Foto: indígenas desocupam prédio da SESAI I Whidy Melo/ac24horas
Na noite desta quarta-feira (24), dezenas de lideranças indígenas de diferentes regiões do Acre e do Amazonas ocuparam o prédio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), em Rio Branco. A ação teve como principal objetivo pressionar o secretário nacional de Saúde Indígena, Ricardo Weibe Tapeba, a destituir o atual coordenador distrital de Saúde Indígena do Alto Rio Purus, Evangelista da Silva de Araújo Apurinã.
Desde 16h00, caciques e representantes de povos tradicionais transformaram a sede da secretaria em um fórum de reivindicações. Relatos de abandono, falta de medicamentos, ausência de profissionais e ineficiência nos serviços de saúde marcaram os discursos e denúncias feitos diretamente a Tapeba, que compareceu à sede após pedidos das próprias lideranças.
Foto: indígenas desocupam prédio da SESAI I Whidy Melo/ac24horas
No início da reunião, o secretário nacional de Saúde Indígena fez um apelo para que não fossem feitos registros em vídeo ou fotos do encontro, solicitando, inclusive, que gravações anteriores fossem apagadas. A equipe de reportagem, respeitando o direito à liberdade de imprensa garantido pela Constituição Federal, manteve a gravação dos discursos, considerando o interesse público e a importância do acesso à informação.
Durante sua fala, Ricardo Tapeba reconheceu os avanços limitados da atual gestão, mas defendeu que houve melhorias em comparação à administração anterior. “É uma avaliação que nós estamos conseguindo avançar”, disse ele, destacando o aumento no número de profissionais indígenas contratados e a implantação de serviços antes inexistentes. Ainda assim, admitiu que as demandas continuam superiores à capacidade atual de atendimento do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Alto Rio Purus.
Foto: Ricardo Tapeba fala em reunião I Whidy Melo/ac24horas
Tapeba também se comprometeu com ações para atualização do sistema de informações do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS), visando adequar o atendimento às novas aldeias que surgiram nos últimos anos, e sugeriu soluções como compras compartilhadas de medicamentos para melhorar o abastecimento nas regiões mais remotas.
Apesar do tom conciliador do secretário, as lideranças indígenas mantiveram uma postura firme quanto à permanência do atual coordenador distrital. O cacique Raimundo Batista Jaminawá, da aldeia Boa Floresta, foi enfático ao dizer que a maioria das lideranças quer a substituição imediata do gestor. “Viemos com nosso dinheiro, saímos das aldeias, para fazer a mudança. Voltamos atrás porque a maioria dos caciques disseram para assinar o documento. Mas, se não for trocado, vamos levar um abaixo-assinado ao Ministério Público Federal”, afirmou.
Outros líderes, como Raimundo da Silva Andrade Apurinã, da aldeia Kamapã, relataram casos graves de abandono: “A pessoa vai no médico por conta própria, pega uma receita e não tem nem um paracetamol para tomar. Isso é mentira do coordenador quando ele diz que o polo está sendo atendido”.
A pressão chegou ao ponto de o secretário Tapeba ter sua saída do prédio condicionada, por algumas lideranças, à confirmação da exoneração do atual coordenador. Questionado sobre a suposta “detenção” do secretário, Joemisson Apurinã, vice-coordenador dos Povos Apurinã e Jamamadi, negou qualquer radicalismo: “Não é bem assim. O secretário pode sair a hora que quiser. Estamos aqui para dialogar e construir soluções. A ocupação foi uma forma de sermos ouvidos”.
Após longas horas de reunião e manifestações, os indígenas desocuparam pacificamente o prédio por volta das 21h00. Segundo Joemisson Apurinã, uma nova audiência será marcada para o próximo mês, com a participação das 156 aldeias do polo, a fim de decidir coletivamente sobre a permanência ou não do coordenador.
“A gente vai fazer uma consulta mais ampliada, porque aqui não estavam todas as aldeias. Vamos construir juntos a política indigenista e avaliar o que foi feito e o que precisa ser melhorado”, explicou.
Mesmo diante de um cenário de tensão, as lideranças optaram por um caminho institucional e legal para continuar cobrando melhorias. “Se não formos ouvidos, vamos aos órgãos competentes. Mas enquanto houver diálogo, não há necessidade de radicalismo”, finalizou Joemisson.