Uma das primeiras pessoas que conheci quando me mudei para o Acre foi o Gladson Cameli. Vim a convite do empresário James Cameli para colocar no ar a Juruá FM, de Cruzeiro do Sul, em 2003. A minha missão era estruturar a programação e a parte comercial da emissora. Eu acabava de sair de uma campanha política “pesada” em Brasília, em 2002, e as minhas ligações espirituais com o Santo Daime me levaram à região do Vale do Juruá onde acabei conhecendo alguns jornalistas. Nesse movimento surgiu o convite de ajudar a estruturar uma rádio na Amazônia. Eu aceitei o convite pensando que permaneceria alguns meses e depois voltaria para o Rio de Janeiro. Na época pensei que seria uma boa experiência passar um tempo vivendo na Amazônia real. Sem falar que o Juruá, em 2003, ainda era um lugar bem isolado, e isso me atraía.
Então quando cheguei de mala e cuia para cumprir a minha missão, no primeiro dia, ainda hospedado num hotel, fui dar uma volta por Cruzeiro. Nessa noite conheci um jovem agitado e falante. Se apresentou pra mim como primo do James e logo emendou: “Soube que você trabalhou como marqueteiro em campanhas políticas. Pois saiba que vou ser político,” disse ele. E completou: “Serei governador do Acre”. O jovem, bonito e bem arrumado, falou tudo isso antes de eu falar qualquer palavra. Por dentro dei risada e pensei: “Mas que ousadia desse rapaz. Ele deve pensar que é fácil ser governador”.
O Gladson morava em Manaus com os pais, mas estava sempre em Cruzeiro do Sul. Quando vinha, me procurava pra conversar. Sempre sobre política. A Juruá FM virou uma febre na região e campeã de audiência. A gente fazia rádio como se fosse televisão. O jornalismo era o carro chefe da emissora. Assumi por falta de opções o comando de um programa ao meio-dia, o Juruá Música e Informação. A comunicação direta com as comunidades rurais e urbanas do Juruá transformou o noticiário num sucesso. Nessa época o Governo do Estado estava na mão de Jorge Viana (PT). O PT tinha todas as cartas e o poder, mas o Juruá era o Calcanhar de Aquiles do partido. A memória viva do ex-governador Orleir Cameli era um empecilho para o PT imperar na região. O Juruá era de oposição. Tanto que a FPA nunca conseguiu eleger um prefeito no município. Mesmo retirado da política Orleir era uma ameaça silenciosa para os “companheiros”.
Vida que segue, e um dia Gladson me comunicou, em 2006, que seria candidato a deputado federal. Foi uma verdadeira “guerra” dentro da família. Muitos não queriam o jovem rico que tinha tudo e um provável futuro como empresário bem sucedido metido na política. Os anos no Governo trouxeram muito sofrimento para a família Cameli. Orleir não queria nem mais ouvir falar nisso. Nas minhas conversas com o ex-governador ele sempre destacava as “injustiças” que tinha sofrido. E não se escusava também de falar dos seus erros como governador. O principal deles a que sempre se referia era a escolha do seu secretariado. Não vou publicar o que Orleir me falava por respeito à sua memória e para não ofender alguns personagens que ainda transitam pela nossa política. Mas tem gente que vive evocando o nome do ex-governador e que não tinha o menor apreço dele. Aliás, são vários.
Gladson se elegeu deputado federal. Com poucos meses depois de assumir, um dia, em Brasília, me confidenciou que não era aquilo que queria. Estava decepcionado. Mas o jovem parlamentar insistiu, venceu os seus medos e limites.Tanto que, em 2010, concorreu à reeleição e foi um dos três mais bem votados o Estado. No segundo mandato de deputado federal acredito que Gladson começou a formular a sua estratégia para realizar o seu sonho de ser governador. Passou a fazer política. Se afastou da FPA comandada pelo PT e assumiu a presidência do PP. Usou conscientemente o Parlamento para o seu objetivo maior. Fez o seu melhor mandato como deputado federal tendo sido o parlamentar acreano que mais liberou verbas para as prefeituras no Estado.
Um dia, recém eleito deputado federal, Gladson me contou numa entrevista: “Na próxima eleição ou concorro ao Senado ou vou largar a política”. E assim aconteceu. Em 2014, Gladson foi eleito com a maior votação já dada a um político acreano em todos os tempos. Assumiu a cadeira como o senador mais jovem da história do Senado. Paralelamente preparava a família psicologicamente para o seu próximo passo na política e andava o Estado inteiro conversando com as pessoas. Gladson criou foco para realizar o seu sonho.
Os seus primos me contaram que quando Gladson ainda era criança arrumou um microfone. Então juntava todos no seu quarto e em cima da cama discursava como um político. Acredito também que a posse do seu tio Orleir, em 2005, no Palácio Rio Branco, teve enorme impacto sobre ele. Era aquilo que queria ser um dia. Hoje sei que Gladson não abandonou um momento sequer a sua meta. Não traiu o seu sonho. Tudo que fez na vida era pra chegar ao momento que acabou acontecendo no dia primeiro de janeiro de 2019. Colocar a faixa de governador e comandar o seu Estado de nascimento.
Fazendo a cobertura jornalística da sua posse, justamente para a TV e Rádio Juruá, pude observar várias vezes o novo governador emocionado, olhos mareados e o choro contido. Gladson realizou o sonho e nisso se torna um exemplo humano de perseverança e determinação. Muitos vão dizer que a fortuna da família facilitou o processo. Mas isso não é verdade. Mesmo porque Gladson teve que enfrentar muitas vezes o descrédito da própria família. E quanto políticos ricos não conseguiram chegar a um cargo político pretendido? Se o Gladson vai fazer um bom ou mal Governo já são outros quinhentos. Tudo vai depender da competência da equipe que escolheu e do seu próprio comando.
Mas é inegável e admirável a sua luta, se superando muitas vezes, para realizar o sonho de ser governador. Esses dias estive conversando com ele e até mesmo a sua impaciência e ansiedade estavam bem mais controladas. Acredito por ele sentir que chegou onde queria. E também da consciência que para o sonho se completar totalmente precisa fazer uma ótima gestão para sair nos braços do povo.
Também penso que o PT subestimou o Gladson e a herança política deixada pelo seu tio Orleir Cameli. Os erros cometidos pelos petistas, a maioria calcados na arrogância, deixaram os caminhos abertos para Gladson ganhar com tranquilidade as eleições governamentais de 2018.
Agora, chega de sonho porque a realidade social dos acreanos baterá na porta do novo governador. Será preciso ainda mais determinação para poder levar bem-estar e qualidade de vida à população do Acre. Mas acredito que muitos poderão se surpreender com o jovem governador. Não vai jogar fora aquilo que lutou tanto para conquistar. De fora, como jornalista, cronista, e uma pessoa que aprendeu a amar profundamente o Acre só posso desejar muita sorte para o Gladson Cameli por saber que o seu sucesso, agora, no cargo de governador empossado, representará a melhoria de vida de todos os acreanos e acreanas.