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Bebês reborn: “cegonhas” produzem bonecos hiper-realistas no Acre

Eles são hiper-realistas e podem até ser confundidos com recém-nascidos de verdade, tamanha semelhança com os humanos. Assim são os bebês reborn, bonecos artesanais que simulam uma criança e acabaram “furando a bolha” do nicho infantil, ganhando vida com personagens e narrativas protagonizadas por ‘role play’ (interpretação de papéis ou dramatização), onde criadores de conteúdo vivenciam situações fictícias para engajar perfis em redes sociais.


Bebês reborn são feitos de forma artesanal e se assemelham ao humano (FOTO: Verônica Torres/Cedida)

Ocorre que por trás das recentes polêmicas envolvendo o role play, que afetaram a comunidade reborn, existe arte, propósito e sensibilidade. Artistas profissionais carinhosamente chamadas de “cegonhas”, buscam, com ética e respeito, consolidar essa forma de artesanato há mais de 30 anos. O Acre possui referências na arte reborn, produzindo bonecas que podem custar até R$ 7 mil, dependendo do nível de realismo.


As artistas reborn Luciana Barros e Verônica Torres encabeçam o mercado em Rio Branco (AC), também recebendo encomendas de outros estados brasileiros. Elas compartilham o apelo pela valorização dessa arte tão conhecida, mas ao mesmo tempo invisibilizada. “Muitos não entendem que o objetivo principal desse trabalho é terapêutico, emocional e artesanal”.


Além de servir como brinquedo para crianças e virar item de colecionador, os bebês reborn também possuem uso terapêutico, utilizado por profissionais para terapia em idosos com Alzheimer, ajudando no resgate de memórias afetivas, reduzindo a ansiedade e agitação; na prevenção à gravidez precoce (em programas como Real Care Baby e Roots of Empathy); psicoterapia para luto; infertilidade; traumas e educação emocional, promovendo empatia e responsabilidade.


Verônica Torres

Verônica Torres atua há 11 anos na fabricação de bebês reborn no Acre (FOTO: Arquivo Pessoal/Cedida

Verônica Torres é artista reborn há quase 11 anos. Seu primeiro contato com a arte foi há mais de 18 anos, quando viu um desses bebês pela televisão e ficou encantada com o realismo. “Na época, adquirir um era algo muito distante para mim, por causa do alto custo. Como sempre gostei de artesanato, decidi que tentaria fazer o meu próprio bebê”.


Depois de muita pesquisa na internet, encontrou algumas artistas dispostas a orientá-la a distância. “Contei com o apoio da Mary de Andrade, que se tornou uma amiga querida. Com sua ajuda, criei meu primeiro bebê reborn. Não tenho fotos dessa época, mas lembro da emoção de realizar esse sonho, mesmo com um bebê simples”.


Após um tempo, viajou até São Bernardo do Campo (SP), onde fez um curso presencial com a artista Ana Paula Peres. “Foi lá que me aprofundei na arte e criei meu primeiro bebê presencialmente”. Também estudou com Josi Silva e Adriana Sanches e fez um curso internacional na área. “No início, minha intenção era fazer apenas para mim, mas ao compartilhar nas redes sociais, surgiram os primeiros pedidos. Confesso que tive medo, pois nunca havia vendido nada antes, mas vendi meus primeiros bebês e nunca mais parei”.


Os valores dos bonecos podem variar bastante, de acordo com o kit, o nível de realismo e a técnica utilizada. A média de preço fica entre R$ 850 a R$ 7 mil e as vendas recebem pedidos de todo o Brasil.


Bonecos são feitos por encomenda e podem custar até R$ 7 mil, dependendo do realismo (FOTO: Verônica Torres/Cedida)

Hoje, Verônica continua vendendo sob encomenda e também com pronta entrega. Além de artista reborn, ela é bancária, por isso, sua produção é mais lenta, já que os bebês não são sua fonte principal de renda. “Ainda assim, meu maior desejo é, em breve, viver exclusivamente da arte, porque é o que realmente amo fazer”.


Para ela, criar um bebê reborn vai muito além de aplicar tintas. “É um trabalho totalmente artesanal, feito com dedicação, paciência e, principalmente, com muito amor. Cada bebê carrega não apenas técnica, mas emoção. São horas, dias e até noites mal dormidas, mas o carinho envolvido em cada etapa torna tudo recompensador”.


O tempo médio de produção de um bebê varia entre 30 a 90 dias, dependendo da complexidade do kit, das técnicas usadas e do acabamento desejado. Verônica observa o mercado reborn como muito promissor. “O interesse tem crescido cada vez mais entre adultos e, principalmente, crianças. A arte reborn está em expansão e ainda tem muito espaço para crescer”.


Sobre as polêmicas em torno dos bebês reborn, ela acredita que a internet tem sido uma excelente ferramenta para divulgar o trabalho, mas também propagou desinformações e julgamentos equivocados. “Muitas pessoas distorcem o verdadeiro propósito dessa arte, que é terapêutica, emocional e artesanal”.


A arte reborn vem ganhando espaço no mercado acreano (FOTO: Verônica Torres)

Segundo ela, as encenações feitas nas redes sociais, conhecidas como ‘role play’, são representações criativas feitas por mães e artistas reborn com o intuito de valorizar o trabalho artesanal e engajar o público — não de substituir vínculos reais. “O apelo que faço é: antes de julgar, procure conhecer. Por trás de cada bebê há muito mais do que aparência — há arte, propósito e sensibilidade”.


O feedback dos clientes é empolgante e motivador. “Muitas mães dizem que foi a melhor coisa que já fizeram para suas crianças, porque tem acalmado suas filhas, sem contar no cuidado e na responsabilidade que elas criam quando ganham um bebê. Ou seja, se tornam mais responsáveis e esquecem mais as telas”. Outros pais relatam que o sono de suas meninas melhorou “pois tinham medo de dormir sozinhas e agora têm a companhia das bonecas”.


Sobre as últimas polêmicas envolvendo os bonecos, ela declara: “muitos estão apenas querendo engajamento, espalhando fake news e ferindo a comunidade reborn, que sempre atuou com ética e respeito”.


Luciana Barros

Luciana Barros trabalha preparando bebês reborn em Rio Branco (AC) há cerca de sete anos e já vendeu aproximadamente 80 bonecas reborn, tanto para clientes no Acre quanto fora do estado. Atualmente, se dedica exclusivamente à criação e venda dos bebês reborn, sendo essa sua única fonte de renda.


Luciana Barros vive exclusivamente da venda de bebês reborn no Acre (FOTO: Arquivo Pessoal/Cedida)

Fez um curso com a artista Monickie Urbanjos, que a instruiu como aperfeiçoar as técnicas e entender melhor os materiais e processos. Com Luciana, os preços variam entre R$ 800 e R$ 3 mil, dependendo do nível de realismo e dos materiais utilizados, se importados ou nacionais.


“Sempre tive o sonho de criar. O incentivo para iniciar essa arte linda foi o sonho da minha filha, que na época tinha 8 anos, de ter uma boneca reborn. Acabei me apaixonando pela arte e também vi nisso uma oportunidade de trabalhar em casa e, ao mesmo tempo, continuar exercendo meu papel de mãe”.


Antes disso, Luciana trabalhava como vendedora autônoma. Hoje, ela garante ter percebido um crescimento constante no mercado de bebês reborn e vê com bons olhos a abertura do público acreano para esse tipo de arte.


Detalhes nos acabamentos tornam os bonecos hiper-realistas (FOTO: Arquivo Pessoal/Cedida)

“Bebê reborn é uma arte que envolve transformar um molde de vinil em um bebê extremamente realista, com características que remetem a um recém-nascido. É um processo delicado e cheio de detalhes, que exige paciência, técnica e sensibilidade”. Luciana leva em média de 5 a 10 dias para elaborar um boneco, considerando um trabalho cuidadoso e detalhado.


Ela atende todos os públicos, mas garante que 100% de seus clientes tem sido de crianças. “Os pais e avós me procuram para realizar esse sonho”. A artista afirma que há uma perspectiva de crescimento muito grande em todo o país com relação aos bebês reborn, e acredita ser um mercado em expansão.


Crianças são o público-alvo da artista reborn Luciana Barros, no Acre (FOTO: Arquivo Pessoal/Cedida)

“Assim como há quem coleciona carrinhos, miniaturas, bonés, o bebê reborn também é uma forma de expressão, brincadeira e afeto da parte de colecionadores e crianças. Importante destacar que se trata de uma boneca e não de uma criança e que as polêmicas atuais envolvem outras questões. E lembrando sempre que é uma boneca, não é uma criança”.


O feedback dos clientes é sempre positivo: “alguns pais já me relataram que a criança ficou tão feliz com o presente que melhorou na escola e passou a dormir sozinha no seu quarto”.


A arte reborn

Luciana e Verônica se orgulham em falar sobre o surgimento da arte reborn, que veio após a Segunda Guerra Mundial e se desenvolveu nos anos 1990, nos Estados Unidos. O termo “reborn” vem de “renascido”, que descreve o processo artesanal de transformar uma boneca comum em um bebê extremamente parecido com humano.


As primeiras artistas retiravam a pintura original das bonecas e aplicavam técnicas para deixá-las como novas. O processo de criação de um bebê reborn envolve ao menos sete etapas indispensáveis. As artistas enumeram:


1. Escolha do Kit: seleção da cabeça, braços e pernas em vinil macio, geralmente criados por escultores renomados.


2. Preparação do Vinil: as peças são lavadas, lixadas e preparadas para receber a pintura.


3. Pintura Realista: feita em camadas com tintas específicas (óleo ou air dry), simulando tons de pele, veias, rubores e outras características realistas. Algumas camadas precisam ser curadas em forno.


4. Selagem: Aplicação de verniz fosco ou acetinado para proteger a pintura e dar textura à pele.


5. Microraizamento: os cabelos são implantados fio a fio, usando mohair, alpaca ou cabelo humano, e selados internamente.


6. Montagem e Encorpamento: o corpo é de tecido, recheado com fibras e pesos que simulam o peso real de um bebê, garantindo sustentação e realismo.


7. Finalização: aplicação de ímãs para chupeta, cílios, roupinhas e um enxoval personalizado para cada bebê.


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