O dia 8 de janeiro de 2023 entrará para a história do Brasil. Os atos terroristas contra as instituições que simbolizam a República tinham como objetivo destruir a democracia e instaurar um regime de força baseado no poder das armas empunhadas por militares a serviço das pautas da extrema-direita. O país esteve muito perto de um levante que, em tese, poderia resultar numa guerra civil. A irresponsabilidade de quem promoveu tamanho absurdo é semelhante à inconsequência de quem o apoia.
Os responsáveis são grupos bolsonaristas inconformados com o resultado da eleição de outubro dispostos a promover um levante político. Estimuladas por uma verdadeira avalanche de publicações de fake news em redes sociais, essas pessoas acreditam que estavam realizando uma missão superior destinada a livrar o Brasil do perigo comunista que, segundo seus delírios, quer destruir suas famílias e patrimônios. Acreditam que Lula não venceu a eleição e que as urnas foram fraudadas. Estranhamento, acham isso somente em relação à eleição presidencial, sem qualquer consideração sobre as escolhas de deputados, senadores e governadores.
O Acre aparece hoje como um kluster bolsonarista. Mas, resisto em acreditar que seja um apoiador majoritário do que o bolsonarismo fez em Brasília no domingo, e do que pode fazer caso continue agredindo as instituições e a normalidade democrática. Como já escrevi nesta coluna, o Acre foi terreno fértil para a resistência aos militares no poder durante a Ditadura. Aqui a ARENA, que era o partido do regime, perdeu praticamente todas as disputas entre 1978 e 1989. O Acre, em verdade, tem uma raiz de oposição que nasceu com o levante contra o exército boliviano na gloriosa Revolução Acreana. Somos herdeiros de uma certa veia democrática e antissistema. Paradoxalmente, é o que explica o crescimento do bolsonarismo raiz por aqui. Mas, indica também que quando esse movimento descamba para práticas golpistas de feição autoritária, como os atos terroristas de 8 de janeiro, arrisca perder o apoio majoritário que recebeu até agora.
O que a extrema-direita bolsonarista fez no domingo atenta contra todos os princípios da vida democrática. Invadir e vandalizar palácios que simbolizam os poderes da República é em si algo que deve receber a repulsa de toda pessoa civilizada deste país. Pior ainda quando se percebe que, a rigor, o objetivo era gerar um estado de caos e, com isso, justificar a intervenção das Forças Armadas e a instauração de um regime estranho à normalidade democrática.
Essa é daquelas coisas que ninguém sabe onde vai dar. O Golpe de 1964 foi realizado sob a promessa de rápida restauração da ordem constitucional. Grande mentira. Durou 25 longos anos, muitas vidas ceifadas e outros tantos de brasileiros torturados ou expulsos do país. Um regime de vergonha que jamais deveria ter acontecido. Da mesma forma como os generais assaltaram o poder para si em 1964, sob desculpas as mais variadas, Bolsonaro deseja um levante antidemocrático para tomar o poder e colocá-lo a serviço de sua vaidade e dos sonhos de grandeza dos filhos, além, é claro, de servir aos inconfessos desejos dos grupos econômicos de seguir na pilhagem do patrimônio do povo por meio das famosas privatizações.
São os mesmos grupos que mandam neste país desde sempre e que, a cada vez que vêm seus interesses ameaçados, rapidamente produzem levantes e golpes (militares ou parlamentares) que garantam meios para que sigam com suas medidas de concentração da riqueza e da renda nacional. Foi assim que se trouxe de volta a extrema pobreza e a fome aos lares de milhões de famílias brasileiras após o golpe contra Dilma em 2016.
Hoje, entretanto, o sucesso de um levante como esse poria em ruína todo o país. A comunidade internacional se fecharia para o Brasil. Viriam sanções econômicas, bloqueios financeiros e rejeição diplomática que colocariam o país em condição de penúria, à semelhança da Venezuela neste momento. E, como sempre acontece nesses casos, os pobres e vulneráveis pagariam a conta mais pesada da aventura golpista. Mas, diferente de outros tempos, toda a nação sofreria.
O papel das pessoas conscientes, dos democratas, da imprensa e dos operadores das instituições é, neste momento, combater os arroubos autoritários dos grupos bolsonaristas. É denunciar os propagadores de narrativas mentirosas que põem em dúvida a lisura da justiça e do sistema eleitoral brasileiro. Neste momento a República, a democracia e a vida econômica do Brasil estão em jogo. Defendê-las é defender nossas famílias, nossas casas e nossas vidas.