Especialistas e autoridades esperaram durante meses uma possível ofensiva russa que teria o objetivo de tomar mais territórios nas regiões orientais da Ucrânia.
Porém, até agora, essa expectativa não se concretizou, mas os russos obtiveram alguns avanços e reforçaram significativamente as tropas em algumas áreas.
O presidente russo, Vladimir Putin, continua buscando ganhos territoriais, enquanto as negociações de um cessar-fogo ficam em segundo plano.
Na semana passada, ele reafirmou o que há muito tempo é uma de suas principais maneiras de justificar a invasão: “Considero as nações russa e ucraniana como um só povo. Nesse sentido, toda a Ucrânia é nossa”.
Mesmo assim, os ucranianos lançaram contra-ataques em algumas áreas e estão desenvolvendo rapidamente uma indústria nacional de armas. Enquanto isso, a economia russa em tempos de guerra enfrenta dificuldades mais fortes.
Ofensiva russa está enfraquecendo, dizem autoridades ucranianas
Tropas russas estão tentando avançar em várias áreas da linha de frente, que tem 1.200 quilômetros de extensão.
O comandante-chefe militar ucraniano, Oleksandr Syrskyi, afirmou nesta semana que agora há 111 mil soldados russos somente em uma parte da linha de frente.
Um ponto crítico está perto da cidade de Pokrovsk, na província de Donetsk, onde ocorrem pelo menos 50 confrontos por dia. Em dezembro de 2024, havia 70 mil soldados russos na área, de acordo com o Estado-Maior Ucraniano.
Syrskyi também afirmou que a infiltração russa na região norte da cidade de Sumy havia sido interrompida.
O Instituto para o Estudo da Guerra (ISW) – uma instituição que realiza pesquisas em Washington – afirma que as forças ucranianas recuperaram parte do território em Sumy e que o ritmo dos avanços russos na região diminuiu.

Cerca de 60 mil pessoas já viveram em Pokrovsk, uma cidade que está na mira da Rússia há um ano. • Libkos/Getty Images via CNN Newsource
“Podemos dizer que a onda de tentativas de uma ‘ofensiva de verão’ lançada pelo inimigo a partir do território russo está fracassando”, comentou Syrskyi.
Mas o cenário é misto. Nos últimos dias, ataques russos ganharam terreno na fronteira das regiões de Donetsk e Dnipropetrovsk. O Ministério da Defesa da Rússia afirmou no sábado que outra vila, Zirka, havia sido tomada.
O DeepState, um analista ucraniano de dados públicos, ressaltou que “as defesas ucranianas continuam entrando em colapso rapidamente, e o inimigo está fazendo avanços significativos com ataques constantes” naquela área.
O Kremlin insiste há muito tempo que sua campanha continuará até que a Rússia controle todas as regiões de Donetsk, Zaporizhzhia e Kherson — o país já ocupa quase toda a cidade de Luhansk, exceto uma pequena parte.
Conflito deve se estender por mais um ano
No ritmo atual, essa tomada de territórios pela Rússia levaria muitos anos. Mas com o governo Trump aparentemente menos comprometido em conduzir as negociações de cessar-fogo, o conflito provavelmente se arrastará até o final deste ano e continuará em 2026.
O campo de batalha é agora uma combinação de operações especiais engenhosas lideradas por drones e ataques de infantaria muito básicos.
Em uma ponta do espectro, os ataques audaciosos da Ucrânia no início de junho contra bombardeiros estratégicos russos usaram drones operados a partir de caminhões em território russo – uma missão que destruiu cerca de uma dúzia de aeronaves usadas para lançar mísseis contra a Ucrânia.
O Serviço de Segurança da Ucrânia relatou outro ataque de drones no sábado (28), que alegou ter causado danos extensos a uma base aérea russa na Crimeia.
Em contraste, soldados russos a pé e de moto – às vezes em grupos de uma dúzia ou menos – invadem vilarejos abandonados no leste da Ucrânia, com drones como cobertura, mas sem dispositivos blindados à vista.
Essa abordagem está forçando uma mudança nas táticas ucranianas para posições fortificadas menores.
O ministro da Defesa ucraniano, Rustem Umerov, disse na semana passada que as defesas estavam sendo camufladas para se adequarem ao terreno e reduzidas para evitar a detecção.
Guerra dos Drones
Enquanto a guerra avança, os drones continuam desempenhando um papel cada vez mais importante no conflito.
Os russos estão produzindo drones baratos e fabricados em massa, projetados para sobrecarregar as defesas aéreas e permitir a passagem de alguns de seus mísseis.
Os russos também têm usado cada vez mais essa tática para atingir cidades ucranianas, especialmente Kiev, que sofreu danos consideráveis e um número maior de vítimas civis nas últimas semanas.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse no domingo (29) que, durante aquela noite, “477 drones estavam em nossos céus, a maioria deles ‘Shaheds’ (de impacto suicida) russo-iranianos, juntamente com 60 mísseis de vários tipos. Os russos estavam mirando em tudo o que sustenta a vida”.
Eles usam “até 500 Shaheds por noite, combinando-os com mísseis balísticos e de cruzeiro — com o objetivo de esgotar nossas defesas aéreas”, segundo o ministro Rsutem Umerov.
Zelensky reiterou os apelos pelo envio de mais baterias de mísseis Patriot e outros sistemas ocidentais, que Trump comentou na semana passada que os EUA “deveriam considerar” devido aos ataques em larga escala contra cidades ucranianas.

Soldado ucraniano pilota um drone durante um treinamento militar enquanto a guerra Rússia-Ucrânia continua em Donetsk • Diego Herrera Carcedo/Agência Anadolu via Getty Images
O presidente ucraniano afirmou que o país está preparada para comprar Patriots diretamente ou por meio do fundo estabelecido pelo acordo de minerais entre EUA e Ucrânia.
Ambos os lados estão produzindo drones de todos os tipos a um ritmo impressionante.
O Serviço de Segurança da Ucrânia estima que a Rússia produz quase 200 drones Shahed de design iraniano todos os dias, e possui um estoque de cerca de 6 mil unidades, além de cerca de 6 mil drones chamariz.
Na última semana, os russos utilizaram mais de 23 mil pequenos drones “kamikazes” nas linhas de frente, de acordo com o Estado-Maior do Exército ucraniano.
É uma corrida sem fim em design e produção. Syrskyi afirmou recentemente que a Rússia desenvolveu uma vantagem em drones controlados por fibra óptica, que são mais difíceis de rastrear e interceptar.
A guerra com drones é uma “constante luta intelectual — o inimigo mudava regularmente os algoritmos e a Ucrânia adaptava táticas em resposta”, explicou Umerov.
“Soluções que demonstraram alta eficácia no início da guerra se perderam com o tempo, à medida que o inimigo mudava de tática”, ponderou.
Por sua vez, a Ucrânia está intensificando a produção dos drones de longo alcance que tem usado para atacar infraestruturas russas, como aeródromos, refinarias e transportes.
Umerov destacou que “milhares” seriam produzidos, além de mais de quatro milhões de drones destinados ao campo de batalha este ano.
Riscos da economia de guerra
Ambos os lados continuam construindo indústrias de defesa que lhes permitam continuar lutando – mesmo que a escala da produção russa supere em muito a da Ucrânia.
O enorme conglomerado militar russo Rostec produz cerca de 80% dos equipamentos usados contra a Ucrânia.
O CEO Sergey Chemezov afirmou em uma reunião com Putin Neste mês que a produção da Rostec cresceu dez vezes desde 2021, e que a receita aumentou no ano passado para US$ 46 bilhões (aprox. R$250 bilhões).
Mas há dúvidas sobre o que acontecerá no futuro. O orçamento militar da Rússia representa cerca de 40% do gasto público total – mais de 6% do PIB.
Isso alimentou a inflação, e Putin reconheceu na semana passada que o crescimento deste ano seria “muito mais modesto” para combater a alta dos preços. Ele chegou a sugerir que os gastos com defesa diminuiriam no próximo ano.
Enquanto isso, Maksim Reshetnikov, ministro do Desenvolvimento Econômico, pontuou que “com base no sentimento empresarial atual, parece-me que estamos à beira da transição para uma recessão”.
A presidente do Banco Central da Rússia, Elvira Nabiullina, discordou de Reshetnikov, mas alertou que reservas financeiras, como o fundo de reserva nacional, estão quase esgotadas.
“Precisamos entender que muitos desses recursos foram esgotados”, destacou Nabiullina ao Fórum Internacional de São Petersburgo.
O próprio Putin reconheceu o risco, afirmando que, embora alguns especialistas previssem estagnação, ela “não deveria ser permitida em nenhuma circunstância”.
Embora as suposições a longo prazo para a Rússia possam ser preocupantes – econômica e demograficamente –, o país pode continuar, no curto prazo, a financiar um Exército de mais de meio milhão de homens que estão na Ucrânia ou perto da fronteira, percorrendo alguns quilômetros aqui e ali.
Apesar das milhares de baixas, o Exército russo ainda pode gerar forças muito maiores do que a Ucrânia.
Com os olhos ainda voltados para o prêmio, Putin destacou na semana passada: “Temos um ditado… onde pisa o pé de um soldado russo, ali é nosso”.