Para o jornalista Tião Vitor, meu amigo de fazeora, que já partiu há alguns anos.
Homem quando bota pra cozinhar, por mais troglodita que seja, com uma faca na mão, fogo aceso, uma ideia na cabeça e uma bela peça de carne consegue fazer qualquer um lamber os beiços. Pois bem, morávamos eu e os amigos Tião Vitor e Regiclay Saady numa casa que nosso patrão Antonio Stélio alugou, bem pertinho do lugar aonde a gente ia todo dia trabalhar (O finado jornal Página 20).
Ali, onde o Stélio também dormia, a gente tirava o domingo para se aventurar na cozinha. Levávamos as namoradas, convidávamos os colegas de labuta, os amigos de boteco, cada qual devidamente munido de pacotes de latinhas de cerveja mais cachaça, gelo de água de coco, whisky da Bolívia e festejávamos a vida achando graça, falando da vida alheia, de jornalismo e de tudo enquanto se podia falar feito gente grande.
Vez por outra alguém assumia o fogão e preparava a gororoba que aprendera num desses programas televisivos de ensinar a cozinhar. Sujeito se julgava um cheff, um Edu Guedes, uma Palmirinha, uma Ana Maria Braga! E por falar nisso, o Velho Braga, que vos escreve foi – Inda é! – um desses cozinhadores de primeira caçarolada. Boçal como todo bom cheff, sempre apresentava um prato novo para o deleite, ou não, da rapaziada.
O Vitor é um puta culinarista. Sempre agradava com suas receitas de carnes, mas a mais deliciosa que me vem agora à mente – pelo menos para o meu paladar – foi um frango assado, temperado com cerveja preta. Rapaz, aquilo é iguaria fina que só os sortudos e os abençoados podem comer e repetir o prato. Fiquei foi com uma inveja danada do amigo Vitor e fui atrás de receitas em livros e na televisão para tentar confrontar aquele magnífico frango dos deuses.
Comecei com a moqueca de surubim, à moda baiana, que o saudoso Antônio Alcântara me ensinara. A moçada caiu foi de cunforça em cima do peixe cozinhado, junto com camarão no azeite de dendê, leite de coco, tomate, pimentão, cebola, pimenta de cheiro e gengibre. De entrada, uma caneca de caldinho pra acompanhar a caipirinha do cearense. Arre égua! Aquilo é bom demais, modéstia à parte. Benza Deus!
Depois fiz o famoso cozidão de canela, com direito a tutano e pirão com farinha de cruzeiro do sul e manteiga de garrafa. Pesquisando mais adiante, fuçando pela culinária internacional descobri o curry, tempero indiano que mistura diversas especiarias, tudo de bom pra temperar uma carne, um filé de frango e até o arroz. Fiz de um tudo usando curry. Abusei e desabusei do pozinho marrom. Aí a galera criou o maior abuso daquele troço.
O Vitor me disse que até hoje enjoa só em saber que na comida tem curry. Não sei se superei o frango assado na cerveja, mas que a gente comeu muito e muita coisa gostosa naqueles tempos deliciosos, comeu mesmo. Só fico com dó do meu amigo Tião Vitor que não gosta mais de comer curry. Eu discordo dele totalmente porque afinal comer um curryzinho de vez em quando é bom demais, né não, grande Tiãozinho?!