvolvimento, deixava de lado alguns elementos que hoje se apresentam cruciais, entre eles o agronegócio. A lei em análise contém em vários de seus artigos normativas que esclarecem, facilitam e abrem horizontes para a produção em alta escala, visando estabelecer uma política agrícola que contemple uma economia de base rural, competitiva, tecnologicamente adequada e rentável.
O Projeto AMACRO (acrônimo para AMazonas, ACre e ROndônia), vai no sentido de dar foco, especialidade e prioridade aos investimentos, buscando nas áreas já desflorestadas do território, remover gargalos e ativar opções de cultivos adequados do ponto de vista agronômico, ambiental e econômico, visando aumentos de produtividade, emprego e renda. Concentrar investimentos a partir de projetos articulados com os estados vizinhos deve resultar em obtenção de escala, transferência de tecnologia, movimento de capital e crescimento econômico. Um amplo e verdadeiro complexo agroindustrial, diverso e produtivo, capaz de abrigar e promover uma série de agriclusters com acesso aos mercados internacionais, poderá transformar a nossa realidade em alguns anos.
Há muitos outros projetos em curso. Sem ainda conhecermos os detalhes, diz-se, por exemplo, que os chineses chegarão “com tudo” na ZPE, ocupando-a e fazendo rodar um programa robusto de investimentos e produção, o que revolucionará a nossa economia. Aguardemos. Ainda assim, ouso dizer que sem esses dois movimentos (aprovação da nova lei ambiental e implementação do AMACRO), dificilmente iremos adiante, o que manterá viva a inquietação da população, dos técnicos e, creio, do próprio governador, sobre um novo modelo de desenvolvimento, que seja inovador, autêntico e reconhecível em sua arquitetura como acreano e para os acreanos.
Valterlucio Bessa Campelo escreve às sextas-feiras no ac24horas.