Flávio Dino durante a sessão do STF • Andressa Anholete/SCO/STF
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quinta-feira (23) que estados, o Distrito Federal e municípios adotem o mesmo padrão de transparência e rastreabilidade aplicado às emendas parlamentares federais, sob pena de descumprimento constitucional. A decisão estende aos entes subnacionais as regras que, desde 2022, buscam erradicar o chamado “orçamento secreto”.
Na prática, a execução de emendas parlamentares estaduais, distritais e municipais a partir de 2026 só poderá ocorrer após comprovação, perante os respectivos tribunais de contas, de que os governos locais cumprem o artigo 163-A da Constituição Federal, que obriga a divulgação pública e eletrônica de dados orçamentários e fiscais.
“Não faz sentido que o dever de identificar a origem e os beneficiários finais dos recursos públicos se limite ao plano federal, permitindo que os mesmos vícios – opacidade, fragmentação, ausência de planejamento e de controle social – persistam nos níveis estadual e municipal”, afirmou o ministro Flávio Dino em sua decisão.
O despacho do ministro cita estudo elaborado pelas organizações Contas Abertas, Transparência Brasil e Transparência Internacional – Brasil, segundo o qual apenas três dos 27 estados divulgam informações completas sobre emendas parlamentares. Outros 23 estados apresentam dados incompletos, e um estado não fornece nenhuma informação essencial. O levantamento mostra ainda que 37% dos municípios brasileiros – cerca de um terço dos avaliados – não publicam quaisquer dados sobre os repasses recebidos por meio de emendas.
Entre os principais problemas apontados estão a falta de identificação dos beneficiários finais, a ausência de histórico de execução, e dados em formatos inacessíveis ou incompatíveis com os sistemas oficiais de controle.
Embora a decisão não detalhe o desempenho individual dos estados em relação à divulgação de informações sobre emendas, o Acre aparece em 25º lugar no Índice de Transparência e Governança Pública, levantamento produzido pelas mesmas entidades. O ranking, publicado em abril de 2025, avalia o grau de abertura de dados, governança orçamentária e cumprimento de normas de acesso à informação no Poder Executivo estadual. A posição coloca o Acre entre os três piores estados do país, evidenciando desafios significativos na publicação de dados completos sobre repasses e execução de recursos.
A decisão de Dino também notifica os tribunais de contas estaduais, municipais e do Distrito Federal, além dos ministérios públicos de contas, para que fiscalizem a conformidade dos orçamentos locais ao novo modelo.
O ministro ainda oficiou o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos para que auxiliem os entes subnacionais por meio de treinamentos, manuais, suporte técnico e integração de sistemas de transparência. Uma audiência pública está prevista para março de 2026, quando os órgãos de controle deverão apresentar os primeiros resultados das medidas de adequação.
Em dezembro de 2022, o STF considerou inconstitucionais as práticas que sustentavam o “orçamento secreto”, mecanismo que permitia a distribuição de bilhões de reais em emendas de relator sem transparência. Desde então, a Corte acompanha um processo estrutural de conformação à Constituição, com avanços como a reformulação do Portal da Transparência, a integração de dados à Plataforma Transferegov.br e a publicação da Lei Complementar nº 210/2024, que fixou novas regras para o uso e o controle das emendas.
Com a nova decisão, Flávio Dino estende o alcance da transparência orçamentária a todo o pacto federativo, buscando eliminar o que chamou de “cultura de apropriação privada do orçamento público”. “O erário existe para servir à coletividade, não para gerar fortunas e benesses privadas”, afirmou o ministro em tom crítico.