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É possível produzir em uma Resex?

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Por Daniel Zen*


Nessa recente polêmica envolvendo a Operação Suçuarana, do ICMBio, na Resex Chico Mendes, algumas coisas precisam ser esclarecidas:


De um lado, da parte do Governo Federal, tem se observado, ao longo dos anos, um nítido descompasso entre a dimensão do comando e controle e as políticas de fomento, dentre as quais o acesso ao crédito e assistência técnica. O Estado não pode abrir mão do exercício de seu poder de polícia para coibir ilícitos ambientais, mas, isso não pode suplantar a necessidade de concretizar a sua função de fomento, de modo que as atividades produtivas da Resex não sejam apenas ambientalmente corretas, mas também socialmente justas e economicamente viáveis.

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De outro lado, não é verdade que todas as pessoas que hoje estão sendo autuadas, multadas ou tendo suas cabeças de gado apreendidas já estavam lá antes da criação da Resex. Uma boa parte dos que hoje protestam “compraram a posse” de posseiros originais e foram pra lá conhecendo as limitações legais quanto ao volume/quantidade máxima de pasto que pode ser formado e de gado que pode ser criado ali dentro. Mesmo assim, forçam a barra, descumprem a legislação e, depois, se dizem vítimas da ação fiscalizatória do governo.


Há um fator agravante, que contribui para que tal situação esteja ocorrendo: como os moradores da Reserva não detém a propriedade das terras por eles ocupadas, acabam se sujeitando ao artifício da “compra e venda da posse”, negociada a valores mais “em conta” do que o observado em uma operação de compra e venda de terras “comuns”, desembaraçadas de qualquer tipo de gravame jurídico específico. Mesmo que tal prática seja ilegal, isso tem levado a uma pressão dos “de fora”, comprando a posse dos “de dentro” para, em lá chegando, pressionar ainda mais para a retirada das limitações ambientais, o que na prática significaria transformar uma unidade de conservação em fazenda.


Há dezenas de estudos que analisam, sob diferentes aspectos (econômicos, culturais, sociais, jurídicos ou políticos) o conflito entre formas sustentáveis de exploração econômica na Resex versus a necessidade de conservação dos biomas. Destaco um dos mais recentes, a tese de doutorado da minha colega do Curso de Direito da UFAC, Profa. Dra. Sabrina Cassol. Em síntese, o que tais estudos nos demonstram é que é possível conciliar produção econômica e conservação ambiental. Isso inclui o extrativismo, mas também outras formas de produção, desde que com emprego de tecnologia e, portanto, um custo de produção mais elevado. Nesse sentido, para que isso se concretize deve haver incentivo e subsídios governamentais, mas também compreensão da sociedade de que, ali dentro, não dá para cultivar a terra da mesma forma que se faz em uma área que não esteja afetada com os gravames de uma Unidade de Conservação.


Quem desejar criar uma quantidade maior de gado, além dos limites ali permitidos, deve procurar terras fora daquela área. Afinal, não se pode esquecer que ali é uma Unidade de Conservação (UC), onde deve haver limitações ambientais mais rígidas, do contrário, não há sentido de existir afetação específica para tal finalidade.


Não dá é para achar que, em uma Resex, você vai poder ciar um rebanho do mesmo tamanho como se estivesse em uma fazenda de gado comum. O que também não pode ocorrer, além de eventuais excessos na dimensão persecutória, é a falsa vitimização e os discursos políticos oportunistas, que distorcem a situação na tentativa de angariar votos.


*Mestre (UFSC) e doutor (UnB) em Direito. Professor do Curso de Direito da UFAC. Ex-diretor-presidente da Fundação de Cultura Elias Mansour, ex-secretário de Educação e ex-deputado estadual do Acre.


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