Certamente a vice-governadora Nazaré Araújo (PT) será uma das protagonistas nas eleições de 2018. Indiferente do cargo que irá disputar. Atualmente como um dos quatro possíveis nomes do PT para a disputa do Governo do Acre, Nazaré avalia o momento político atual e revela o “pavor” que sente de um retrocesso democrático no país. Afinal, sentiu na pele os efeitos da Ditadura Militar que perseguiu seu pai, José Augusto, o primeiro governador eleito do Estado, pelo antigo PTB, cassado depois do golpe de 64.
Com origem numa família enraizada na política acreana, a sua mãe, Maria Lúcia Araújo, foi deputada federal pelo Acre durante a Constituinte de 1988. E o seu irmão, Ricardo Araújo (PT), vereador da Capital e secretário municipal. Nazaré teve uma brilhante carreira na Procuradoria Geral do Estado e alcançou o cargo mais alto da carreira, quando foi procuradora do Governo de Binho Marques (PT), de quem foi uma colaboradora entusiasmada.
Com esse histórico familiar e a sua experiência de vida, Nazaré acredita que se um dia chegar a governar o Estado, poderá colocar em prática a sua visão de uma gestão humanista voltada para os mais humildes. Numa clara alusão de seguir os passos e ideais paternos de José Augusto que, em apenas um ano de Governo, tentou fazer a reforma agrária no Estado e criar um banco de fomento para financiar os camponeses do interior para uma distribuição de renda mais justa.
Nessa entrevista exclusiva ao AC24horas, Nazaré comenta ainda a polêmica que se viu envolvida quando seu nome apareceu numa questão da prova do concurso da Polícia Militar. Avalia as chances de vitória do PT para o Governo em 2018. E, com bom humor, comenta a comparação que lhe é feita com a primeira dama do país, Marcela Temer, que virou assunto da imprensa e das redes sociais, por ter sido chamada de Bela e Recatada do Lar pelo marido, presidente Michel Temer (PMDB). Confira a entrevista.
ac24horas – A eleição de 2018 é vista com a tábua de salvação para os problemas políticos que o Brasil atravessa. Como a senhora avalia esse quadro e em qual posição se coloca nele? Pretende ser candidata?
Nazaré Araújo – Em meados de 2015 dei uma entrevista pra você sobre a crise política e a proteção à nossa democracia. Lembro que falei dos 30 anos de vivência democrática do nosso país e que a nossa democracia ainda era uma planta frágil. O ano passado, 2016, foi muito longo. Parecia que não queria terminar. Tivemos situações muito graves no Brasil. Mas a gente vê, nesse momento, as pessoas se preocupando com a política que é uma ciência maravilhosa. Sou filha de um professor de filosofia que pensou a política de uma maneira grande. Já com ideias avançadas como as reservas extrativas para empoderar as pessoas que moravam no interior do Acre. A política é a arte da convivência com os contrários para se achar pontos em comuns de convergência que podem ajudar a nossa sociedade a avançar no seu desenvolvimento social e econômico. Eu vejo uma antecipação do processo de 2018. A crise da política e econômica está tão forte que as pessoas imaginam como poderão ter um futuro melhor. Colocam todas as suas esperanças na próxima eleição. Nós temos que saber superar essa crise. O nosso país é imenso tanto no seu território quanto nas possibilidades. Com toda essa crise ainda somos a sétima economia do mundo. Então nós somos fortes. Basta que a gente tenha um projeto para o futuro para atuar nos grupos que fazem a política para chegarmos numa convergência capaz de mudar essa realidade que está fazendo milhões de pessoas sofrerem.
ac24horas – E qual o papel que a senhora espera desempenhar na próxima eleição?
NA – Eu me imagino como pessoa que tem uma raiz forte na política acreana. Que tenho um preparo de tudo que vivenciei e estudei como procuradora do Estado. A minha família sempre buscou o melhor para as pessoas desde a origem do nosso Estado. Acredito num manto de proteção à nossa floresta, mas que também possamos utilizá-la para o nosso desenvolvimento. Na FPA, estão colocados quatro nomes para a disputa do Governo, como pré-candidaturas, entre eles o meu. Mas vivemos um tempo de muitas incertezas. Às vezes, as pessoas me perguntam se serei candidata, em 2018, e respondo: “você tem tanta certeza que as eleições serão em 2018?” Temos que pensar sobre isso.
ac24horas – A senhora acha que pode haver algum tipo de ruptura democrática daqui para 2018? Que possam cancelar as eleições?
NA – Podem também antecipar como alguns grupos políticos defendem. Outros dizem que haverá um adiamento. Mas a gente procura imaginar um tempo em que as instituições vão buscar a sua convergência e o seu equilíbrio para que a gente chegue ao processo de 2018. Para não ver homens públicos importantes, como vimos em 2016, dizendo que a presidente Dilma (PT) não cometeu o crime das “pedaladas fiscais”, mas que não tinha mais condições políticas para governar. Isso foi uma afronta ao processo constitucional. A gente tem visto acontecer coisas muito estranhas. Como profissional do direito fico chocada com as conduções coercitivas ilegais e esse espetáculo midiático que acontece diariamente.
ac24horas – A senhora se refere ao Judiciário?
NA – Não só ao judiciário. Mas a utilização dos 15 minutos de fama, de declarações que podem ter repercussão em várias instituições. A gente, viu aqui no Acre, acontecerem processos em que nada se comprovou. Mas a honra e a vida das pessoas ficaram comprometidas.
ac24horas – A senhora se refere à operação G7?
NA – Sim! É preciso ter cuidado com a honra das pessoas. Eu passei um processo desses na minha família com o meu pai. Se alguém pegar as declarações da ABIN (Agencia Brasileira de Inteligência) sobre o que consta do meu pai e da minha mãe verá coisas terríveis. Se não os conhecesse até eu acreditaria. Temos que ter cuidado nesses momentos de instabilidades porque uma notícia plantada na imprensa ou na rede social pode causar um estrago muito grande.
ac24horas – O quê a senhora acha melhor nesse momento? O presidente Temer continuar e fechar esse ciclo até as eleições em 2018? A antecipação das eleições? Ou outra alternativa?
NA- A antecipação das eleições seria a melhor saída para a nossa sociedade. Uma maneira de ouvir a voz da população através do voto.
ac24horas – O PT considera que o impeachment da presidente Dilma foi um golpe parlamentar. Nesse caso, a antecipação das eleições, também não seria outro golpe contra a Constituição Brasileira?
NA- Não porque a gente poderia colocar esse processo da antecipação na mão do Congresso Nacional. Assim como resolveram aplicar o impeachment admitindo que não gerou a punibilidade à Dilma, que é contraditório. Estamos vivendo um tempo de exceção. Veja que o presidente Temer acabou com os ministérios ligados as áreas humanitárias. Responsabilizou a busca da justiça social daqueles que estão sendo prejudicados pela nossa sociedade que já praticou a escravidão e a exploração humana. Veja o que aconteceu na Reforma Trabalhista. Foi fácil fazer a modificação da CLT que tinha pouco mais de 50 anos de existência. A gente precisa usar propostas para encontrar saídas. Se a renovação de uma matriz política do Congresso poderá dar mais uma chance de esperança acredito que possa fazer a modificação. Já fizeram tantas interpretações da Constituição e essa poderia ser mais uma. Atualmente no Brasil precisamos renovar a força da democracia representativa que se expressa nos movimentos sociais.
ac24horas – Mas a senhora não acha que nos movimentos sociais, principalmente, nos sindicatos há uma contaminação política partidária?
NA- Nós temos muitos sindicatos no Brasil. Uma quantidade exarcebada, mas os movimentos sociais não se realizam só pelos sindicatos. A organização das categorias sim, mas temos outros movimentos que partem de associações e representações de mulheres, negros, homossexuais, indígenas, etc.
ac24horas – Mas algumas dessas instituições também estão contaminadas pela política partidária. Pegando as associações de moradores em Rio Branco, como exemplo. A gente vê que a maioria das representações estão vinculadas ao PT.
NA- Acho que nem todas elas. Mas veja bem, o trabalhismo é uma grande matriz de ideologia e de defesa do pensamento. Isso no Brasil é uma coisa difícil. A força do trabalhismo é anterior ao PT. As organizações partidárias podem convergir ideologias de movimentos sociais que também fazem a gestão de pessoas. No Brasil, ainda temos um grave problema de concentração de renda. Essas organizações de movimentos sociais e partidárias que são ligadas aos trabalhadores ou as classe menos favorecidas podem ter a convergência de pessoas que podem estar em partidos políticos ou em associações. O importante é termos liberdade para praticar o associativismo. As pessoas desses movimentos precisam ser livres para terem partidos. A questão que nos afeta é de como vamos trabalhar processos de organização e de políticas públicas que atendam ao máximo de pessoas. Não podemos pensar num governo que vá atender as reivindicações de apenas 40 milhões de pessoas com uma massa de desfavorecidos excluídos que precisam ser assistidos. Se queremos trabalhar uma sociedade da paz, livre da violência, precisamos dar o acesso à saúde, à educação e à justiça social, porque no Brasil, durante muito tempo, houve um descaso com essas questões.
ac24horas – Voltando para o Acre. Se a chapa Temer-Dilma não for cassada e tivermos eleições em outubro de 2018. A senhora é um dos quatro nomes colocados pelo governador Tião Viana (PT) para sucedê-lo. Se for indicada a senhora aceitaria e gostaria de concorrer ao Governo?
NA – Eu gosto muito mandato que a população do Acre me deu. Acho que é uma grande honra ser vice que, por vezes, também assume o Governo. Além de ser vice tenho a possibilidade pensar políticas públicas para serem desenvolvidas junto com o governador Tião Viana. Na minha profissão de procuradora a gente ajuda governantes a governar. O governar é uma missão, uma honra, e uma oportunidade de colocar em prática aquilo que se tem como ideário de um grupo político. A FPA vai buscar o melhor caminho no enfrentamento político de 2018. Veja quanto se debate a questão do PT e da FPA, mas temos quatro nomes fortes disponíveis e podem surgir outros. Isso é muito bom. Chegar numa época dessas com tantos desafios e tropeços e ter quatro nomes com história. O Daniel Zen (PT), um jovem, que tem um histórico familiar e uma vivência política muito forte. O Emylson que faz o combate na questão da segurança com a população. O Marcus Alexandre (PT) que acabou de passar por um processo eleitoral, em 2016, e se tornou uma liderança reconhecida nacionalmente. E eu estou junto com o governador fazendo acontecer políticas públicas importantes para o Estado. O Acre, no ano passado, mesmo com todas as crises conseguiu manter o nível de empregabilidade. Quando a gente vê os estados grandes que mal estão conseguindo pagar salários dos seus funcionalismos enquanto nós estamos entregando lanchas e automóveis que irão facilitar a educação na zona rural. Acho que antes de se discutir nomes é preciso uma agenda de valores para ser debatida. Eu me sinto bem em estar nesse processo ao lado de nomes tão valiosos.
ac24horas – Se o seu nome não for o escolhido a senhora teria outras alternativas. Ou seria vice novamente, o Senado ou uma candidatura a deputada federal. Em quais dessas três posições a senhora acha que poderia dar a sua contribuição?
NA – A gente tem uma discussão partidária posta e o movimento de mulheres que me apoia. Mas eu gosto de fazer política. A posição que a FPA imaginar a minha participação estarei disponível. São caminhos que a gente tem que pensar. Mas o que está posto no momento é o debate do meu nome para o Governo
ac24horas – A senhora teve o seu nome envolvido numa questão da prova para a Polícia Militar. Alguns setores da política entenderam como a projeção do seu nome para a disputa de um cargo, em 2018. Como a senhora avaliou esse acontecimento?
NA – Para mim foi uma surpresa. As provas não são elaboradas por pessoas do Governo, mas por uma empresa. Eu imaginei que essa questão estivesse ligada ao conhecimento da atualidade, ou a questão de gênero. Não sei exatamente o que originou essa questão. Não posso imaginar o que passa na cabeça de quem está elaborando uma prova. Certamente não foi para dar qualquer tipo de divulgação para 2018. Isso é uma coisa muito pequena.
ac24horas – A senhora acha que o seu trabalho como vice-governadora está sendo bem divulgado pela equipe de comunicação do Governo?
NA – (risos) Essa pergunta eu faço para você que é jornalista. Eu trabalho com questões que não são fáceis porque não dizem respeito só a uma postura das políticas públicas. Elas afetam como um todo a nossa sociedade. Quando a gente fala da droga-adição num Estado fronteiriço com países produtores de drogas, então, é uma coisa que envolve as famílias, as comunidades, o pertencimento do ser humano. Vivemos numa sociedade que pretende limpar o local e não atender a necessidade das pessoas excluídas. Isso é alguma coisa para ser trabalhada de maneira mais ampla e não só a própria a pessoa em situação de risco. Nós, como sociedade, geramos esse tipo de problema. Não sei analisar o quanto esse trabalho é divulgado. É colocado na Agencia de Notícias do Governo, mas, muitas vezes, não é o suficiente para provocar uma mudança na visão dentro da comunidade. Se a gente fizer um trabalho forte de planejamento familiar, de gravides na adolescência e da primeira infância, em todos os municípios do Acre, acredito que terá repercussão nas comunidades.
ac24horas – Foi esse trabalho que lhe valeu o convite para fazer um curso em Harvard, uma das mais importantes universidades do mundo?
NA – Sim. O trabalho da primeira infância que iniciamos com a equipe das secretarias de saúde e da assistência social. Na verdade ninguém está inventando a roda. Harvard tem um núcleo de estudos de ciências pela primeira infância. Lá se coloca a capacidade despertada nas crianças quando recebem um abraço, um carinho, um olhar dos pais ou do adulto de referência.
ac24horas – A senhora considera que nesse cargo de vice-governadora está tendo espaço para exercer o seu conhecimento?
NA – Acredito que sim. Tenho muito apreço pela liderança humanística do Tião que garantiu esse espaço para uma pessoa com o meu perfil. De fato me deu a oportunidade de liderar uma equipe junto com ele e colocar essas matrizes de trabalho em ação. E estar a frente de posturas de pessoas em situação de rua e droga-adição. Temos um grupo chamado “Todos pela Prevenção” em que trabalham pessoas da universidade junto com o reitor da UFAC, Minoru Kimpara. Instalamos um fórum permanente de combate à droga-adição. São realizados estudos chamados de “Mãos Dadas com as Comunidades”. Fazemos um outro trabalho de assistência psico-social dentro dos bairros com os CAPs. É uma rede faz as coisas acontecerem com uma dinâmica diferenciada, num tempo de muita crise econômica. Isso é possível graças ao aproveitamento dos recursos disponíveis.
ac24horas – Com todo o desgaste do PT, a nível nacional, a senhora acredita que o partido possa vencer novamente a eleição ao Governo no Acre? Os 20 anos de governos da FPA não seriam um impeditivo?
NA – Aquilo que não te mata te faz mais forte. Há três anos o PT vem sofrendo um massacre na mídia. E o partido se mantém com níveis de filiação excelentes. Quando olhamos as pesquisas, as lideranças do PT estão sendo reconhecidas aqui no Acre. O PT e a FPA têm um trabalho de construção de uma identidade para o nosso Estado que dignifica as pessoas. Temos saldos positivos em relação ao atendimento das pessoas. A eleição, em 2016, na Capital, onde vive metade da nossa população, reconheceu o trabalho que foi feito pelo PT ao longo do tempo. Na região Norte temos os prefeitos do PT reconhecidos pela Unicef como amigos das crianças. Em 2018, os nomes postos pela FPA para o Governo e o Senado estão muito bem colocados.
ac24horas – Para gente concluir. O colunista Luiz Carlos Moreira Jorge costuma se referir a senhora como a bela e recatada do lar. Como a senhora entende essa expressão?
NA – Outro dia encontrei com o Luiz Carlos e disse: “ainda bem que você não diz que eu sou feia (risos)”. Esse é o espírito de cronista do Luiz. Eu sou como eu sou. Não adianta querer ser de outra forma. Sou uma pessoa serena que tive um passado bastante difícil. Venci algumas agruras geradas pela insegurança que a minha família enfrentou em relação a Ditadura Militar. Tenho uma percepção da política, sou muito firme com os meus interesses, mas sou muito suave com as pessoas. É assim que sou a bela e recatada, mas que não deixa de dizer o que quer dizer. Não acredito no grito, mas na construção de ideias. Reconheço aquilo que está no exercício do poder que é manter a ordem, as coisas funcionando, com uma postura firme na condução. A liderança deve ser construída. Por isso, acredito no processo de ouvir as pessoas, de pensar junto com elas a tomada decisão. Mas nunca deixarei de decidir.