O assassinato do jovem Andriel Oliveira da Silva, de apenas 16 anos, não foi trivial. Não está circunscrito apenas ao chavão “guerra de facções”. Mesmo porque a linha de investigação mais robusta aponta que o motivo direto da morte foi passional: o irmão da namorada de Andriel não aceitava o relacionamento. Não aceitava e, por isso, mandou executar a morte. detalhe: o suposto mandante também tem 16 anos.
A imposição das manchetes forçou a imprensa local a chamar o adolescente infrator de “cunhado”. A rigor, não procede porque Andriel e a irmã do algoz mandante formavam apenas um casal de namorados. Não eram casados.
Para celebrar esse ambiente de caos total, um detalhe mórbido: os supostos assassinos comemoravam o feito com gargalhadas, cigarros e tiros mortais na Língua Portuguesa em uma live na internet. O ambiente, o cenário, o contexto em que parte da juventude do Acre está inserida é de completo caos.
Antes que deputados federais e senadores apresentem teses apressadas sobre redução da maioridade penal como solução, é preciso observar o problema com a complexidade que o cenário exige.
O Acre, por exemplo, está com média de matrícula de jovens em escolas de Ensino Médio de tempo integral de 12,3% (dados de 2022). É uma presença muito fraca, abaixo da média nacional, de 17,7%. Isso indica que a escola está se distanciando da juventude; ou a juventude tem perdido o encanto pela escola. Uma dúvida do “Paradoxo Tostines” de espiral descendente, negativa.
Tanto por um lado da dúvida quanto pela outro, o Estado tem um papel fundamental nesse processo. E está falhando.
Por exemplo: é consenso que o uso da internet é básico no processo educacional atualmente. É uma premissa elementar: no processo de Ensino e Aprendizagem, o uso da web é trivial. Pois bem. No Acre, há quatro municípios que ou não ofertam internet nas escolas ou a rede municipal oferece apenas a 10% das unidades escolares. O cenário é péssimo. O cenário fica menos ruim em três municípios (incluindo a Capital e outros dois na região do Vale do Baixo Acre). Os dados são do Inep de 2021. Como é que a escola será atrativa ao jovem se o Estado ainda não tornou banal o uso da internet na sala de aula? Os dados são do Inep.
Na Educação Básica, por exemplo, a situação está piorando também. Em 2021, foram registradas 255.274 matrículas de Educação Básica no Estado do Acre. Isso, na prática, são 29.396, comparado ao ano de 2017. Redução de 10,3%.
O que isso tem a ver com a morte de Andriel? Isso tem tudo a ver com a morte de Andriel e de tantos outros jovens até 29 anos que têm perdido a vida no Acre. É evidente que abordar o problema lembrando do papel da Educação como instrumento de emancipação não rende votos.
No máximo, a sofisticação dos nossos parlamentares observa o debate com a defesa equivocada das escolas cívico-militares. É o máximo que a percepção dos ilustres representantes do povo abarca.
A manipulação da sensação de insegurança nas comunidades é tamanha que há uma manobra tosca da ideia de que a “disciplina militar” na escola é a solução para o problema da violência. E o pior é saber que há educadores com poder de decisão na atual gestão pública que sabem do equívoco dessa proposta, mas se calam por pura conveniência política. É lamentável.
Enquanto isso, a juventude acreana segue se matando. A live do terror, que celebrou a morte de Andriel, é um escárnio. Naqueles sorrisos, naquelas imagens desfocadas e escuras, naquele arremedo de vida, está todo o Acre: entre um silêncio e outro, entre uma treva e outra brilham a Secretaria de Estado de Educação; brilham os gabinetes oficiais de parlamentares e gestores; brilham também a Secretaria de Estado de Saúde; de Assistência Social com todas as caminhonetes e todas as injustiças cometidas contra todos os motoristas. Cabe também naquele vídeo a imprensa local. Cabem, com folga, todas as Igrejas. A live do terror é o Acre que não quer se ver. E essa negativa em se enxergar permite tudo.