Menu

Cuidado com o guarda da esquina

Conta-se que Pedro Aleixo, em uma conversa com o presidente Artur da Costa e Silva, às vésperas da promulgação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), preocupado com os rumos do país e as consequências de uma lei tão draconiana, teria dito ao presidente: “Presidente, o problema de uma lei assim não é o senhor, nem os que com o senhor governam o país. O problema é o guarda da esquina.” Em seguida, foi instituído o mais duro dos atos institucionais da ditadura militar brasileira, que suspendeu direitos políticos, proibiu manifestações, instituiu a censura e deu ao presidente amplos poderes.


A intenção de Pedro Aleixo era alertar para os abusos e excessos que poderiam ser cometidos por autoridades de menor escalão, o “guarda da esquina”, uma vez que tivessem carta-branca para agir sem limites impostos pela lei. Ele temia que a suspensão de garantias legais e a concentração de poder nas mãos do governo abrissem espaço para arbitrariedades e violências por parte daqueles que estariam na ponta da aplicação das normas, ou seja, os agentes de segurança e fiscais do regime. A frase se tornou emblemática na história política brasileira, representando o perigo do autoritarismo difuso e das ações arbitrárias que podem surgir quando não há limites claros para o exercício do poder.


Parece que estamos revivendo aquele momento pós AI-5, decretado em dezembro de 1968, sem os cuidados com o “guarda da esquina”. Todos as autoridades parecem se sentir à vontade para descer a borduna da punição em quem lhes pareça ultrapassar as balizas do direito, sem que o devido processo legal seja obedecido, ou as premissas e prerrogativas sejam consideradas. É como se do STF e de seus inquéritos infindáveis transbordassem autorizações para o olhar punitivista direcionado, obviamente, aos setores políticos não alinhados.


Infelizmente, esse percurso tem contado com a omissão do legislativo que, de certo modo, renunciou à integridade do mandato que recebeu do povo e assiste inerte ao lawfare supremo. A inação somente pode levar a mais autoritarismo.


Ultimamente vimos observando seguidos fatos geradores de incômodo ou, de constrangimento, produzidos por autoridades que extrapolam suas funções. O principal agente dessa guinada autoritária é, segundo o ex-Ministro (4 vezes) e ex-presidente da Câmara Federal, Aldo Rebelo, o Ministério Público que, em relação siamesa com ONG’s compõe o sistema que engessa a Amazônia e nos prostra perante os interesses internacionais. Em palestra desse último dia 25/07 na Assembleia Legislativa, Rebelo fulminou o MP como braço jurídico do onguismo.


Por cá mesmo, no Acre, temos alguns exemplos. Quem já viu um membro do Ministério Público ser bedel de vereador e dizer se determinado projeto pode ou não pode ser apresentado? Quem já viu outro embargar obras e impedir a ligação terrestre entre dois municípios, afrontando o direito de ir e vir e o interesse público? Outro dia foram com tudo para cima dos moradores da RESEX Chico Mendes, destroçando sem piedade a vida de muitas famílias. Quem não ouviu queixas a respeito de Termos de Ajustamento de Conduta – TAC’s, que são muitas vezes impostos sem oportunidade de negociação, o que equivale a legislar?


Ainda mais recentemente, o Tribunal de Contas do Estado – TCE, resolveu elastecer suas mãos e alcançar sem razão, conforme decisão judicial, a Secretaria de Estado de Educação. Nesta última semana, foi a vez da Secretaria de Estado de Agricultura – SEAGRI, reagir a outra canetada do TCE que não gostou de um contrato celebrado no bojo da EXPOJURUÁ E EXPOACRE. Novamente o Tribunal de Justiça, em decisão lavrada pelo Desembargador Júnior Alberto, viu os ciscos na ação e, entre algumas vassouradas, mandou essa: “Acrescente-se, ainda, um dado de elevada relevância jurídica: a própria Constituição Federal confere ao Poder Legislativo a competência originária para a sustação de contratos administrativos, atribuindo ao Tribunal de Contas da União (ou aos Tribunais de Contas estaduais) apenas atuação subsidiária, e isso exclusivamente nos casos de omissão parlamentar, conforme preceituam os §§ 1.º e 2.º do artigo 71 da Carta Magna.” Trocando em miúdos, o TCE foi além das sandálias, como diria o sapateiro romano.


Com toda a admiração e respeito que merecem, sem exceção, os membros do TCE-AC e do MP, é prudente, especialmente neste momento de polarização política, que os órgãos públicos através de seus dirigentes, se contenham, as instituições não podem vestir certas camisas sem o risco de sofrerem prejuízo em sua credibilidade. Como se diz nos EUA, “stay in your lane”, do contrário estaremos indevidamente alimentando um processo que, aliás, tem no out lane praticado escancaradamente por membros do STF a principal causa.


Voltando a Pedro Aleixo, se as grandes autoridades não exercitarem o discernimento e a moderação, ajudando a desanuviar os sentimentos, de repente seremos surpreendidos com um “guarda da esquina” detendo, prendendo e multando como se fosse dono da Lei.


Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS, terças, quintas e sábados no  DIÁRIO DO ACRE, quartas, sextas e domingos no ACRENEWS e, eventualmente, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no VOZ DA AMAZÔNIA e em outros sites.


 


plugins premium WordPress