A aposentada Maria de Fátima Rodrigues, de 62 anos, vive os piores dias de sua vida. Ela não anda, quase não consegue ficar sentada e fala muito pouco. Ainda assim, a idosa recebeu alta médica do Hospital Regional do Juruá, em Cruzeiro do Sul, onde ficou internada por cerca de 30 dias, e teve de voltar para casa, no bairro João Alves. Aos cuidados dos filhos por ter perdido os movimentos, ela sofre ainda com desmaios, insônia e depressão.
Exames de ressonância magnética acusaram a existência de um cisto no cérebro de Maria de Fátima. O tumor não é maligno, segundo os profissionais que a avaliaram. Mas a família protesta contra o que chamam de descaso das autoridades da saúde estadual no Vale do Juruá. E reclamam do tratamento que receberam no hospital.
“Minha mãe recebeu alta depois de um mês de internação. O neurologista de Rio Branco diz que o tumor é pequeno demais pra cirurgia, e alega que ela pode conviver com ele pro resto da vida. Mas quem a vê nessa situação sabe que ela não está bem”, desabafa Otacione Rodrigues Gomes, 26, filha de Maria de Fátima.
Ela e o irmão, Cláudio Erlândio, 29, são os filhos da idosa que mais têm se dedicado a lhe prestar auxílio. “Eu já nem durmo direito, e quando o telefone toca, meu coração só falta sair pela boca”, relata Cláudio Erlândio ao descrever o desespero da família.
Segundo eles, a mãe chegou a entrar, há algumas semanas, na lista do TFD (Tratamento Fora de Domicílio), mas foi excluída pouco antes da viagem sob a justificativa de que o neurologista estava com viagem marcada para Cruzeiro Sul. Apesar da promessa de atendimento, a paciente segue sem a avaliação de um profissional especializado, já que a chegada deste último tem sido adiada desde então.
Não bastassem todos esses percalços, a aposentadoria de Maria de Fátima tem sido gasta apenas com medicamentos – que não são fornecidos pela rede estadual ou municipal de saúde – e com alimentação.
Maus-tratos e humilhações
Os filhos de Maria de Fátima descrevem ainda um clima de humilhações e muita indiferença – por parte dos profissionais e membros da diretoria – vivido no Hospital Regional do Juruá.
“Até pra beber água lá eu fui humilhada”, afirma Otacione. “E não fomos os únicos. O atendimento é assim pra todo mundo”.
Para Cláudio, o pior vexame ocorria sempre que pedia informações sobre o quadro clínico da mãe. “Ninguém nos dizia nada. Cansei de ficar em pé no corredor, à espera da médica responsável por ela, e quando a encontrava, ela dizia que não podia fazer mais nada e me dava as costas”, conta ele.
Sem suportar mais a situação desesperadora vivida pela família, Otacione e Cláudio Erlândio denunciaram, dias atrás, o caso no programa Bom Dia Juruá, do jornalista Alexandre Gomes. Em meio à entrevista, eles receberam um telefonema do secretário municipal de Saúde, Edir Clemente Nascimento, que se colocou à disposição para ajudar no que fosse preciso até que o Estado tome providências e ofereça atendimento especializado a Maria de Fátima.
O outro lado
A reportagem do ac24horas entrou em contato com o representante da Saúde no Juruá, Itamar de Sá, que prometeu cobrar da Secretaria Estadual de Saúde uma posição sobre a vinda do neurologista à região. Ele também colocou o repórter em contato com o coordenador do Complexo Regulador do TFD, o médico Vitor Hugo, o qual assegurou que Maria de Fátima também recebe cuidados do programa Melhor em Casa, do governo estadual.
“Não está confirmada a malignidade do tumor no cérebro da paciente. Fui à casa dela hoje pela manhã, e me falaram que ela está tendo convulsões. Vi a filmagem que fizeram, mas não receitei um anticonvulsionante por ter concluído que este não é o caso”, disse ele.
Para Vitor Hugo, Maria de Fátima apresenta um quadro de depressão por achar que está com câncer no cérebro. E, segundo ele, o que se vê no vídeo feito pela família (e reproduzido nesta matéria) é que ela está tendo o que popularmente se chama de “crise nervosa”.
O coordenador do TFD no Juruá confirmou ainda que a idosa deverá aguardar a chegada do neurologista à região, pois, de acordo com ele, enviá-la à capital pode não ser uma solução para o problema.
“Nem sempre mexer com um cisto cerebral resolve. Muitas vezes, as cirurgias causam lesões piores que a existência de um tumor no crânio”, justificou.