Categorias: Irailton Lima

O cooperativismo, a Cooperacre e os desafios da produção familiar no Acre

Por
Irailton Lima

A vida do produtor familiar no Acre nunca foi simples. Faltam documentos de posse para acessar o crédito nos bancos, faltam canais de mercado, sobram barreiras logísticas e a assistência técnica ainda é esporádica e insuficiente. Produzir nessas condições é quase impossível. Ainda assim, quase 40 mil famílias — agricultores, extrativistas e pequenos pecuaristas — tiram renda e conduzem suas vidas nesse cenário. Se não interessa à sociedade que essas famílias migrem para as periferias, com todas as suas mazelas, precisamos responder objetivamente a uma pergunta: como manter a agricultura familiar viva quando o básico — crédito, conhecimento, logística e mercado — não está garantido?


É nesse contexto que o cooperativismo surge como alternativa concreta, eficiente e, sobretudo, adequada às tradições sociais do Acre. Não se trata apenas de somar esforços, de juntar desesperados, mas de construir uma estrutura social e produtiva capaz de integrar produção, escala, regularidade e qualidade. De entrelaçar relações sociais com necessidades econômicas por meio de um modelo de governança que busca integrar eficiência gerencial com práticas democráticas de compartilhamento de decisões, informações, poder e resultados financeiros. Experiências bem-sucedidas no Brasil e no mundo comprovam a força desse modelo e, no Acre, a COOPERACRE é sua prova viva. Depois dos fracassos da CAEX e da CAPEB — hoje convertidos em valiosas aprendizagens —, o êxito dessa central agroextrativista mostra que a organização coletiva é viável e devolve dignidade ao trabalho do produtor familiar.


O ponto central para quem produz é o mercado. Sem mercado não há produção sustentável e, sem escala, o mercado não se consolida. A equação é simples, mas dura: o produtor isolado não consegue garantir regularidade, qualidade e segurança sanitária. Além disso, a fragmentação encarece e desorganiza a ação pública. Imagine um ramal em que cada família pratica uma cultura produtiva diferente: como assegurar assistência técnica especializada, beneficiamento ou transporte adequado? Esse é um desafio logístico e econômico impossível de vencer de forma pulverizada.


Por isso, integrar produtores não é detalhe: é condição de sobrevivência. A organização coletiva permite negociar em pé de igualdade, falar a linguagem do mercado e firmar contratos com segurança. Ao mesmo tempo, dá força política para dialogar com os órgãos públicos de forma unificada, com uma agenda clara de necessidades e prioridades.


Nesse ponto, as compras públicas assumem papel decisivo. Programas como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e as licitações estaduais e municipais são mais que políticas sociais: abrem um mercado estruturado, de bom porte e com garantia de pagamento. Para a agricultura familiar, esse canal é vital — talvez, neste momento, o mais importante na consolidação de uma produção regular e economicamente viável.


Mas não basta o mercado existir: é preciso preparo para acessá-lo. E aqui o cooperativismo, mais uma vez, mostra sua força: ele transforma produção pulverizada em oferta organizada, com escala, padrão de qualidade, rastreabilidade e cumprimento de prazos. Ao poder público cabe assumir seu papel de indutor: abrir e manter estradas e ramais, assegurar infraestrutura


básica, promover capacitação e reconhecer que apoiar empreendimentos coletivos é a melhor estratégia para formar capital privado, gerar renda e empregos e aumentar a circulação de recursos nas comunidades.


O Acre precisa entender que o cooperativismo não é uma opção secundária, mas a estratégia central para tornar a produção familiar rentável e sustentável. É ele que conecta a produção ao mercado, dá escala ao pequeno produtor e transforma fragilidades individuais em força coletiva. O desafio não está em provar que o modelo funciona — isso já está dado —, e sim em mobilizar visão política e compromisso institucional para apostar, de fato, no caminho que eleva o produtor de sobrevivente a protagonista da economia local.


O que vemos hoje em Xapuri com a COOPERXAPURI e em Mâncio Lima com a COOPERCAFÉ deveria povoar a realidade de todos os municípios acreanos — e pode. O caminho para isso, inclusive, já está aberto. Temos empreendedores sociais com visão, inteligência, capacidade de trabalho e compromisso com a causa, que seriam perfeitamente capazes de espalhar histórias de sucesso como essas em todo o território acreano. São pessoas como Manoel Monteiro, o Manoelzinho da COOPERACRE; Jonas Lima, de Mâncio Lima; De Araújo, de Assis Brasil; Dona Nilva, da COOPASFE, em Capixaba; e tantas lideranças, homens e mulheres, que estão, hoje, fazendo a diferença na produção familiar no Estado.


Nas próximas semanas, vamos explorar mais esse tema, na expectativa de contribuir para o despertar da sociedade acreana quanto às possibilidades que o modelo cooperativista abre para uma economia como a nossa.


Compartilhe
Por
Irailton Lima