O compositor Jards Macalé em participação no programa Que História É Essa, Porchat? - Reprodução/Reprodução/GNT
Morreu nesta segunda-feira (17), aos 82 anos, o músico Jards Macalé, cuja obra rompeu padrões e ajudou a modernizar a MPB. Ele estava internado no Hospital da Unimed da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, desde o último dia 1º, por causa de complicações pulmonares. Hoje, sofreu uma parada cardíaca em decorrência de uma infecção generalizada e de insuficiência renal.
A morte foi confirmada pela equipe do artista em suas redes sociais. “Jards Macalé nos deixou hoje. Chegou a acordar de uma cirurgia cantando Meu Nome É Gal, com toda a energia e bom humor que sempre teve. Cante, cante, cante. É assim que sempre lembraremos do nosso mestre, professor e farol de liberdade. Agradecemos, desde já, o carinho, o amor e a admiração de todos. Em breve informaremos detalhes sobre o funeral”, escreveram no perfil.
Ao longo de suas seis décadas dedicadas à música, Macalé fez parcerias com poetas como Waly Salomão (1943-2003), Vinicius de Moraes (1913-1980), Torquato Neto (1944-1972) e José Carlos Capinan. Foi o autor de clássicos como Anjo Exterminado, Hotel das Estrelas, Mal Secreto e, principalmente, Vapor Barato, clássico na voz de Gal Costa (1945-2022) que foi regravado com sucesso pelo grupo O Rappa.
Nascido em 1943, Macalé iniciou sua carreira musical na década de 1960, quando desenvolveu afinidade instantânea com Nara Leão (1942-1989), chegando a acompanhá-la ao violão em shows. A artista havia rompido com o estilo vigente na época e unido a bossa nova à música dos morros.
Jards Macalé rapidamente se destacou pela postura diferenciada e por rejeitar padrões comerciais, optando por sons que causavam estranheza e davam vazão à liberdade criativa e à experimentação sem amarras. Com isso, ganhou o epíteto de “anjo torto” da MPB.
Durante o período de exílio político de vários artistas, Macalé esteve em Londres com Caetano Veloso, Gilberto Gil e Jorge Mautner. Nesse período, atuou como diretor musical do álbum Transa, considerado um dos trabalhos mais importantes da carreira de Veloso. Foi Maria Bethânia quem o avisou, durante o Carnaval em Salvador, que Caetano ligaria de Londres para convocá-lo a reunir uma banda e embarcar para a capital inglesa.
“Sem Macalé não haveria Transa. Estou chorando porque ele morreu hoje. Foi meu primeiro amigo carioca da música. Antes de Bethânia imaginar que seria chamada para o Opinião, Alvaro Guimarães, diretor teatral baiano, me trouxe ao Rio para montar e mixar o curta para o qual eu tinha feito a trilha. Fui parar na casa de Macalé. E ele tocou violão. Me encantei”, declarou Caetano Veloso.
Embora não se considerasse um tropicalista, ele colaborou com o movimento e seus integrantes. Enquanto Caetano e Gil estavam exilados, ele foi um parceiro importante para Gal Costa, que se tornou a principal representante da música tropicalista na ausência da dupla. Jards Macalé não só produziu o disco Legal, de 1970, como compôs para a cantora, incluindo Mal Secreto e Vapor Barato, ambas em parceria com Waly Salomão.
Em 2019, aos 76 anos, lançou Besta Fera, considerado um dos pontos altos de sua discografia, onde retratou o governo de Jair Bolsonaro como um período de trevas. Dois anos depois, lançou Coração Bifurcado, com participações de Maria Bethânia e Ná Ozzetti, tratando das diferentes formas do amor.
“Diante do cenário de genocídio emocional, pai brigando com filho, marido brigando com a sogra, uma porradaria horrorosa, ninguém falava de amor”, afirmou Macalé no lançamento da obra. Uma de suas últimas aparições nos palcos foi no fim de setembro, no festival Doce Maravilha, onde emocionou o público apresentando as canções de seu disco homônimo de 1972.
Além da música, Macalé atuou no cinema, na televisão, no teatro e nas artes plásticas durante suas seis décadas de carreira. Compôs trilhas sonoras e atuou em diferentes filmes do cineasta Nelson Pereira dos Santos (1928-2018), como O Amuleto de Ogum (1974) e Tenda dos Milagres (1977).
Jards Macalé deixa a mulher, a cineasta Rejane Zilles. Até o momento, não foram divulgados detalhes sobre o velório e o sepultamento do artista.