O ex-seringueiro e ex-presidente estadual do Psol no Acre, Osmarino Amâncio, nunca deixou de demonstrar insatisfação com a ex-companheira de seringal Marina Silva. No começo da semana, Osmarino divulgou uma carta pela qual informa desligamento da corrente partidária Movimento Terra e Liberdade (MTL) por defender aproximação do Psol com a ex-senadora Marina Silva (sem partido).
Amâncio costuma acusar Marina Silva de promover uma ampla destruição das florestas quando esteve a frente do Ministério do Meio Ambiente no governo do ex-presidente Lula da Silva. Para ele, a então ministra constituira o “Ministério das ONG’s, implementando políticas públicas que afrontam os interesses reais de conservação da floresta e de garantia de vida digna para as populações tradicionais que dela sobrevivem”.
Com a polêmica envolvendo a extração de madeira na Reserva Antimary, o ex-serigueiro questiona o paradeiro de Marina. “Neste momento, reacendem as lutas sociais no Acre. Onde está Marina? Em Brasília? No Rio de Janeiro?”.
Ao encerrar a carta, Amâncio ironiza ao lembrar o ditado popular: “Dize-me com quem andas que te direi quem és”.
Leia na íntegra:
CARTA ABERTA AOS COMPANHEIROS DO MTL
Frente à divulgação da tese do MTL e independentes do Rio para o 3º Congresso Nacional do PSOL, venho a público manifestar minha indignação quanto às propostas políticas defendidas por seus signatários e anunciar meu desligamento oficial desta corrente. O MTL, além de propor uma “ampliação” do leque de alianças que não se limite à Frente de Esquerda, defende uma aproximação a Marina Silva, por sua alegada imagem de lutadora ambientalista de bases populares. Não colocaram meu nome na tese, conhecendo minha posição contrária ao que foi publicado. Aceitar apoiar Marina significa, pra mim, negar minha própria luta, minha própria trajetória, assim como a dos demais seringueiros e lutadores da Amazônia, principalmente daqueles que deram sua vida pela causa da reforma agrária, como Chico Mendes, Wilson Pinheiro, Jesus Matias, Ivair Higino, Dorothy Stang, entre outros.
Como sempre denunciei aos companheiros de partido, a posição de Marina é, na verdade, aquela defendida pelas grandes ONG’s ambientalistas, especialmente as que recebem a maior parte de suas receitas provenientes de fundações de empresas transnacionais e agências de governos estrangeiros, sobretudo a USAID. A gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente possibilitou uma expansão inédita da atuação de tais organizações no interior desse órgão, tornando-o um verdadeiro “ministério das ONG’s”, implementando políticas públicas que afrontam os interesses reais de conservação da floresta e de garantia de vida digna para as populações tradicionais que dela sobrevivem. Assinou “chorando”, desconfio que “lágrimas de crocodilo”, a Lei dos Transgênicos, a Lei de Florestas Públicas e apoiou o selo FSC.
É curioso notar que as críticas apresentadas na tese do MTL, relativas ao discurso enganoso do “desenvolvimento sustentável” e à incompatibilidade entre uma agenda ambiental séria e o desenvolvimento capitalista, deveriam apontar a própria Marina Silva como uma das figuras mais importantes na divulgação dessas falsas alternativas. A fidelidade real de Marina Silva é para com este grupo de ONG’s, que na verdade representam as políticas “ambientalistas” do imperialismo, baseadas na lógica de manter intacto o padrão destrutivo de desenvolvimento capitalista, oferecendo como contrapartida medidas de “preservação ambiental” que envolvam lucros, como os atuais Pagamentos por Serviços Ambientais, REDD, etc., todas apoiadas pela ex-ministra (em anexo, divulgo a Carta do Acre, elaborada por organizações sociais, que especifica essas questões). O desempenho de Marina Silva nas eleições de 2010 só confirma a sua estreita vinculação com o imperialismo e com poderosos empresários de capital nacional e associado. Empresas poluidoras como Cosan, CSN, Suzano Papel e Celulose, Klabin e Bunge, e aquelas responsáveis por grandes impactos ambientais, como Andrade Gutierrez, Camargo Correa e EBX, foram alguns dos principais doadores para a sua campanha, cujo tesoureiro foi presidente do Citibank e da Câmara Americana de Comércio[1]. A “onda verde”, fica claro, nada mais representou do que um refúgio para neoliberais pintados com esta cor.
Em seu estado de origem, Marina teve pífia votação. Que base social é essa? Na verdade, a imagem de Marina tem apelo junto às classes médias urbanas, no centro-sul do Brasil. É esse público que o PSOL e o MTL estão tentando atingir? Neste momento, reacendem as lutas sociais no Acre. Onde está Marina? Em Brasília? No Rio de Janeiro? Com certeza, não foi vista na Floresta Estadual do Antimary e no Seringal São Bernardo, onde as populações locais enfrentam uma empresa madeireira certificada pelo selo FSC, dos amigos de Marina.
Diante disto, anuncio, com imensa tristeza, minha desvinculação oficial do MTL, sabendo que muitos companheiros entendem minha indignação e concordam com minhas posições. No momento, continuarei no PSOL, a lutar ao lado dos trabalhadores do campo e da cidade por uma transformação socialista do Brasil. O partido conta, em seus quadros, com outras figuras cuja trajetória é incompatível com a de Marina Silva, como a companheira Dercy Telles, recentemente filiada, presidente do STR de Xapuri, a primeira mulher presidente de sindicato de trabalhadores rurais da Amazônia – na mesma época em que a valente Margarida Alves se tornou mais uma vítima do latifúndio. Dercy saiu do PV justamente por discordar das atitudes de Marina!
A expansão do apoio popular ao PSOL não pode ser conseguida às custas da barganha sobre os princípios socialistas, por meio de mero oportunismo eleitoreiro. Ela só pode ser efetivada por meio de um programa que garanta dignas condições de vida para as classes exploradas. Os socialistas sabem que, para mudar a realidade, a primeira condição é conhecê-la. A mesma lógica deve ser aplicada às alianças que fazemos. Como alguém já disse antes, “Dize-me com quem andas que te direi quem és”.
Rio Branco, 10 de outubro de 2011.
Osmarino Amâncio Rodrigues
Escrito por Edmilson Alves, de RioBranco (AC)
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Redação de ac24horas