Rio Branco – a capital de todos os acreanos – chega aos 95 anos com um sistema político ainda marcado pelas relações familiares. De irmão para irmão, de pai para filho, e dentre outros parentescos, o mapa e legados políticos vão sendo repassados de geração para geração, com tratos que se estendem sobre casais e que envolvem eleitores parecendo imperceptível a tentativa de manutenção no poder que está por trás desse jogo.
Pelo que se anuncia na disputa eleitoral deste ano, em Rio Branco não será diferente: haverá vários exemplos de familiocracia. De olho nas 17 vagas de vereadores da Câmara Municipal e salários acima de R$ 12 mil, candidatos derrotados nas últimas eleições, vereadores, deputados estaduais, deputados federais, senadores, secretários de estado e até pastores, emplacam candidaturas que nem sempre vem com a sucessão pelos filhos – ela pode ser por esposas, sobrinhos, primos e até irmãos.
O líder do prefeito Marcus Viana, vereador Gabriel Forneck (pt), anunciou que não será candidato à reeleição, mas ao mesmo tempo lançou a candidatura do irmão, atual secretário municipal de cultura, Rodrigo Forneck.
O clã Forneck não é o único exemplo de familiocracia na Câmara Municipal. O senador Sérgio Petecão (PSD-AC) vai tentar reeleger a irmã, vereadora Lene Petecão, que em fevereiro de 2015 assumiu a vaga deixada pela ex-vereadora Eliane Sinhasique (PMDB). eleita deputada estadual. Conhecido por sua gula pelo poder, Petecão ainda costura o nome da esposa, Mafisa Galvão (primeira suplente de deputado federal) como vice na chapa majoritária da oposição.
Da Assembleia Legislativa do Acre vem as maiores investidas de permanência no poder. Heitor Junior (PDT) vai lançar a mulher, Elza. O parlamentar tem como base pacientes que fazem tratamento de hepatites. Outro que busca familiocracia é o deputado Whendy Lima que aproveitando a janela eleitoral se filiou ao PP. Está confirmada a candidatura do seu pai, o militar N. Lima que já foi deputado estadual e que teve registro cassado pelo TRE em 2011.O que Whendy ainda não conseguiu explicar é como irá ajudar o pai fazer o caminho inverso da política, estando no PP e apoiando uma candidatura de vereador pelo DEM, partido que N. Lima permaneceu filiado.
Entre irmãos, os laços também afloram na política como é o caso do lançamento da pré-candidatura de Railson Correia Costa. Ele é irmão do deputado estadual Raimundinho da Saúde. Railson foi nomeado em 2015 pelo governador Sebastião Viana como diretor executivo do Departamento Estadual de Pavimentação e Saneamento, o DEPASA.
O secretário de Habitação e Interesse Social, Jamyl Asfury, vai lançar a esposa, Sandra Asfury, forte liderança da Igreja Batista, como pré-candidata a vereadora. Atualmente, a sua secretária é alvo de investigações por facilitação de acesso à casa própria do programa Minha Casa, Minha Vida.
Ainda em família vem os casos de quem perdeu as últimas eleições no estado. Semana passada, por exemplo, o tucano Márcio Bittar confirmou a pré-candidatura do filho, João Paulo Bittar para a Câmara Municipal. Nas eleições de 2014, quando concorreu ao governo do Acre, Bittar recuou no prazo final das convenções de lançar a esposa, Marcia Bittar, como candidata à deputada federal, cargo que Marcio Bittar deixou para concorrer ao Palácio Rio Branco.
Até quem está fora do poder há muito tempo, como é o caso do provedor da Santa Casa de Misericórida, José Aleksandro (ex-vereador e ex-deputado federal) tenta manter vivo o legado político. Alex, como é mais conhecido, lançou pelo PDT a pré-candidatura do filho, Anderson Silva.
A oligarquia Viana como exemplo : Para alguns analistas o fato dos partidos políticos se abrirem pouco para a renovação é uma das causas do fenômeno conhecido como familiocracia. Há quem diga que em 2010, o Brasil transcendeu a antiga “oligarquia” criando o sistema eleitoral da “familiocracia”.
Oligarquia ou familiocracia, Jorge Viana é quem estreou o novo momento na política do Acre, em 1990, quando, sem nenhuma experiência política se tornou o primeiro candidato do PT a disputar o segundo turno de uma eleição. Mesmo perdendo por uma diferença de 13 mil votos para o primeiro colocado, Edmundo Pinto, Viana teria contribuído para o surgimento da Frente Popular do Acre (FPA) que menos de dez anos depois se tornaria a maior força política do Estado.
Jorge Viana foi eleito prefeito de Rio Branco em 1992 e em 1994 inaugurava uma nova fase em sua carreira política como governador do Acre, cargo que permaneceu até 2006. Depois conseguiu eleger seu sucessor, Binho Marques, e em 2010 elegeu-se Senador da República, elegendo o irmão, Sebastião Viana como sucessor de Binho Marques no governo do estado.
Do início da década de 90, no século passado até os dias atuais já se passaram praticamente 26 anos em que os irmãos Vianas passaram a ser os políticos mais influentes do Estado revezando os cargos mais cobiçados da política acreana.
Este ano, a manutenção deste poder é colocada à prova com a eleição municipal que tem pela FPA o nome de Marcus Viana, como candidato à reeleição. Embora tenha acrescentado o sobrenome Viana, Marcus não é da família dos irmãos Jorge e Sebastião, mas de extrema confiança do grupo que pretende manter a prefeitura nas mãos do Partido dos Trabalhadores.
Marcus é o nome pensado pela FPA para concorrer às eleições de 2018, não por vontade política dos irmãos e os principais cardeais da Frente, mas por força da lei. Jorge e Sebastião não poderão concorrer ao cargo máximo da política estadual. Jorge Viana é candidato à reeleição para o Senado. Sebastião Viana ainda não decidiu o que fará quando deixar o cargo de governador.
Coronelismo ou familiocracia no interior – A supremacia de Jorge e Sebastião no estado não significa necessariamente liderança no Juruá. Embora tenham conseguido resultados decisivos nas eleições em Cruzeiro do Sul em 2010 e 2014, pelas redondezas é o nome de Vagner Sales que soa mais alto desde 2008.
Eleito prefeito com mais de 18 mil votos, em 2008 reelegeu a esposa, Antônia Sales como uma das mais votadas em todo o Estado. Depois, Vagner foi reeleito prefeito em 2012, sempre lutando contra forte candidaturas impostas pelos irmãos Viana, além de vários processos eleitorais que tentaram lhe tirar da cadeira de prefeito.
Nas eleições de 2014, o casal aumentou a familiocracia elegendo em apenas 45 dias de campanha, a filha, Jéssica Sales como deputada federal pelo PMDB. Nesta eleição, Antônia Sales concorreu e perdeu como vice na chapa do tucano Márcio Bittar.
Pela região, Vagner Sales é conhecido como um coronel das barrancas do Juruá, trajetória de vida que ele não nega, mas que tem orgulho de falar. Sales morou com a família nos seringais de Cruzeiro do Sul. Chegando na cidade, Sales começou a estudar e trabalhou como engraxate, quebrou tijolos para fazer concreto, antes de conseguir o primeiro emprego como faxineiro da Câmara de Vereadores, sendo eleito posteriormente como o vereador mais bem votado da história da parlamento municipal.
O legado de Orleir Cameli – Foi do Juruá também que, em 1994, Orleir Cameli entrou para a história política ao vencer as eleições para o Palácio Rio Branco. Até hoje, Orleir é lembrado como o único nome a derrotar Jorge Viana no primeiro turno e vencer Flaviano Melo no segundo turno. Orleir faleceu fora do poder, no dia 8 de maio de 2013, mas deixou seu sobrinho, Gladson Cameli (PP) reeleito deputado federal. Em 2016, Gladson ganhou a eleição para o senado e tem o nome cotado para disputar o Palácio Rio Branco pela oposição nas eleições de 2018.
Familiocracia no cenário nacional – O Acre não é diferente dos demais estados brasileiros quando o quesito é familiocracia. Em nível nacional, Aécio Neves tenta seguir os passos do avô Tancredo Neves; Luciana Genro, que é filha do ex-ministro Tarso Genro, disputou em 2014 uma eleição presidencial; Eduardo Campos, que faleceu em acidente de avião, também buscava seguir o avô Miguel Arraes de Alencar. Antônio Carlos Magalhães Neto segue também a tradição da família. Assim como Roseane Sarney entrou para política acompanhando o pai José Sarney.