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Companheirismo do STJ revisita “Homenagem ao Malandro”

O Superior Tribunal de Justiça cometeu uma “companheirada” impossível de passar despercebida. Livrou da carceragem o atual conselheiro do Tribunal de Contas do Acre e ex-deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores, Ronald Polanco. A martelada evitou a prisão por até 12 anos daquela que, há até pouco tempo, era uma das lideranças mais promissoras da crônica política regional: um jovem empolado pelo discurso de moralidade com a coisa pública; enraizado com a luta dos povos extrativistas e, claro, com o peito inchado, recheado pela Ética. Pois eis que esse senhor estava enlambuzado pela acusação de prática de peculato e enquadrado no Artigo 312 do Código Penal.


Nada como o tempo e o Código Penal para revelar o que se é e do que as instituições são capazes de fazer em nome das conveniências políticas. E o que diz o Artigo 312 do Código Penal? “Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”. Simples assim. Era disto que estava sendo acusado o homem nascido na tríplice fronteira, na região de Bolpebra, que fortaleceu o discurso ambientalista na tribuna da Aleac, mas que, segundo o relator do processo na corte, Villas Bôas Cueva, não vacilou em apropriar-se de valores que deveriam ser destinados exclusivamente ao custeio de passagens aéreas para o seu próprio deslocamento no exercício do mandato como deputado estadual.


Para além do juridiquês: segundo o relator, o dinheirinho que deveria servir para compra de passagens era desviado pela excelência petista sem vacilo. E o relator disse ainda mais: não seria possível afirmar que era peculato praticado pela malandragem de outra pessoa, pelo irrefutável argumento de que o então nobre parlamentar não dispunha de acesso direto à verba pública. A Aleac efetuava o pagamento das passagens mediante apresentação das faturas pela agência de viagens. O relator expôs a malandragem em cadeia.


Por isso, deveria prevalecer o que grita o parágrafo 1º do já citado Artigo 312 do Código Penal: “Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para ser subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário”. A impressão que se tem é que este parágrafo foi feito para algemar Polanco. Mas, calma. Nem só de lógica e de parágrafos é feito um julgamento. Há companheirismos de toda ordem.


O interessante também é perceber que o próprio tempo tem lá a sua boa dose de camaradagem. Pelo companheirismo do STJ, o conselheiro Ronald Polanco está livre e leve, pronto para julgar prefeitos, secretários, governadores e, quem sabe, até mesmo aconselhar as excelências do parlamento estadual, a casa onde ele, até outro dia, supostamente cometia traquinagens.


Mas como o malhete, ou o martelo de quem julga, tem sempre dois lados, o episódio da malandragem salva pelo STJ lembra o que disse o bom samba de Chico Buarque: “agora já não é normal/ o que dá de malandro regular, profissional/ malandro com aparato de malandro oficial/malandro candidato a malandro federal/malandro com retrato na coluna social/ malandro com contrato, com gravata e capital/ que nunca se dá mal…”


O bom senso exige que Polanco deveria apresentar-se como impedido de julgar quem quer que seja. Deveria “aposentar a navalha”, como o malandro do samba. Mas quem se acostumou com a malandragem das contas difícil terminar trabalhando, morando longe e chacoalhando em um trem da Central. No fim das contas, quem samba mesmo é o povo.


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