Editorial

Saúde Pública: a personagem e a vaia necessária

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Editorial ac24horas

Grave. Muito grave o que aconteceu no Pronto Socorro de Rio Branco na noite de sexta-feira (19). É necessário retirar do episódio diversas referências e dar a elas encaminhamento prático para que os erros jamais voltem a acontecer. Jamais. Aos fatos.


Primeiro é preciso falar o óbvio: ninguém vai a um Pronto Socorro por lazer. Quem está ali tem um motivo prático. Ou há urgência (quando o quadro clínico não é tão grave; necessita de rapidez, mas não tem risco de morte) ou há emergência (quando há risco de morte). E assim foi com os familiares do paciente Raimundo da Silva.


Na versão da família, o grupo já havia passado “toda semana buscando atendimento, indo à Upa e ao PS, sem diagnóstico conclusivo”. Opa! Já temos um problemão que não pode ser desprezado para entender o contexto do episódio. Embora, é bem verdade, não justifique tudo. Diante do agravamento do quadro clínico do Sr. Raimundo da Silva, hoje, a família informa que ele está na UTI do Hospital de Urgência e Emergência.


A família também lembrou da falta de acesso às informações sobre o quadro clínico. “Diante da falta de informações e do agravamento do quadro, a família estava aflita”, dizem. É natural. Então, em essência, o contexto é este. Uma pessoa idosa doente, sem diagnóstico fechado; as informações sobre o quadro clínico não fluindo à família. Esse roteiro, segundo familiares, durou uma semana. Essa é a cena.
Na sexta-feira à noite, familiares levaram o Sr. Raimundo, mais uma vez ao PS. Desesperados e sem informações seguras, tentaram forçar a presença em um setor restrito do hospital. E aí começou o conflito, a confusão em diferentes versões.


Policiais foram acionados para retirar os familiares do local que, por questões técnicas, é uma área restrita. Neste instante, os policiais agiram corretamente. Obedeceram a uma ordem. Eles estão ali para garantir o pleno funcionamento da unidade hospitalar, oferecendo segurança aos profissionais de Saúde, aos pacientes e até aos familiares.


Agora, imagine o leitor. Uma família cansada, estressada, tendo percorrido, durante toda semana, UPA’s e o próprio PS para tentar dar algum conforto em momento de dor e incerteza, com o pai doente e sem diagnóstico. Essa família ser retirada à força, posta para longe de alguém querido e agonizante, foi o que faltava para o conflito real. E foi, nesse momento, que os familiares passaram a perder a razão. Sobretudo quando um deles tenta pegar a arma de um dos policiais.


Quando isso acontece, a reação do profissional de Segurança Pública é automática. Sabedor da gravidade de possuir uma arma, o policial age pela lógica “ou vive o meu agressor ou viverá eu”. É assim diante de um criminoso. É assim diante de um trabalhador. É assim diante de qualquer pessoa que tenta lhe retirar o instrumento de trabalho letal. Esse episódio parece ser um daqueles em que cada personagem tem um bocado de razão, dentro de cada contexto em particular.


Mas há uma outra personagem que envolve a cena inteira e passa despercebida pelas análises mais apressadas. É uma personagem subjetiva, mas de uma força tremenda para se entender todo o enredo: a Saúde Pública. E vai assim de forma genérica mesmo. Porque não há como responsabilizar diretamente este ou aquele ator específico.


A Sesacre precisa repensar urgentemente a presença de policiais armados nas unidades de saúde. Leia com calma, apressado leitor. O editorial não está defendendo que as forças policiais sejam retiradas do ambiente hospitalar. Mas o que não parece razoável é que, nesses ambientes, tenham policiais com armamentos letais. Para quê? É preciso estar armado com instrumentos não letais. Associado ao sistema de monitoramento de câmeras e com algum dispositivo de comunicação, os policiais podem acionar grupamentos com mais recursos, caso seja necessário.


O que a direção da Sesacre tem que se incomodar é que familiares de um paciente tentaram garantir acesso à saúde ao pai e ficaram estendidos no chão, baleados. Foram três filhos feridos: um com gravidade, baleado no abdômen; o outro na perna. Um de 35 anos; outro de 32 e um jovem de vinte e poucos anos. Quem tem razão nessa arenga toda? É difícil dizer. As investigações ainda serão concluídas.


Mas se um veredicto pode ser antecipado, a Saúde Pública, certamente, merece vaia nesse ato dramático. Foi ela, feito um Iago maldito, que alimentou a discórdia toda até o desfecho fatal. Foi ela que conduziu o jogo dramático fazendo com que um trabalhador atirasse em outro; foi ela que fez crer a um trabalhador fardado e falsamente poderoso que atentasse contra outro trabalhador, desesperado e com o pai agonizante. Estamos nos matando por incompetência alheia. É preciso vaiar e responsabilizar quem merece.


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