A disputa de 2018 será a primeira eleição geral em que a doação de dinheiro por grandes empresas privadas a partidos e candidatos estará vetada. Será permitido apenas contribuições de pessoas físicas, mas empre respeitando um teto. O maior volume de dinheiro será o do Fundo Eleitoral. Na teoria, cada centavo usado na campanha estará devidamente controlado pelas autoridades.
Essa nova regra acaba com uma das principais marcas de pleitos passados: o altíssimo custo para se pagar marqueteiros que desenvolviam campanhas publicitárias estrondosas, barulhentas. Com isso, fica evidente que a propaganda eleitoral no rádio e na TV perderá ainda mais força, numa época em que a maioria das pessoas já não assiste TV aberta.
Com isso, a tendência é que as redes sociais ganhem ainda mais força na estratégia de marketing eleitoral dos candidatos. Esse novo cenário deixará os políticos mais sujeitos a críticas e opiniões do eleitorado, que se sentirá mais seguro para tal postura atrás da tela de seu smartphone ou tablete.
Essa é a análise do jornalista e especialista em mídias sociais Bruno Cássio. Nessa entrevista concedida via e-mail, Cássio avalia o papel que as redes sociais vão desempenhar na eleição de 2018.
Ele ainda alerta sobre os riscos da proliferação das notícias falsas – as fake news – e afirma que o eleitor precisa estar atento ao que lhe é enviado e que depois pode vir a compartilhar.
“Os eleitores/internautas estão mais observadores, e um simples comentário negativo pode gerar uma crise sem a possibilidade de mensuração do alcance desse conteúdo”, avalia ele.
Na avaliação de Bruno Cássio, não adianta somente o político “comprar” seguidores para suas páginas, passando a impressão de serem populares na internet. A qualidade daquilo que será publicado deve vir em primeiro lugar.
“Um conteúdo de qualidade, com informações corretas e clareza em sua redação, será sempre compartilhado por um maior número de pessoas e, por consequência, o número de seguidores aumentará.”
Leia a entrevista a seguir
ac24Horas: Em uma eleição em que a influência do dinheiro estará teoricamente reduzida por conta do fim das doações de empresas, qual será o papel das redes sociais por parte dos candidatos?
Cássio: As redes sociais terão papel decisivo. Só para se ter uma ideia, segundo dados de 2016, divulgados pelo IBGE, 116 milhões de pessoas, o equivalente a 64,7% da população brasileira com idade acima de 10 anos, estão conectadas à internet no país. Ainda de acordo com o IBGE, o celular ainda é a principal forma usada para acessar a internet no Brasil, ou seja, 94,6% dos internautas usam o aparelho para realizar conexão com o ambiente virtual. Apesar de nas regiões Norte e Nordeste os índices estarem abaixo da média nacional, é inegável a presença de smartphones conectados à web na rotina das pessoas. Os eleitores utilizarão cada vez mais a internet como forma de monitoramento e comparativo entre os candidatos. Por outro lado, há um grave problema que pode atrapalhar o processo eleitoral, as chamadas fake news, geralmente massificadas por meio de robôs (bots) ou de grupos de aplicativo de mensagens instantâneas (WhatsApp). Em debate recente realizado pelo Tribunal Superior Eleitoral, representantes do Facebook relataram as ferramentas usadas pela plataforma para inibir a publicação de notícias falsas. O Facebook é um dos mais acionados pela Justiça por conta de publicações inverídicas produzidas por seus usuários. Um dos pontos apontados como positivo, incorporado pela legislação eleitoral, é a identificação do conteúdo considerado falso por meio da URL (endereço virtual) da postagem, isso permite a exclusão específica da informação, sem prejuízo para a página que gerou esse dado, e, assim, a preservação da liberdade de expressão. É importante que o eleitor perceba que o(a) candidato(a) deve utilizar uma página e não um perfil pessoal para realizar campanha eleitoral, e que a palavra “patrocinado” evidencia que aquele conteúdo é pago e de responsabilidade do autor/administrador da página. A mesma lei eleitoral que inibe a propaganda de rádio e de TV, às véspera das eleições, permite que os candidatos façam campanha virtual paga até mesmo no dia da eleição. Portanto, saber usar essas ferramentas com consciência e ética, trará benefícios para os eleitores e para os bons candidatos.
Qual deve ser a melhor estratégia aos políticos para que, ao invés de atrair a antipatia, ganhe a simpatia do eleitor nas redes sociais?
Cássio: O Brasil vive um momento de polarização de forças políticas. E dentro desse contexto, a descrença com a política, ou até mesmo a revolta com o sistema político, tem afastado muitos cidadãos do debate saudável de ideias. Nas redes sociais virtuais o que se vê, quase que diariamente, é a troca de ofensas entre defensores de partidos políticos, ao invés da discussão sobre quais são os pontos fortes que possam levar ao convencimento da mudança de pensamentos e até mesmo a conquista da simpatia dos que pensam diferente.
A estratégia mais eficaz, e talvez a mais difícil, é demonstrar sinceridade na hora de falar das suas habilidades e competências para atuar como legislador(a) ou gestor(a) público(a). Apresentar opiniões sobre temas considerados polêmicos, respeitando as diferenças de credo, religião, cor, raça e gênero. Ao invés de dirigir ataques pessoais aos seus opositores, concentrar-se no convencimento do eleitorado a partir da divulgação das suas plataformas de mandato. Responder com cordialidade aos comentários públicos e mensagens enviadas no modo privado, mesmo que essas não tragam opiniões parecidas com as do(a) candidato(a). Orientar os assessores que trabalham na campanha a não emitir opiniões pessoais que possam gerar um conflito com as propostas defendidas pelo(a) candidato(a). E, por fim, ter a convicção de que a internet é um tribunal virtual, onde qualquer palavra mal colocada, ato não condizente com a legalidade ou mesmo comportamentos não adequados com a função pública que se deseja ocupar, podem colocar em risco uma candidatura.
O que terá mais peso: uma campanha publicitária bem produzida para os meios tradicionais (TV e rádio) ou as redes sociais?
Cássio: A legislação eleitoral restringe o tempo de campanha dos candidatos em rádio e em TV de acordo com a representatividade dos seus partidos na Câmara dos Deputados, ou seja, para obter mais tempo nos meios tradicionais serão levadas em consideração as coligações partidárias. No caso de partidos que não tenham tanta representatividade na Câmara, a internet acaba sendo um fiel da balança, uma ferramenta que iguala as condições de disputa. O horário eleitoral gratuito no rádio e na TV começará no dia 31 de agosto. Até lá os candidatos poderão definir uma estratégia de formato do material publicitário que pretendem utilizar, que deve ser diferente para cada meio de comunicação. Nas redes sociais o conteúdo é, em tese, mais dinâmico, interativo e com apelo de compartilhamento instantâneo por parte do internauta. Já nos meios tradicionais, os eleitores geralmente não param diante da TV ou do rádio para ver e ouvir as propostas dos candidatos, o investimento em conteúdo de qualidade, sem a dramatização da realidade, com depoimento de pessoas notoriamente respeitadas pela população, pode atrair a audiência. Mas as redes sociais estarão sempre mais próximas aos eleitores, no bolso, nas ruas, no local de trabalho, na escola, para onde eles levarem seus celulares, tablets e notebooks conectados à internet. Os aplicativos de mensagens instantâneas, como o WhatsApp, ganham peso durante a campanha eleitoral. Os candidatos que souberem utilizar essa ferramenta sem aparentar invasão de privacidade, com linguagem objetiva e com criatividade, tendem a ter bons resultados com os eleitores, caso contrário, eles podem ter seus números bloqueados e a experiência negativa ser compartilhada com todos do seu círculo familiar e de amizade.
O mais importante será ter números (grande quantidade de seguidores) ou qualidade (bom engajamento)?
Cássio: Já está comprovado e pode ser checado em vários anúncios na internet, nem sempre o número de seguidores condiz com a realidade. Várias são as empresas e aplicativos que oferecem a possibilidade de compra de seguidores. Os eleitores podem perceber isso facilmente, basta observar o teor dos comentários, que quando partem de seguidores comprados, geralmente se apresentam como mensagens repetidas. O ideal é que o alcance da mensagem dos candidatos fosse avaliado pelo engajamento orgânico, ou seja, a quantidade de curtidas e compartilhamentos de postagens que não foram patrocinadas/pagas. Nos casos do Facebook (fanpage) e do Instagram (perfil comercial) uma série de métricas é apresentada aos administradores. A partir delas, é possível ter a certeza dos temas que geraram mais interesse e, portanto, mais engajamento. O horário de postagem apontado por especialistas como sendo o mais aconselhado durante a semana seria das 10h às 15h (basta perceber qual é o horário que aquele seu(ua) YouTuber preferido(a) costuma lançar vídeos novos). Especificamente o Facebook, que mudou seu algoritmo, priorizando a aparição de postagens de parentes e de amigos na sua timeline, ao invés de postagens de páginas comerciais, é hoje a rede social que representa maior desafio para os que trabalham com o marketing eleitoral. Um conteúdo de qualidade, com informações corretas e clareza em sua redação, será sempre compartilhado por um maior número de pessoas e, por consequência, o número de seguidores aumentará. Os eleitores ou simpatizantes irão, a partir daí, relacionar essas páginas aos seus feeds (assuntos preferidos ou conteúdos mais curtidos pelo internauta).
Qual a melhor forma de avaliar o sucesso ou o fracasso de uma página de político?
Cássio: O número de curtidas e de compartilhamentos orgânicos, a partir de postagens não pagas, é um dos fatores que podem indicar o êxito de uma campanha eleitoral. A conquista da credibilidade no ambiente virtual seria um outro ponto. Os candidatos deverão ter em mente que serão cobrados no futuro, caso sejam ou não eleitos, por todos os seus posicionamentos apresentados nas redes sociais virtuais. Os eleitores/internautas estão mais observadores, e um simples comentário negativo pode gerar uma crise sem a possibilidade de mensuração do alcance desse conteúdo. Por trás das telas, os internautas se sentem mais seguros para apontar falhas e opinar sobre esse(a) ou aquele(a) candidato(a), quem não souber lidar com opiniões contrárias, não será eficiente na comunicação com o eleitorado. Uma dica para os eleitores, principalmente aqueles que usam os aplicativos de mensagens instantâneas, é checar as mensagens que são compartilhadas. Atualmente, existem vários serviços (nos próprios portais de notícias) e agências que fazem esse trabalho. Uma dessas agências, a pioneira no Brasil, é a agência Lupa <http://piaui.folha.uol.com.br/lupa>. Nela, os internautas podem checar a veracidade das notícias por meio dos seus links. Chequem, apurem e só compartilhem conteúdos que vocês têm certeza.