Por que não apoiam o PL da anistia?

Por
Valterlucio Campelo

Depois que foi publicada a lista de deputados que assinaram o pedido de urgência para votação do PL da Anistia aos manifestantes presos em oito de janeiro de 2023, recebi algumas provocações no sentido de responder a seguinte indagação: Por que um projeto com esse grau de humanidade e justiça, não teve o apoio de mais deputados, já que alguns deles, de partidos à direita, deixaram de apoiar o PL?


Bem, individualmente, eu não saberia dizer, mas, em tese, podemos desenvolver alguns critérios de abordagem para entender o comportamento desses representantes do povo.


O primeiro deles e, mais evidente, é de ordem ideológica. Os partidos e parlamentares ideologicamente enraizados, raciocinam sempre através desse filtro. Se o alvo é alguém ou algum comportamento individual, ou coletivo produzido pela direita, não há o que se pensar, a esquerda aproveitará a situação para obter dividendos políticos e, compulsoriamente, se postará em lado contrário com todas as suas forças e meios. Entra em campo a moral revolucionária que para Marx, não era um conjunto fixo de princípios éticos universais, mas sim uma moralidade histórica e de classe, intrinsecamente ligada à luta do proletariado pela sua emancipação. Para ele, a moralidade era um produto da estrutura socioeconômica de uma determinada época e uma ferramenta ideológica utilizada pela classe dominante para manter o seu poder. Essas nossas ideias de certo e errado são, para a esquerda, valores burgueses que não precisam ser observados. Sendo assim, danem-se os manifestantes injustamente presos, desde que se possa infligir uma derrota à direita, o seu sacrifício é o de menos.


O segundo motivo é de ordem prática e alcança mais o centrão. O parlamentar fez as contas e apurou, segundo seus valores e compromissos, que é mais lucrativo manter-se de mãos dadas com o lulopetismo, usufruir da nomeação de cargos e liberação de verbas, frequentar os convescotes oficiais, participar de solenidades que prestigiam a vassalagem (em alguns casos, até medalhas são distribuídas), do que apostar na coerência e bom senso e ajudar a livrar do sofrimento injusto aquelas centenas de presos políticos. O governo, que tem na mão a alça da coleira de muitos parlamentares, já saiu ameaçando uns e outros com retaliações individuais. Quem quer afago tem que obedecer. É, em certa medida, um mandato utilitário, ou seja, o deputado, faz a contabilidade, age de acordo com o próprio interesse e o resto que se exploda.


O terceiro motivo visível é também de ordem prática, mas vai em outro sentido e serve para todos os deputados. Imagine a situação do parlamentar que tem o pai (caso do presidente da Câmara dos Deputados – Hugo Motta), um correligionário importante, ou seja, ele próprio, alvo de algum processo tramitando no Supremo Tribunal Federal – STF. Com os ministros da Corte agindo descaradamente contra a anistia, o parlamentar segue o instinto de sobrevivência. Entre sofrer retaliações e fazer o errado, ele prefere o errado e calar perante a anistia. Como sabemos, a política brasileira é impregnada de corrupção, então, muitos deputados estão nessa situação, ou seja, com o rabo preso em alguma gaveta suprema. O que ele faz? Se omite, faz a egípcia, foge de declarações a respeito, não se explica e aposta na memória curta do eleitor. Danem-se os inocentes.


Há ainda o grupo que poderíamos chamar de odientos. São os que desde antes nutrem pelo ex-presidente Jair Bolsonaro um ódio visceral, decorrente de uma contraposição às causas que o parlamentar defende. Ameaçados pela revelação de uma sociedade conservadora e uma liderança não domesticável, nos últimos anos a mídia e os grupos identitários formaram do Jair Bolsonaro uma imagem pública autoritária, jamais provada em atitudes, decretos, favorecimentos ou leis, de que ele é misógino, homofóbico, racista, negacionista etc., mas, mesmo assim, largamente consumida por seus adeptos. A lista de adjetivos pejorativos é do tamanho da ignorância histórica, contudo, serve para que toda essa gente se alie ao “politicamente correto” que, no dizer do jornalista e escritor Guilherme Fiúza, esconde o intelectualmente estúpido. Então, qualquer decisão contrária aos interesses do ex-presidente, é validada pelo ódio e sentimento de vingança. Como exemplo, o idiota que não cuidou do parente que morreu de COVID e põe a culpa no Bolsonaro.


É claro que existe uma âncora jogada para que nela se agarrem quem precisa dar desculpas, que é a ideia estapafúrdia, repetida à exaustão pela mídia pré-paga, de que aquelas pessoas, desarmadas, sem apoio militar, sem apoio político, sem estrutura financeira, sem se conhecerem de antes, sem organização, sem apoio externo, enfim, tão somente reunidas em multidão (uma pequena parte disposta ao vandalismo), poderiam produzir o resultado golpe. Seria, parece, o golpe do batom e o governo da artrite. De qualquer forma, os defensores dessa versão fantasiosa deveriam vir a público e demonstrar suas razões. Quem sabe, convence alguém. Eles não aparecem, apenas apostam que a mídia faz o servicinho sujo.


Penso que assim esgotamos os motivos para que um parlamentar se negar a apoiar a anistia e ajudar a pacificar o país. Servidão, medo e ódio são as etiquetas que esses parlamentares podem escolher para pregar na própria testa. Servidão ao governo lulopetista e suas migalhas de poder, medo do STF e seu chicote jurídico e ódio ao Bolsonaro e sua agenda conservadora. Em nenhum caso, há qualquer coerência com os fatos efetivamente ocorridos em 08 de janeiro, nenhuma generosidade com homens e mulheres, pais, mães, avós, velhos e doentes que tiveram suas vidas destruídas, seus filhos apartados, seus patrimônios perdidos. A esquerda exerce uma simplificação de Maquiavel (1532) “os fins justificam os meios”.


No frigir dos ovos, se politicamente os parlamentares estão todos liberadas para votarem como quiserem, já que os partidos não fecharam questão sobre o tema, então os eleitores estejam à vontade para pregarem em cada deputado a etiqueta que quiserem e, em 2026, dar-lhes o julgamento merecido.


Segundo o MAPA DA ANISTIA, a deputada Antônia Lucia resolveu somar com os outros cinco apoiadores, então, apenas duas deputadas mulheres (Socorro Neri e Meire Serafim), constam como “neutras”. Como nenhuma das duas declarou até aqui o que seja essa neutralidade, não é prudente, por enquanto, qualquer julgamento. Aguardemos os fatos.



Valterlucio Bessa Campelo escreve às segundas-feiras no site AC24HORAS, terças, quintas e sábados no DIÁRIO DO ACRE, quartas, sextas e domingos no ACRENEWS e, eventualmente, no site Liberais e Conservadores do jornalista e escritor PERCIVAL PUGGINA, no VOZ DA AMAZÔNIA e em outros sites.


Compartilhe
Por
Valterlucio Campelo