A defesa da família de Juliana Chaar Marçal, assessora jurídica de 36 anos morta após ser atropelada em frente a uma casa noturna em Rio Branco no dia 21 de junho, manifestou indignação com a decisão da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Acre (TJAC), que concedeu habeas corpus ao principal suspeito, Diego Luiz Góis Passos, no último dia 25. A ordem judicial, que só foi disponibilizada à defesa nesta terça-feira (30), libera o acusado com medidas cautelares, incluindo proibição de deixar a comarca de Rio Branco. No entanto, críticas apontam para contradições, como o endereço comprovado do suspeito em Extrema, Rondônia, e sua demora em se apresentar às autoridades após o crime.
O acusado Diego Luiz Góis Passos – Foto: Reprodução
O atropelamento ocorreu na madrugada de 21 de junho, por volta das 3h50, na Rua São Sebastião, bairro Isaura Parente, próximo ao bar Dibuteco. De acordo com a denúncia do Ministério Público, Diego Góis, motivado por uma discussão fútil iniciada pela quebra de um copo no interior do estabelecimento, envolveu-se em uma briga que se estendeu para a rua. Após o confronto, ele dirigiu-se ao seu veículo, manobrou intencionalmente em direção ao grupo adversário e atropelou Juliana Chaar e Keldheky Maia da Silva. Juliana foi arremessada ao solo, arrastada sob o carro e morreu por choque neurogênico, conforme laudo cadavérico. Keldheky sofreu ferimentos no braço, mas sobreviveu. Diego fugiu sem prestar socorro, retornando brevemente ao local para verificar as vítimas antes de evadir-se.
A denúncia acusa Diego de homicídio qualificado consumado (contra Juliana) por motivo fútil e recurso que dificultou a defesa, e duplo homicídio qualificado tentado (contra Keldheky), além de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. Ele foi considerado foragido até 15 de julho, quando se apresentou em um posto de fiscalização na fronteira, em Senador Guiomard, durante uma operação policial. Sua prisão temporária, decretada em 22 de junho, foi convertida em preventiva em audiência de custódia.
No julgamento do habeas corpus, o desembargador Samoel Evangelista, relator originário, votou pela manutenção da prisão preventiva, sendo vencido. Em seu voto, Evangelista argumentou que há prova clara da materialidade do crime, com laudos periciais, boletins de ocorrência, depoimentos e análises de vídeos confirmando o atropelamento intencional. Ele destacou indícios suficientes de autoria, incluindo a fuga do local sem socorro e a demora de 22 dias para o cumprimento do mandado, o que indicaria risco de evasão e necessidade de garantir a aplicação da lei penal.
O desembargador enfatizou a gravidade do crime, que afetou a comunidade e gerou repercussão, justificando a custódia para preservar a ordem pública. Ele rejeitou argumentos da defesa sobre nulidades na decretação da prisão temporária, afirmando que o juiz plantonista era competente e a decisão foi ratificada pelo juiz natural. Evangelista também considerou que condições pessoais favoráveis, como primariedade e residência fixa, não elidem a prisão quando há requisitos legais, e que medidas cautelares alternativas só seriam viáveis na ausência desses requisitos.
Por maioria, os desembargadores Denise Bonfim (relatora designada para o acórdão) e Francisco Djalma votaram pela concessão do habeas corpus, substituindo a prisão por medidas cautelares diversas. No voto vencedor, Bonfim defendeu que a prisão preventiva é excepcional e deve ser motivada por razões concretas, compatíveis com a presunção de inocência e o Estado Democrático de Direito. Embora reconhecesse elementos idôneos na decisão inicial, como a gravidade do crime, ela argumentou que o juiz singular não demonstrou satisfatoriamente a insuficiência de medidas menos gravosas.
A desembargadora destacou que Diego é primário, sem antecedentes criminais, com ocupação lícita e residência fixa, o que não indica periculosidade exacerbada. Aplicando o princípio da proporcionalidade e as alternativas da Lei 12.403/2011, Bonfim considerou suficientes as cautelares do artigo 319 do CPP: comparecimento periódico em juízo para informar endereço e atividades; proibição de ausentar-se da comarca de Rio Branco sem permissão; proibição de frequentar bares e similares; recolhimento domiciliar noturno (das 20h às 6h); proibição de contato com testemunhas; e monitoramento eletrônico. Ela deixou ao juiz de origem o acompanhamento e possível ajuste dessas medidas, com possibilidade de nova prisão se necessário.
A advogada Gláucia Albuquerque, representante da família de Juliana como assistente de acusação, expressou profundo pesar com a decisão. “Como advogada criminalista e representante da família, recebi a notícia com extremo pesar. Após o crime, a família cobrou justiça, e conseguimos prendê-lo após muito esforço, pois ele se escondeu e dificultou o cumprimento do mandado”, disse ela em entrevista ao ac24horas nesta terça-feira (30). Albuquerque criticou as medidas cautelares como insuficientes, destacando que o crime foi “bárbaro” e que o motorista fugiu sem prestar socorro e permaneceu foragido por dias, o que demonstraria, em sua opinião, risco ao processo.
Ela apontou contradições na decisão, como a proibição de deixar Rio Branco apesar do endereço comprovado em Extrema (RO), não em nome dele, questionando a alegação de residência fixa. “Isso fragiliza o argumento para liberá-lo. Estamos diante de um caso de extrema gravidade, e a família está consternada, pois ele tem mais privilégios do que Juliana jamais terá. Vamos acompanhar o caso para uma tramitação célere e uma condenação”, concluiu.