Em 2025, a aviação no Acre celebra 89 anos de uma trajetória marcada por pioneirismo, desafios logísticos e um papel crucial na integração de um estado que ainda hoje sofre dificuldades de acesso por terra e água. Desde os primeiros voos na década de 1930, a aviação tem sido a espinha dorsal do transporte no Acre, conectando comunidades remotas, viabilizando o acesso a serviços essenciais e impulsionando o desenvolvimento econômico.
A história da aviação no Acre remonta a 1936, o lendário hidroavião Taquary “aquatissou” nas águas no rio Acre, no estirão do Bagé, em Rio Branco, onde hoje se localiza o bairro que foi batizado com o nome da aeronave, segundo registro do historiador acreano Marcos Vinicius Neves em publicação do jornal A Gazeta, em 2015. Foi então quando o interventor federal do Acre, Manoel Martiniano Prado, proclamou que o Acre deveria entrar para a modernidade nas asas dos aviões, num tempo em que o isolamento dos acreanos era quase absoluto.

Foto: imagem do Taquary I Autor desconhecido/internet
Da “ousadia” do interventor, e pela mão de obra de famílias acreanas, nasceu, então, o primeiro “Campo de Aviação” do Acre, onde passaram a pousar os aviões da Panair, da Cruzeiro e do Correio Aéreo Nacional (CAN). Era o início da história da aviação no Acre. Em pouco tempo, João Donato Filho se tornaria o primeiro piloto acreano, razão pela qual batiza um dos helicópteros do estado na atualidade.
De lá para cá, 12 dos 22 municípios do Acre possuem aeródromos, alguns com habilitação para receber voos noturnos, graças a investimentos recentes do Governo do Estado. Apenas Acrelândia, Assis Brasil, Bujari, Capixaba, Epitaciolândia, Mâncio Lima, Plácido de Castro, Rodrigues Alves, Senador Guiomard e Porto Acre não possuem pista para pousos e decolagens.
Embora o avanço do setor do estado seja evidente e de extrema importância para o desenvolvimento da região, acidentes, principalmente os fatais, ainda assombram a memória da população. Relembre os casos de acidentes aéreos no Acre com resultado morte:
1951: O desastre de “Tarauacá”
No dia 30 de abril de 1951, por volta das 17h15, um avião monomotor Beechcraft Bonanza, batizado de “Tarauacá”, de prefixo PP-HTE, saiu de Rio Branco com destino a Xapuri a serviço do Governo do Acre. A bordo, o piloto Manoel de Sousa Fortes e os passageiros José Raimundo Melo e Miguel Gomes Bezerra. De acordo com testemunhas, na chegada a Xapuri, o avião sobrevoou a cidade, depois voou baixo sobre a pista, e ao tentar recuperar altitude se chocou contra a copa de uma castanheira, perdendo uma das asas e caindo ao chão já com as chamas altas. Todos os ocupantes morreram.
Curiosamente, segundo o radialista e professor Nader Sarkis, neto de José Raimundo de Melo, com base em relatos da família, o rasante em cima da pista, que ocorreu pouco antes da tragédia, era prática comum do piloto Manoel Gomes para avisar a esposa de sua chegada.
“Pela história que ouço desde criança, o avião caiu após o piloto fazer um voo rasante sobre a cidade, como maneira de avisar a sua noiva de sua chegada, como era habitual fazer. Após a queda, meu pai, Elias Sarkis, junto com o Afonso Zaire, se deslocou rumo ao lugar do acidente e avistou a fumaça do avião, na região do igarapé Santa Rosa”, disse ao ac24horas em matéria publicada em 12 de julho de 2020. A reportagem não encontrou dados sobre a investigação, que segundo o jornal O Acre, na época, ficou a cargo do Capitão Milton de Braga Rola.
1956: Acidente com avião da Força Aérea Brasileira em Rio Branco

Foto: Avião C-47 do Correio Aéreo Nacional, da Força Aérea Brasileira, caiu após a decolagem do aeroporto de Rio Branco I FAB/Arquivo
No dia 9 de julho de 1956, o Acre registrou um novo acidente: um avião C-47 do Correio Aéreo Nacional, da Força Aérea Brasileira, caiu após a decolagem do aeroporto de Rio Branco, matando 4 dos 20 ocupantes. Em publicação do blog Alma Acreana, assinado por Isaac Melo, é possível encontrar uma imagem dessa aeronave que pertencia ao Serviço Postal Militar Brasileiro, iniciado em 1931.
Não há informações sobre a investigação do acidente.
1971: O maior desastre aéreo da história do Acre

Foto: FAB/Arquivo
O maior em número de vítimas fatais ocorreu em 28 de setembro de 1971, quando o avião DC3, da empresa Cruzeiro do Sul, que viajava de Sena Madureira com destino a Rio Branco quando apresentou problemas no motor, perdendo altitude e se chocando contra uma árvore, caindo em um matagal na comunidade Boca do Caeté, deixando um trágico saldo de 33 mortos entre passageiros e tripulação.
Entre as vítimas estava o bispo Dom Giocondo Maria Grotti, que à época chefiava a Diocese da Igreja Católica no Acre. Italiano, Grotti havia feito uma visita a Sena Madureira, que havia completado 67 anos de fundação 3 dias antes. No local do episódio, algumas peças do avião ainda podem ser encontradas, como o motor e outros artefatos, onde foi erguida uma capela em homenagem ao religioso.
1992: Voo VASP Cargo 780
No dia 21 de junho de 1992, o voo VASP Cargo 780 decolou de Rio Branco com destino a Cruzeiro do Sul transportando 14,135 toneladas de mercadorias.
Aproximadamente às 00h40min já do dia 22, a aeronave solicitou autorização para iniciar a descida no pouso na pista 10 de Cruzeiro do Sul. Neste instante, o alarme sonoro de fumaça do compartimento de carga começou a soar. O comandante Dárcio Lino de Matos, de 29 anos, solicitou ao mecânico Mauro da Silva Borges, de 25 anos, que verificasse e acionasse o extintor de incêndio em caso de necessidade, e quando Mauro retornou afirmando não ter encontrado anormalidades, Dárcio pediu para ele fechar a porta da cabine e sentar para verificar em solo.

Foto: Imagem da internet/reprodução
O preparo para o pouso seguiu, contudo, os pilotos aparentemente não se deram conta de que, enquanto lidavam com a possibilidade de um incêndio a bordo, a aeronave estava descendo sozinha, pois havia sido programada para descer até o nível ideal para o pouso. Faltando 15 quilômetros para a pista, às 01h05min, a aeronave se chocou inicialmente com as copas das árvores, e em seguida com o solo numa velocidade de 255 km/h (138 nós), causando a morte de todos os seus tripulantes.
1997: Avião se choca contra torre da Rádio Difusora
Na tarde do dia 23 de fevereiro de 1997, o avião monomotor Embraer 720-C, de prefixo PT-RAG, decolou do aeroporto de Sena Madureira quando bate na Torre da Rádio Difusora e caiu.

Foto: Imagem ilustrativa de avião Embraer 720-C, mesmo modelo do acidente em Sena Madureira I Wikipédia/reprodução
Foto: Imagem ilustrativa de avião Embraer 720-C, mesmo modelo do acidente em Sena Madureira I Wikipédia/reprodução
Na ocasião estava a bordo a ex-prefeita de Sena Madureira Toinha Vieira, os ex-deputados Zé Vieira e Márcio Bittar e os militares Sargentos Amorim, Major Rocha, Coronel Costa do Corpo de Bombeiros. O piloto, conhecido como Barbinha. não resistiu aos ferimentos e morreu no local. O acidente ocorreu durante um sobrevoo para registrar a alagação de 1997, que afetou mais de 70% da população.
2002: O acidente da Ricco
O voo 4823 da Rico Linhas Aéreas, operado por um Embraer EMB-120 Brasília (prefixo PT-WRQ), caiu em 30 de agosto de 2002 durante a aproximação para pouso em Rio Branco, sob forte chuva. A aeronave fazia o trecho Cruzeiro do Sul – Tarauacá – Rio Branco, transportava 31 ocupantes (28 passageiros e 3 tripulantes).

Foto: Imagem da internet/reprodução
O acidente ocorreu a cerca de 1,5 km do aeroporto, quando a aeronave, após receber autorização para pousar, entrou em uma tempestade e colidiu com o solo, inicialmente com a cauda, na Fazenda dos Alves. A fuselagem se partiu em três seções, e um incêndio danificou o avião, que ficou irreparável.
Das 31 pessoas a bordo, 23 morreram (incluindo os 3 tripulantes e 20 passageiros), e 8 passageiros sobreviveram, alguns com lesões graves.
Entre as vítimas estavam políticos, como o deputado federal Ildefonso Cordeiro, e empresários. O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) concluiu, em 2004, que o mau tempo e fatores humanos, como desvios dos procedimentos operacionais pela tripulação e baixa consciência situacional, contribuíram para a tragédia.
O perfil psicológico do comandante, descrito como autoritário, e a falta de gerenciamento de recursos da tripulação (CRM) também foram apontados como fatores. Não houve evidências de falhas mecânicas ou falta de combustível.
2018: Aeronave experimental cai logo após a decolagem e mata 2
No dia 11 de setembro de 2018, por volta das 13h30, um paratrike modelo Ícaros de matrícula PU-ADD decolou de uma pista improvisada em Rio Branco com o piloto Geliton Bezerra Roque, de 41 anos, e Luiz Carlos Melo, de 40 anos, como passageiro.

Foto: ac24horas/arquivo
Conforme relato de um observador do acidente, logo após a decolagem, ao iniciar curva à esquerda a aeronave entrou em uma trajetória descendente, permanecendo com um ângulo de inclinação/descida de aproximadamente 45° em relação ao solo, até o impacto.

Foto: Relatório de acidente/CENIPA
O condutor da aeronave não possuía Certificado Médico de Piloto de Ultraleve (CMPU), nem possuía Certificado de Piloto de Recreio (CPR), nem Certificado de piloto Desportivo (CPD); enquanto a aeronave não possuía Certificado de Autorização de Voo (CAV), nem Certificado de Marca Experimental (CME). Os relatórios de Inspeção Anual de Manutenção (RIAM) e de Seguro Aeronáutico (RETA) não estava a bordo da aeronave não estavam a bordo.
A investigação foi interrompida pelo CENIPA em 11 de março de 2019, já que a Norma de Sistema do Comando da Aeronáutica prevê a interrupção da investigação de uma ocorrência aeronáutica quando verificar a existência de indícios de crime ou que a mesma decorreu de violação a qualquer legislação aeronáutica em vigor.
2019: Acidente misterioso em Assis Brasil
No dia 27 de outubro de 2019, uma aeronave de pequeno porte foi encontrada após cair em uma área de mata a cerca de 30 quilômetros de Assis Brasil, no interior do Acre, município que faz fronteira com o Peru. Em meio aos destroços do avião foram encontrados dois corpos carbonizados de dois homens mais tarde identificados como José Roberto Arteaga Roca, e Damian Roca Guardia, ambos de 31 anos.

Foto: Polícia Civil do Acre/Divulgação
Um dia após os destroços serem encontrados pelo resgate, a polícia prendeu três homens que confirmaram que estiveram no local em que a aeronave caiu, à procura de dinheiro e armas, a mando de um peruano. Eles foram na região um dia antes da polícia.
O avião caiu numa quinta-feira, mas a polícia só achou o avião no domingo. Após serem ouvidos, os três homens foram liberados. Na época do acidente, especulou-se que a aeronave fazia o transporte de drogas e armas, e que criminosos teriam recuperado a carga antes da polícia chegar ao local, mas esta versão nunca foi comprovada.
2023: Acidente após decolagem mata 12 em Rio Branco
No dia 29 de outubro de 2023, por volta das 7h40, uma aeronave modelo Gran Caravan de prefixo PT-MEE decolou do aeroporto Plácido de Castro, em Rio Branco, com destino a Envira, no Amazonas, com dois pilotos e 10 passageiros a bordo – entre os passageiros uma bebê de 1 ano e 7 meses, que viajava no colo da mãe.
Veja a matéria especial do ac24horas sobre o caso: Um dia após a tragédia: ac24horas mostra local do acidente aéreo que matou 12 pessoas no Acre
Após a decolagem, a aeronave veio a colidir árvores e em seguida contra o solo, numa região de mata cerca de 1,5km após a cabeceira da pista. A investigação do CENIPA sobre o caso está em 60%, segundo o painel SIPAER (FAB).
2024: Aeronave homologada para 4 pessoas se acidenta com 7
No dia 18 de março de 2024, um avião modelo Cessna Skyline 182 de prefixo PT-JUN, com sete pessoas a bordo, decolou de Manoel Urbano com destino a Santa Rosa do Purus. Pouco após a decolagem, o avião caiu numa aérea de difícil acesso, matando, na hora, o comerciante Sidney Hoyle, que voltava do casamento da filha ocorrido 4 dias antes.

Foto: Arquivo/ac24horas
Suanne Camelo, de 30 anos, teve mais de 90% do corpo queimado e foi a primeira a ser transferida de Manoel Urbano para Rio Branco. Mas morreu 9 dias após o acidente.
Amélia Cristina Rocha, de 28 anos, foi transferida para o Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) de Manaus (AM), com mais de 70% do corpo queimado. Ela teve o quadro de saúde agravado e morreu em 24 de maio, pouco mais de 2 meses após o acidente.
Valdir Roney Mendes, de 59 anos, era o piloto do avião e estava na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em Manaus com 40% do corpo queimado. Ele foi o último a bordo da aeronave a morrer, em 12 de julho, após mais de três meses internado. Valdir tinha mais de 30 anos de aviação.
Sobreviveram ao acidente Mateus Jeferson Fontes, que era noivo de Suanne e que pulou do avião antes do choque com o solo; Bruno Fernando dos Santos, esposo de Amélia Cristina; Deonicilia Salomão Kalisto Kaxinawá, estudante.
O avião estava sem Certificado de Aeronavegabilidade válido. Conforme o Governo do Acre, 7 pessoas ocupavam o avião, mas no documento da Anac, a aeronave estava certificada para transportar apenas três passageiros mais um piloto.