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Aplicação da Lei Maria da Penha a transexual*

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*Charles Brasil


No dia Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha (25 de julho) o Tribunal de Justiça do Estado do Acre, na pessoa do Magistrado Danniel Gustavo Bonfim A. da Silva, responsável pela Vara de Proteção à Mulher da Comarca de Rio de Branco, toma decisão inédita que visa respeitar os direitos fundamentais e de personalidade consagrados no ordenamento pátrio ao reconhecer e determinar a aplicação das medidas protetivas de urgência da Lei Maria da Penha a uma transexual vítima de violência doméstica e familiar no último dia 19. É um dia de regozijo e muita satisfação para os operadores do direito, sobretudo aos militantes dos direitos humanos da comunidade LGBT do Estado do Acre e de todo o Brasil, pois a decisão do magistrado poderá influenciar outros do país. E atualmente poucos (TJSP, TJMT, TJRJ e TJGO) se manifestaram sobre o assunto.


O caso de Rio Branco ficou bastante conhecido devido a própria vítima expor as condições físicas que a violência praticada pelo seu namorado lhe deixou, publicando fotos totalmente ensanguentada em sua rede social, sendo replicadas em jornais virtuais da capital acreana. A inédita decisão encontra consonância com o pensamento moderno de respeito a dignidade humana, um fundamento da república brasileira e aos direitos fundamentais e de personalidade, pois considera a mulher a pessoa não somente pelo ponto de vista biológico, mas sobretudo por sua identidade de gênero, ou seja, respeita a representação social da feminilidade que é expressada por pessoas que não se enquadram na heteronarmatividade em suas vestimentas, expressões corporais e dentre outras formas de apresentação da identidade de gênero.


O respeito a identidade de gênero encontra guarida na própria Lei Maria da Penha quando afirma que “Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social” (Art. 2°). Enquanto o Art. 5°o preceitua a definição de violência doméstica e familiar,  para os efeitos da lei, in verbis: (…) “configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. E o parágrafo único do mesmo artigo afirma que as relações pessoais independem da orientação sexual.


Vale destacar parte da decisão do magistrado: “Assim, partindo da lógica das garantias dos direitos fundamentais, da igualdade e da dignidade da pessoa humana, considerando ainda a evolução histórica dos direitos humanos consagrada nos pactos e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, entendo que devemos da amplitude ao sujeito de direito protegido pela norma da lei Maria da Penha para proteger também as lésbicas, os travestis e os transexuais contra agressões praticadas pelos seus companheiros ou companheiras”. (Rio Branco/AC. Tribunal de Justiça do Estado do Acre. Decisão Interlocutória para garantir aplicação das medidas protetivas de urgência da lei Maria da Penha a uma transexual. Magistrado: Danniel Gustavo Bomfim A. da Silva. Data: 25/07/2016).


Nesse sentido, a inovadora e respeitável decisão precisa encontrar eco nos demais operadores do direito, sobretudo os da Polícia Judiciária (Polícia Civil) que está na “linha de frente” da aplicação da lei, por esse motivo, recebem as vítimas agredidas em primeira mão. E as delegadas e delegados precisam compreender que no Estado Democrático de Direito não há mais espaço para não respeitar a identidade de gênero dos sujeitos de direito. O Acre torna exemplo louvável para o Brasil no que se refere ao entendimento jurídico de respeito aos direitos humanos da comunidade LGBT.


*Charles Brasil é presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Acre e mestrando em Estado, Cidadania e Constituição pela Universidade de Brasília (UNB).


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