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A russa

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Ela tinha um sotaque maravilhoso. Notei na mesma hora que era da Xexênia. Ela era soviética. Era de por ali do leste europeu. Disse para mim seu nome, que jamais esquecerei. Verginia Shavatzjnakovak ganhou minha atenção e meu interesse em sua estória extraordinária e, vendo seus lábios trabalharem freneticamente, me apaixonei por ela. Sua língua… Tão exótica e tão doce… Se estivesse falando palavras que eu entendesse não teria me emocionado tanto.


Excitado que estava, eu a pedi em casamento sem pensar nem titubear e ela disse que sim, que seria minha para o resto vida, na saúde e na doença, na paz e na guerra e disse mais, que viveria comigo até debaixo da ponte e que me daria filhas e filhos lindos com a minha cara e seu todo amor. Foi um casamento de sonho, que toda garota algum dia sonhou casar assim como ela se casou. E, naquela cerimônia emocionante, eu disse sim e ela disse também sim.


Confesso agora, que eu não estava entendendo nada do que ela falava. Sei que gemia, que me falava palavras carinhosas. Ela me beijava e me lambuzava, e me salivava com seus quatro lábios deliciosos. Que mulher! Eu a amava como o poeta ama a letra, como a virgem ama a virtude, como ela amava a alegria, como o povo ama a liberdade. O amor aconteceu ali, naquele momento sublime, num arrepiar de vida.


Obviamente – Quem viveu, e viu, e leu sabe -, nós não nos entendemos assim como nossos corações palpitavam para que as promessas se cumprissem como desejávamos. Fomos apartados pelas palavras que cada um de nós dois tentava falar e nenhum dos dois entendia. Ela era russa e eu brasileiro. A gente só se entendia quando não falávamos. Eu só a entendia quando ela chorava e chorava no idioma universal da infelicidade.


Eu disse para minha amada Verginia Shavatzjnakovak que precisava sair dali e comprar cigarros, na banca de jornais da esquina. Ela soube, na mesma hora em que falei isso, que eu estava mentindo, que não estava indo comprar cigarros, nem que a banca era ali na esquina. Eu sei que ela ficou triste e que sofreu com minha covarde desistência que, para mim, foi um presente para ela, a mulher que eu nunca entenderia o que falava, mas, assim, a livraria de mim.