Trama das sete da Globo, Dona de Mim se tornou rapidamente “a novela” do horário nobre. Desde sua estreia em 28 de abril, sem o mesmo alarde de Vale Tudo, o folhetim coleciona vitórias. O fenômeno não é apenas porque a audiência chega a ser melhor do que a do remake em diversos dias, mas na repercussão positiva e na identificação que gera no público.
Na era do streaming, o telespectador não está mais refém da programação linear. Escolhe o que quer ver, quando e onde deseja vê-lo. E nesse cenário de múltiplas opções, apenas as histórias mais envolventes conseguem feitos como Dona de Mim, que faz isso com naturalidade.
A autora Rosane Svartman, conhecida por seu olhar apurado sobre os temas contemporâneos, desenvolveu uma fórmula própria para impactar: usa a representatividade como fio condutor, equilibra drama e humor, e ainda apresenta tramas que abraçam a diversidade.
A novela das sete ainda mistura gêneros, como comédia, romance e crítica social, além de tratar de assuntos relevantes com leveza e, ao mesmo tempo, com profundidade, sem jamais soar panfletária –ou “palestrinha”, como dizem nas redes sociais.
Uma das forças da narrativa de Dona de Mim está em como a história incorpora personagens com perfis pouco vistos em posição de protagonismo, como a babá Leona (Clara Moneke) e o policial Marlon (Humberto Morais).
Pessoas com deficiência, mulheres que optam por não ser mães, péssimas mães e supermães, possibilidades amorosas infinitas, conflitos éticos, além de jovens negros em ascensão profissional estão no leque abraçado pela história de maneira orgânica.
Nada soa forçado. A diversidade, por exemplo, não é um item de uma lista a ser seguida, mas uma válvula propulsora narrativa. A construção dos personagens é outro diferencial. Rosane não trabalha com estereótipos. Suas figuras centrais têm contradições, cicatrizes e desejos.
Em vez de heroínas perfeitas, como Vale Tudo faz com Raquel (Taís Araujo), Dona de Mim apresenta pessoas reais em situações complexas. A relação entre a mulher que perdeu um bebê e a menina órfã de mãe que precisa de afeto é apenas um exemplo de como a autora transforma temas delicados em um potente núcleo dramático.
Se em Vai na Fé (2023) a autora já havia sinalizado essa guinada para uma dramaturgia mais inclusiva e conectada com o presente, em Dona de Mim ela confirma uma maturidade criativa. Sua novela não depende de grandes viradas para manter o público: ela conquista pela sensibilidade cotidiana, pelas relações humanas que se transformam e pelo retrato atual do Brasil.
Dona de Mim mostra que não existe mais horário fixo para a melhor novela da programação. Quando uma história se impõe com força, é porque ela se tornou mais do que entretenimento: virou espelho, respiro e ponto de encontro.