Imagem ilustrativa- Foto: Reprodução
O Acre, novamente, está no meio do caminho de interesses do que se convencionou chamar de “grande capital”. É o que diz a História Econômica do Brasil. Foi assim no primeiro Ciclo da Borracha, na segunda metade do século XIX, com evidente jogo de interesses externos, sobretudo, norte-americanos. A borracha, no período, era uma necessidade para uma Revolução Industrial que se consolidava no Norte da América.
Eis que agora, mais uma vez, o Acre volta ao foco do holofote. Não mais pela borracha, mas pela Geografia. É a localização do Acre que chama a atenção. E se não são mais os Estados Unidos que estão em ascensão como há mais de 160 anos, os protagonistas da vez são os chineses.
São mudanças que precisam ser pontuadas para que ninguém seja manipulado nesse debate a respeito da construção dessa ferrovia interoceânica que sai da Bahia e banha os trilhos no Pacífico. Para algumas pessoas, há dificuldade de se apreender o significado da expressão “grande capital”. O dinamismo da circulação de dinheiro e concentração de riqueza pautando investimentos em escala global está sob o controle de um grupo muito seleto de países e, entre estes, pelas mesas de poucos grupos econômicos. É da natureza do sistema.
Nesse contexto, a discussão se a ferrovia interoceânica vai ter ponto de apoio parando no “Ranofo”, na BR-317, ou nas proximidades da Ponte do Jurupari, na BR-364, é completamente inócua, beira a imaturidade. Uma parte da classe política do Acre, sem agenda qualificada para um debate mais consequente, insiste no embate em que nem o Brasil e muito as empresas brasileiras têm o controle integral. Evidentemente que há legislações e estudos que precisam ser resguardados, preservados e respeitados.
A falsa polêmica atende mais aos interesses políticos eleitorais deste ou daquele parlamentar do que a qualquer outro intento. E o pseudo-embate vem encapado em uma espécie de chilique. Um frenesi com toques de nervosismo que não tem encontrado interlocutor. É um delírio frente ao espelho, que tantos distúrbios tem alimentado.
É bom lembrar que em 1904, o Estado brasileiro criou uma espécie de “jabuti” jurídico para tornar este torrão um bocado de Brasil. A criação do “Território do Acre” foi uma inovação legal formalizada por meio de um decreto. Além da tinta da pena do Barão de Rio Branco, espremeu-se no papel interesses que o governo brasileiro entendeu que seriam importantes ceder naquele momento, diante daquele contexto.
Guardadas as devidas proporções e respeitos às enormes diferenças entre os contextos, o movimento se repete. As tramas geopolíticas em que o Brasil está inserido agora, inclusive respeitando os interesses de segmentos importantes da economia brasileira, são muito fortes. O editorialista se arrisca a dizer que não serão 513 ingênuos da Câmara Federal, muito menos os 81 devotos do Senado, nem 11 vigilantes da Constituição, somados a um presidente que irão barrar.
No Acre, mais importante do que discutir se a ferrovia passa por aqui ou por acolá, é elaborar leis e criar estímulos para resolver os gargalos das cadeias produtivas existentes. Pelo que está se consolidando, a ferrovia vai mesmo se integrar ao Peru pelo Vale do Alto Acre. Isso não significa que os parlamentares federais devem, por conta disto, ignorar a BR-364. Para as empresas e comercialização de produtos, o modal ferroviário pode muito bem se integrar ao rodoviário, como acontece em tantos lugares do mundo. A economia acreana não será redimida pela escolha deste ou daquele modal.
Existe atividade econômica no Acre para além da BR-317. Não vê quem não quer. Ou quem quer encontrar um mote para a campanha do ano que vem. Ou ainda (como diz a rapaziada atualmente): para quem quer “fazer bons cortes” para “lacrar” nas redes sociais. As energias deveriam estar concentradas em resolver os problemas dessas outras regiões, seja na comercialização, seja na produção, seja na infraestrutura. Os chiliques têm motivos reais, para problemas reais.
Líder verdadeiro é aquele que consegue manter a capacidade de perceber soluções quando ninguém mais parece estar disposto a conversar e encontrar novos caminhos. Em Economia, nem tudo é reto. Aliás, até os trilhos fazem curva quando é necessário. E como lembra a música do poeta mineiro, “… o trem que chega é o mesmo trem da partida”.