Contrariando as expectativas da esquerda e da mídia internacional, que esperavam uma continuidade do Papa Francisco, tido e havido como representante de sua ideologia e sócio da agenda das chamadas “minorias”, o Papa Leão XIV vem demonstrando que está na hora de botar o pé no freio desses “avanços”. Até agora, nenhuma continuidade. Pelo contrário, mostra uma identidade que o diferencia do antecessor.
O noticiário dos últimos dias vem com uma forte reação da comunidade LGBT que considerou homofóbica a declaração de Leão XIV: “É responsabilidade dos governantes trabalhar para construir sociedades civis harmoniosas e pacíficas. Isso pode ser alcançado, acima de tudo, investindo na família, fundada na união estável entre um homem e uma mulher”. Os defensores da constituição de famílias homoafetivas ficaram indignadas.
Sou do time que pensa que se for de gosto, o adulto pode se unir até com uma vassoura. Não é da conta de ninguém. O problema é que a Igreja é uma instituição religiosa e, como tal, tem sua doutrina própria à qual as pessoas podem aderir ou não, sabendo de antemão que seus gostos e preferências não serão capazes de mudá-la. Se ela diz, não de hoje, mas desde sempre, que casamento é entre homem e mulher, o seu líder tem todo o direito de reafirmar isso sempre que queira ou julgue necessário.
Não creio que se trata de homofobia ou transfobia. A fala nem se referiu ao grupo que se sentiu atacado, O Papa apenas ratificou uma obviedade para a igreja e os católicos, e chamou os governantes à responsabilidade em relação à família. Esta, aliás, é o ponto mais importante, ou seja, de que forma, os governantes devem atuar em seus correspondentes estados, para promover a família e não apenas o indivíduo. Há aqui o anúncio de que o ente família é o melhor destinatário das políticas públicas se o objetivo é o desenvolvimento de uma sociedade “harmoniosa e pacífica”.
Muito provavelmente, as pessoas que discordam ou querem destruir a família, considerando-a uma instituição atrasada e superada pela modernidade, se sentiram atingidas, especialmente porque viam no Papa Francisco uma autoridade muito mais flexível. Lembremos que ainda sem admitir o casamento de homossexuais, ele considerou razoável que as ditas uniões fossem abençoadas, o que para muitos clérigos dá no mesmo.
A fala, destacada de uma reunião com diplomatas, tem muito mais o sentido de política pública, ou seja, de que a família deva ser o alvo dos governos do que, efetivamente, uma mensagem ao público LGBT. O endereço era os governos que, em muitos casos, tem abandonado a família como célula da sociedade.
Mario Colomarino, um dos líderes italianos da comunidade LGBT disse “Ficamos decepcionados porque houve algumas aberturas tímidas durante o pontificado do Papa Francisco que deram esperança aos católicos LGBT. É claro que a Igreja, uma instituição que existe há milênios, leva adiante uma doutrina imutável, como vimos. No entanto, estou convencido de que existem pessoas. O Papa deve ouvir as pessoas, incluindo as pessoas LGBT dentro da Igreja”. Quer dizer, em determinado nível ele tinha o Papa Francisco como um uma autoridade permeável à discussão do tema, e confessa seu desapontamento com Leão XIV.
Todos que acompanharam a semana de sucessão do Papa Francisco perceberam que a torcida geral era para que viesse alguém que se dispusesse a ser um “Francisco II”, que nunca se fez de rogado em apoiar pautas da esquerda, ao ponto de receber e visitar gente da espécie Raul Castro, Evo Morales, Nicolas Maduro e outros. Não parece que Leão XIV siga o mesmo itinerário.
O pacote de continuação ou aprofundamento das pautas sociais (defesa dos pobres, críticas ao capitalismo selvagem, proteção do meio ambiente); temas morais (maior acolhimento a pessoas LGBTQIA+, discussão sobre celibato e papel das mulheres na Igreja); maior aproximação com movimentos populares (apoio a lutas por terra, moradia, e justiça social); reformas institucionais (descentralização da Igreja, combate mais rígido a abusos e maior transparência) foi entregue ao Leão XIV que resolveu examinar tudo com calma e formar sua própria agenda. Aguardemos.
Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS, terças, quintas e sábados no DIÁRIO DO ACRE, quartas, sextas e domingos no ACRENEWS e, eventualmente, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no VOZ DA AMAZÔNIA e em outros sites.