Com 700 associados, a Amoprex – Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes em Xapuri – foi criada em 1994 para representar, diante do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), através de Contrato de Concessão de Uso, cerca de 1.000 famílias moradoras da área da Unidade de Conservação que fica dentro dos limites do município de Xapuri, que é o detentor da maior fatia da reserva, com 300 mil hectares, o que representa 32,13% de seu território.
Prefeito de Xapuri por dois mandatos, o seringueiro Júlio Barbosa de Aquino ocupa atualmente o cargo de secretário-geral da Amoprex. No pequeno escritório da entidade localizado à rua Deocleciano Lago, bem próximo da casa onde Chico Mendes foi assassinado, em 1988, Aquino afirma, com um exemplar do Plano de Utilização da Resex na mão, que o legado do maior defensor dos trabalhadores rurais da Amazônia está ameaçado de ruir frente ao avanço da pecuária e da conjuntura política atual que, para ele, é completamente avessa à questão ambiental.
Atento ao que o noticiário nacional e internacional vem divulgando sobre a Amazônia, o companheiro do líder sindical que deu a vida e o nome em favor da Resex afirma que não é o gado quem ameaça o legado de Chico Mendes, mas a ganância de pecuaristas que estão no entorno da UC que, impulsionados pelo discurso dos governos federal e estadual, financiam o desmatamento e alugam pastagens dentro das colocações de seringa. Para ele, além de fomentar a devastação da floresta, o sistema de arrendamento que se estabeleceu entre pecuaristas e seringueiros é vantajoso apenas para o verdadeiro dono do gado: o fazendeiro.
“O gado é um problema, mas sempre fez parte da cultura do seringueiro. Sempre tivemos a nossa vaquinha de leite e o boi de carga. Daí o próprio Plano de Utilização da Reserva permitir a criação do gado dentro dos limites estabelecidos. Hoje a Resex vive esse problema porque não é mais o gado do seringueiro que está nas colocações. O gado que está lá pertence a quem já desmatou tudo o que tinha e que para continuar ganhando dinheiro está financiando o desmatamento, a cerca, o curral e o capim para colocar o gado dentro da colocação e depois tirar esse gado deixando quase nada para o seringueiro que ainda fica com o seu pasto degradado”, afirmou.
Barbosa chama a atenção também para a invasão da reserva por famílias sem nenhuma ligação com o que ele chama de “perfil extrativista”. Isso ocorre, segundo ele, por meio da compra de pedaços de colocações que são ilegalmente loteadas pelos próprios moradores. Ele diz que o resultado ainda não divulgado de um levantamento ocupacional feito recentemente pelo ICMBio é assustador. O último cadastro feito pelo órgão, em 2009, apontava a existência de 1.900 famílias extrativistas na Resex CM. Agora, ele crê que haja entre 2.500 a 3.000 famílias instaladas na UC, a maioria sem nenhuma relação com a história de luta que resultou na criação da reserva.
“Essas pessoas chegam aqui com a intenção de desmatar e de destruir o que resta de floresta nas colocações que são loteadas ilegalmente. O resultado disso são as queimadas que são produzidas pelo desmatamento para a formação de pastagens. Ninguém queima para plantar arroz, mandioca ou milho, as queimadas estão diretamente ligadas ao desmatamento para a expansão das pastagens”, explicou.
Júlio Barbosa afirma que a maior parte dos problemas que a Reserva Extrativista enfrenta se dão por conta da ausência de fiscalização e monitoramento. Segundo ele, o órgão criado para ser o guardião da Unidade de Conservação é inoperante. Com escritório estabelecido apenas em Rio Branco e contando com meia dúzia de fiscais e funcionários administrativos, O ICMBio não consegue cuidar de uma área de quase 1 milhão de hectares espalhados por sete municípios acreanos.
“Com relação ao ICMBio, nós estamos vivendo a pior situação porque os técnicos e analistas ambientais do órgão sempre tiveram muitas dificuldades de trabalho por falta de estrutura. Até mesmo as reuniões do Conselho Deliberativo são um deus nos acuda para acontecer em razão da falta de recursos. Então, nesse momento em que o governo federal busca a qualquer custo fragilizar todas as políticas voltadas para a questão do meio ambiente e da sustentabilidade, como é o caso do Conama, que é um órgão importantíssimo para a regulamentação das leis seja no plano federal, estadual e municipal, não podemos imaginar que o ICMBio vá conseguir dar conta de uma reserva como é a Chico Mendes”, concluiu.
Procurada pela reportagem, a Coordenação Regional do ICMBio no Acre (CR1) nos informou por meio de duas funcionárias que, para a obtenção de qualquer informação a respeito da atuação do Instituto, o único caminho é a solicitação via documento oficial à direção do órgão em Brasília. Quanto à concessão de entrevistas, a informação foi de que os servidores do ICMBio, inclusive o coordenador, Tiago Juruá, são orientados a atender pedidos da imprensa apenas com “autorização hierárquica”.