O Governo Federal anunciou na sexta-feira (26) os números do Pé de Meia, o programa que cria uma bolsa para combater a evasão escolar no Ensino Médio. De imediato, é preciso lembrar que o próprio Ministério da Educação calcula a evasão escolar nessa fase do ensino em 480 mil alunos por ano. É como se uma Rio Branco inteira de estudantes deixasse de estudar. Esse número, por si, explica muita coisa errada na rotina do brasileiro.
Os defensores da iniciativa privada, da intervenção mínima do Estado na economia, têm urticária ao ouvir que até 2026 o Governo Federal vai aplicar R$ 20 bilhões com a execução do programa Pé de Meia. Eles têm convulsão ao saber que cada aluno do Ensino Médio de baixa renda da rede pública, inscritos no CADÚnico, poderão receber, ao fim do processo, até R$ 9,2 mil.
Essa é uma intervenção direta na Economia. Poucos investimentos e intervenções são mais diretas no ambiente econômico do que os que guardam relação com a Educação. Falando mais direto: o Pé de Meia é Economia, contada por outra tabuada.
A lei que instituiu o Pé de Meia foi sancionada pelo presidente Lula há 11 dias e entrou em vigor na última sexta-feira (26) com a assinatura do decreto que regulamenta o programa. E como funcionará?
A cada ano, o Governo Federal vai pagar R$ 2 mil por aluno em 10 parcelas de R$ 200 que podem ser sacadas mensalmente. A primeira parcela é um incentivo à matrícula e as outras 9 vão depender da frequência do aluno em pelo menos 80% das aulas. Além desses R$ 2 mil, a cada ano de aprovação, o aluno vai ter direito a mais R$ 1 mil que serão depositados em uma poupança. Esse dinheiro só vai poder ser sacado depois que o aluno receber o certificado de conclusão do Ensino Médio e também certificados de avaliações educacionais como o Saeb, por exemplo. No último ano do Ensino Médio, se o aluno fizer o Enem, ele vai receber mais R$ 200. Cada aluno terá uma conta poupança que será aberta automaticamente pela Caixa Econômica Federal.
Caso o aluno reprove dois anos seguidos ou desista das aulas, ele será desligado automaticamente do programa. O Ministério da Educação garante que já há recursos em caixa para execução do Pé de Meia e que pretende iniciar o pagamento já a partir de março.
A primeira coisa a ser destacada: é um ambiente bem diverso daquele em que o ministro da Educação fazia gracejos com guarda-chuva no gabinete de trabalho ou avaliava que as universidades federais eram canteiros de produção de maconha e onde só se fazia balbúrdia.
É evidente que a solução encontrada pelo atual governo de manter alunos estudando acenando com dinheiro no focinho gera polêmicas. Platão, Roquete Pinto e Paulo Freire devem estar se retorcendo ou de indignados, ou de desconfiados. Mas é preciso olhar o momento e a história do momento.
O momento é de exclusão social e econômica espalhando-se feito câncer. As políticas de distribuição de renda sempre estão aquém da máquina de produzir miseráveis que as atuais relações de trabalho têm gerado. A juventude, uma fase da vida de crises naturais, está no meio de uma crise fabricada, decidida, planificada. é preciso o Estado intervir para amenizar as coisas.
A história do momento registra que essa decisão do Pé de Meia é um desfecho de um processo de discussão que se arrasta há mais de 20 anos, que é a tão falada e polêmica Reforma do Ensino Médio. O governo do ex-presidente Michel Temer se assustou com resultados que o Ensino Médio produziu; apressou-se em algumas medidas e impôs aos governos estaduais, por exemplo, a adesão ao Ensino em Tempo Integral. Os Estados, sem planejar e pegos de surpresa, tiveram que adotar medidas emergenciais para atender aos ditames pouco calculados do então ministro Mendonça Filho.
A história do momento também precisa lembrar que a “ala ideológica” do Governo Bolsonaro, cuja maior referência era o guru Olavo de Carvalho, não sabia nem para qual rumo essa discussão sobre o Ensino Médio caminhava. O Ministério da Educação à época ocupava-se de barras de ouro e pastores com valores nada republicanos. Até ministro da Educação atirador tinha-se à época do Capitão.
O desafio agora é vigilância absoluta na execução do programa junto aos governos estaduais. Ministério Público Federal, secretarias de Estado de Educação precisam estar afinados para que nada mais exista entre o pé e a meia que não seja impulsionar o cidadão para frente.