A questão da incoerência é um dos destaque nas discussões, porque os estados ficam do lado da vítima, no processo de estupro, e depois ficam do lado da agressora, quando é o caso de cobrar pensão alimentícia para a criança.
Publicado por Fátima Burégio
Pense na seguinte situação: Um homem ser estuprado, a criminosa engravidar e a vítima ser condenada a pagar pensão à criança!
Não, não é um desvario, mas uma realidade.
Nos EUA, para evitar que o estado honre despesas com a sociedade, os tribunais estão decidindo exatamente assim.
Por mais esquisita que seja a medida, já é vigente naquele País, e traz consigo uma, por óbvio, indignação e descontentamento dos americanos.
Vale a pena você ler toda a matéria, tratando deste tema e de outros bem inusitados também:
As leis estaduais americanas que criminalizam as relações sexuais “consensuais” de mulheres adultas com menores como “estupro” estão sob fogo cruzado, por preverem penas consideradas excessivas e por suas incoerências.
Tais leis, chamadas statutory rape (estupro criado por lei), se baseiam na ideia de que menores são vítimas porque são incapazes de dar consentimento, pela idade.
A questão da incoerência é um dos destaque nas discussões, porque os estados ficam do lado da vítima, no processo de estupro, e depois ficam do lado da agressora, quando é o caso de cobrar pensão alimentícia para a criança.
Em outras palavras, o estado que se empenha em aplicar pena de prisão para mulheres acusadas de estupro, também buscam punir as vítimas que não pagam pensão alimentícia. Os estados fazem isso porque, se ninguém pagar pensão alimentícia à criança, eles terão de arcar com as despesas.
Segundo o jornal USA Today e o Jornal da ABA (American Bar Association), essas controvérsias só dizem respeito à parte das leis que tratam de estupros cometidos por mulheres, por terem relações sexuais com menores. Não há queixas em relação à parte da lei que pune o homem que estuprador de menores, dizem.
Romance proibido
A discussão sobre penas excessivas para mulheres esquentou depois que um juiz do Texas condenou a professora Alexandria Vera, de 24 anos, a 10 anos de prisão, por manter relações sexuais com um aluno de 13 anos, por vários meses. Ela deverá cumprir pelo menos cinco anos em prisão fechada, antes de ter direito à liberdade condicional.
No julgamento, o aluno testemunhou que a relação foi consentida porque eles se amavam. Por sua vez, os pais do garoto testemunharam que sabiam da relação e a apoiaram. Diversos alunos da escola testemunharam a favor da professora. Mas o juiz decidiu aplicar uma pena exemplar, para que outros professores não façam o mesmo.
A pena foi reduzida para 10 anos porque o juiz aceitou um acordo entre a mulher e os promotores, no qual ela confessou o “crime”, em troca de uma pena menor. Não fosse o acordo, ela poderia pegar pena que, segundo a lei estadual, seria de 30 anos à prisão perpétua, se condenada.
O caso serviu para os jornais recuperaram a história de Nick Olivas que, aos 14 anos, teve relações sexuais com uma mulher de 20 anos e a engravidou. Pela lei estadual do Arizona, semelhante às dos demais estados, ele foi vítima de statutory rape.
Aos 21 anos, ele ficou sabendo, por ação da Justiça, que o fruto daquela relação proibida era uma filha, já com 6 anos de idade. Em 2014, ele foi informado por um juiz que tinha de pagar pensão alimentícia à filha. Aliás, ele já devia US$ 15 mil em alimentos atrasados, que deveriam ser pagos com juros de 10%, e mais despesas hospitalares do parto.
Se não pagasse, iria para a prisão. Isso não aconteceu, porque a própria Justiça se encarregou de estabelecer um plano de pagamento, que incluiu bloquear parte de seu salário e de alguma economia que tinha no banco.
Entendimentos em conflito
Há algum tempo, os pais consideravam esse tipo de relação como a iniciação sexual dos filhos — e a celebravam. Mas os estados interferiram na prática. Criaram leis que, se analisadas no conjunto, mais parecem uma salada completa.
Alguns estados tornaram a prática um crime, com tipos variados de sentenças, com penas mais altas do que as aplicadas a outros tipos de crime. Outros a definem apenas como uma contravenção penal e a aplicação de pena alternativas. Alguns estados decidiram que a idade do consentimento chega aos 16 anos. Outros, aos 18 anos. Os psicólogos dizem que algumas pessoas têm mais capacidade de consentir aos 14 anos do que alguns adultos.
Alguns estados criaram uma lei chamada “Romeu e Julieta”, que reduz consideravelmente a pena, no caso dos dois serem menores. Alguns estados decidiram que só há crime se um dos dois for mais de três anos mais velho que o outro. Alguns estados não punem dois menores. A Califórnia decidiu que, se os dois forem menores, os dois são culpados e devem ser punidos.
No caso de Nick Olivas, a Justiça só foi atrás dele porque a mulher que o estuprou estava em dificuldades financeiras e pediu ajuda do estado para criar a criança. O estado a pressionou a contar quem era o pai. Uma vez que Nick Olivas foi identificado como pai, o estado moveu uma ação na Justiça para obrigá-lo a pagar a pensão alimentícia — e, com isso, evitar dar dinheiro à mãe.
Um tribunal chegou a enviar intimações a Nick Olivas, informando-o que tinha de comparecer à corte para determinar o pagamento de pensão alimentícia à filha. Ele não levou as intimações a sério, porque pensava que não tinha filha alguma.
Depois que descobriu que tinha uma filha, Nick Olivas assumiu a paternidade e começou a pagar pensão alimentícia. Mas ficou em dificuldades financeiras por causa dos atrasados que, na verdade, remontavam ao tempo em que ainda era menor de idade.
O juiz que presidiu o julgamento apresentou uma justificativa para isso. A vítima do estupro não vai dar dinheiro à mulher, mas à criança da qual é pai.