O atual prefeito de Sena Madureira, Gerlen Diniz, protocolou neste domingo, 16, uma representação junto ao Ministério Público Federal com o objetivo de que o órgão ministerial tome medidas cabíveis para responsabilização do ex-prefeito da cidade, Mazinho Serafim, e pelo menos 12 ex-secretários que ocuparam cargos no primeiro escalão da gestão passada devido a uma suposta prática de improbidade administrativa ao fazerem pagamentos supostamente superfaturados a empresa U. Oliveira Nogueira dos Santos EIRELI-ME, responsável por fornecer internet a todos as secretarias da cidade.
O ac24horas teve acesso à minuta protocolada no MPF que consta que entre os anos de 2022 a 2024, a empresa provedora de internet, de propriedade do empresário César Moreira Nasserala, teria recebido cerca de R$ 1,9 milhão, totalizando, segundo Diniz, um superfaturamento de pelo menos 1.000%. O atual gestor da cidade alega que como parte do dinheiro para o pagamento veio do Sistema Único da Saúde, se faz necessário acionar o órgão público federal para apurar os supostos fatos.
De acordo com a representação, no que se refere ao preço, ficou convencionado o valor unitário de: R$ 110,00/megabits; e Previsão de uso/fornecimento: 1.000 megabits/mês, por 12 meses, totalizando o valor de R$ 1.320.000,00 (um milhão e trezentos e vinte mil reais), conforme a Ata de Registro de Preço disponibilizada na ação.
Na vigência da Ata de Registro de Preços foi celebrado contrato n.º 079/2023 com a finalidade de prestação do fornecimento de serviços de telecomunicações para transmissão de dados ponto a ponto (PTP), link de internet dedicado megabits por segundo (MBPS) por fibra (internet banda larga), destinado a atender as necessidades das secretarias da Prefeitura. O Referido contrato teve vigência de 6 (seis) meses, conforme cláusula décima-quarta, com possibilidade de prorrogação mediante termo aditivo, em 4
conformidade com o artigo 57, inciso II, Lei n.º 8.666/93. O quantitativo previsto foi de 7.766 megabits com valor unitário de R$ 110,00 (cento e dez reais), totalizando R$ 854.260,00 (oitocentos e cinquenta e quatro mil duzentos e sessenta reais).
Segundo Diniz, foi prorrogado a partir de 2 de janeiro de 2024 até 31 de dezembro do mesmo ano (1.º aditivo) e, em 07/11/2024, foi realizado o acréscimo de 25% (vinte e cinco por cento) do valor do contrato correspondente a R$ 213.565,00 (segundo aditivo). A cláusula sétima do mencionado contrato estabeleceu que as despesas contratuais a serem realizadas decorrerão da dotação orçamentária das seguintes secretarias municipais: Secretaria Municipal de Educação; Secretaria Municipal de Saúde; Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, Secretaria Municipal de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer; e Secretaria Municipal de Administração.
“Feito esse breve relato, se verifica como de fácil constatação a ocorrência de atos eivados de vícios formais e materiais, assim como indícios de supostas ilegalidades que não podem passar ao largo de minuciosa investigação por parte dessa Procuradoria da República”, argumentou Diniz na representação, alegando ainda que não foi localizado no processo licitatório qualquer documento a indicar que a administração anterior tenha realizado estudo prévio com a finalidade de evidenciar/demonstrar a efetiva demanda e detalhamento das reais necessidades de megabits/mês de cada uma das unidades/secretarias da prefeitura municipal, para fins de contratação.
“Note-se que foi estimado um quantum de 1.000 megabits/mês, conforme consta da ARP n.º 043/2022. Fato é que não existiram critérios ou estudo técnico realizado para se chegar a essa quantidade fixada na referida ata de registro de preços. Frise-se, a propósito, que a realização de estudo técnico prévio para definição dessa demanda – que deve obrigatoriamente instruir o processo licitatório – se constitui em procedimento indispensável que tem como objetivo promover um ambiente probo e confiável, que possa estabelecer maior segurança, lisura e transparência às decisões administrativas e no trato com a coisa pública”, frisou o atual gestor.
A ausência de estudo técnico que pudesse dar embasamento ou justificativa plausível à demanda fixada na Ata de Registro de Preços (1.000 megabits/MÊS) constitui omissão grave e evidentemente contrária à norma supracitada e também aos objetivos do processo licitatório (artigo 11 caput, Lei n.º 14.133/2021)1, em se considerando que acabou por proporcionar dúvida, insegurança e ares de improbidade, mormente no que se refere ao potencial risco na realização de gastos exorbitantes, em razão da fixação de uma demanda superestimada ou além da efetiva necessidade da administração municipal, como parece ser o caso, argumenta Diniz.
Associado a isso, segundo Gerlen, também se verifica grave a inexistência de qualquer registro – onde nada foi encontrado – no que diz respeito ao controle e aferição/medição dos “megabits/mês” que foram utilizados por parte da prefeitura e suas unidades administrativas/secretarias. “Em outras palavras, não foi realizado qualquer controle, porque não foi disponibilizado ou não existiu meio seguro de aferição do quantum (em megabits/mês) que foi fornecido à prefeitura pela empresa contratada. Ou, por outra, não há como se verificar/comprovar até mesmo se o serviço contratado foi efetivamente executado em sua integralidade”, defende.
Diniz revela que teve secretaria que num mês pagava fatura no valor de R$ 3.300,00 e, posteriormente, num próximo mês, tal valor foi de R$ 7.700,00 (acréscimo de mais 100%), isso na mesma unidade administrativa. “Importante registrar, neste particular, que em nenhum dos documentos juntados aos processos de pagamentos analisados – principalmente na notas fiscais, cuja descrição do serviço deve ser claro e minucioso – fizeram constar a quantidade de “megabits/mês” que foi utilizado/ou fornecido pela empresa contratada, mas tão apenas o valor cobrado. Deduz-se que não foi de interesse da empresa – mesmo porque, ao que parece, não houve controle algum sobre isso – informar ou mesmo comprovar o quantum de “megabits/mês” que foi efetivamente utilizado pelo município contratante, o que faz parecer que os valores são cobrados ao seu talante e conveniência, mormente com a finalidade de alcançar/utilizar todo o limite estabelecido na ARP (que de fato ocorreu) e que talvez venha implicar, em tese, no crimes tipificados no artigo 312 (peculato) e/ou 337-L do Código Penal.2 Eis aqui, portanto, um dos fatos mais relevantes a constar desta representação”, questionou o prefeito lembrando que Mazinho não designou nenhum servidor para atual como gestor e fiscal do contrato.
“Nesse passo, foi facilmente constatado que alguns servidores, seja por dolo ou mesmo “na cara e na coragem” – como diz a expressão popular – embora não designados ou nomeados gestores ou fiscais pela administração municipal anterior, foram os que atestaram “apenas algumas” das notas fiscais juntadas aos processos de pagamento, certamente em razão do risco/responsabilidade que assumiriam em atestar serviço cuja quantidade não havia prova ou registro, tendo em vista que simplesmente inexistiam, ou não foram disponibilizados, repita-se, meios seguros com a finalidade de aferir/medir os “megabits/mês” que foram fornecidos pela empresa contratada ao município de Sena Madureira. Observa-se, portanto, que a contínua ou eventual negligência ou mesmo resistência do administrador no tocante ao cumprimento das formalidades legais inerentes aos atos e procedimentos administrativos acaba por revelar, com efeito, o descaso ou falta de respeito com a coisa pública em geral, mormente no que diz respeito ao erário, pois o cumprimento de tais formalidades tem também como objetivo prevenir e proteger o patrimônio público sobretudo de pessoas oportunistas e desonestas”, pontuou Diniz.
Gerlen afirma que por diversas vezes a empresa de internet recebeu pagamentos antecipados e destacou pelo menos 16 erros que chama atenção:
I. emissão de notas fiscais e pagamentos sem que fosse concluída a prestação de serviço ao final do mês, ou seja, ocorreu antecipação de pagamentos, o que é vedado, conforme o § 1.º do art. 145 da Lei n.º 14.133/2021. Verbis: “A antecipação de pagamento somente será permitida se propiciar sensível economia de recursos ou se representar condição indispensável para a obtenção do bem ou para a prestação do serviço, hipótese que deverá ser previamente justificada no processo licitatório e expressamente prevista no edital de licitação ou instrumento formal de contratação direta”.
II. ausências de atestos; despachos sem assinatura do responsável; autorização de despesas sem a devida assinatura do ordenador;
III. valores pagos acima da média de consumo sem a devida justificativa; 10
IV. certidões negativas vencidas;
V. ocorrências de pagamentos sem contrato, o que é vedado em se considerando se tratar de serviço de caráter contínuo (art. 62 § 4.º, L. 8666/93);
VI. ordens de serviço emitidas após a prestação do serviço;
VII. nota fiscal emitida antes da nota de empenho;
VIII. prestação de serviços anterior à emissão do empenho;
IX. documentos de autorização de despesas sem a assinatura do ordenador;
X. Notas fiscais que apresentam descrições insuficientes;
XI. oscilações significativas referentes ao consumo mensal;
XII. pagamentos em valores superiores ao que fora empenhado;
XIII. ausência de análises dos processos de pagamento pelo controle interno;
XIV. documentos essenciais sem a assinatura do responsável;
XV. empenho emitido em duplicidade;
XVI. Notas fiscais emitidas em nome das secretarias da prefeitura, quando o contratante é o Município de Sena Madureira.
A administração de Gerlen Diniz aponta que em uma rápida consulta ao Diário Oficial do Estado do Acre, em busca de referências necessárias para se verificar o preço médio de mercado para o serviço objeto da ARP 43/2022, se constatou a homologação de três contratos da mesma espécie, cujo valor mínimo encontrado, pasmem, é de apenas R$ 10,00/megabits.
“Considerando-se, portanto, o valor de R$ 10,00 relativo ao contrato acima colacionado tem-se, para exemplificar, um acréscimo de 1000% (mil por cento) pra se chegar ao valor de R$ 110,00 fixado na ARP n.º 043/2022 (10,00 x 1.000% = 110,00), o qual evidentemente se encontra muito superior aos valores praticados pelo mercado nos mesmos serviços contratados pela administração pública no Acre. Registre-se, por oportuno, que nessa mesma busca efetuada no Diário Oficial do Estado do Acre não se constatou homologação de contratos da espécie sequer no valor aproximado de R$ 110,00, o qual consta da supracitada ata de registro de preços. Eis, portanto, a prova da existência de sobrepreço na ARP n.º 043/22, assim como no Contrato n.º 079/2023″, enfatizou.
Para Gerlen Diniz, salta aos olhos uma possível ocorrência de evidente omissão dolosa de Mazinho Serafm “que, por razões inconfessáveis, homologou a ARP n.º 043/2022, contratou serviços com sobrepreço, consumou o superfaturamento e, por conseguinte, o dano à administração pública ao executar contrato que, sabidamente, possuía vícios insanáveis. Tal fato se tornou público e notório, pra não dizer escandaloso”.
Diniz enfatiza que o ato de Mazinho causou prejuízo de cerca de quase dois milhões de reais ao município de Sena Madureira, neste contrato apenas, em face de sobrepreços, superfaturamento e possíveis desvios de dinheiro público decorrentes da ilegal contratação dos serviços licitados.
Dias antes da representação protocolada por Gerlen, o ac24horas apurou que Mazinho ingressou com uma ação junto ao Tribunal de Justiça do Acre para que o atual gestor da cidade fizesse uma retratação em juizo a cerca das acusações de supostos atos de corrupção praticado na sua gestão. O desembargador Elcio Mendes, em decisão monocrática, determinou a baixa da ação para a Comarca de Sena Madureira